Após as turbulências da “crise Palocci” e da votação do Código Florestal na Câmara dos Deputados, o primeiro semestre de 2011 termina com boas – embora passageiras ou sazonais – notícias da economia; com uma primeira vitória do Itamaraty em disputas de postos internacionais desde a chegada de Lula à presidência em 2003, e com a redução ao menos retórica de conflitos entre o PMDB e o PT, entre as alas deste, e dos relacionados a outros atores da base parlamentar governista, em resposta a apelos da própria Dilma Rousseff e ao atendimento de parte das demandas deles por cargos e liberações de verbas dos chamados restos a pagar.
Calmaria relativa perturbada pela cobrança de outra parte dessas verbas e pela volta à mídia do escândalo dos aloprados de 2006, gerada a partir de luta interna entre petistas. Mas que oferece uma espécie de trégua ao Palácio do Planalto, na qual a presidente, de um lado reafirma seu ativismo gerencial, por meio do lançamento de novos programas sociais e de intensa promoção de atos ou promessas de caráter administrativo (inclusive de privatizações na área de infraestrutura que desmentem o radicalismo estatizante de sua campanha eleitoral). E, de outro lado, procura demonstrar capacidade de liderança política. Esta tornada ainda mais necessária do que na fase inicial do governo em face de um dos efeitos mais significativos das recentes turbulências: a avaliação crescente, no próprio PT, de que ela cumpre um mandato tampão, preparatório da candidatura de Lula em 2014.
Avaliação essa a que, enquanto está difusa, Dilma busca responder com algumas manifestações indicativas de autonomia em relação ao seu partido e ao antecessor. Como a da mensagem que dirigiu a FHC, na comemoração do seu 80º aniversário, com enfático e até caloroso reconhecimento de grandes méritos dos dois mandatos dele nos planos econômico, social e político. Mensagem inteiramente contraposta ao sistemático tratamento crítico de FHC, de radical condenação de seu governo, por parte dos sucessivos dirigentes do PT e do próprio Lula; que mereceu aplausos generalizados da imprensa; e com a qual Dilma acenou com uma abertura à oposição.
Mas a calmaria do final de semestre será certamente substituída por novas evidências de divisão e fragilidade da base parlamentar governista já na decisão do Senado sobre o Código Florestal e na apreciação de outras matérias polêmicas nas duas casas do Congresso. Entre estas a do piso nacional unificado dos salários das polícias e bombeiros, a do projeto que restringe o uso de MPs, da distribuição dos royalties do pré-sal . Definições legislativas que passarão a ser influenciadas por um complicador adicional: o aumento dos conflitos nessa base por causa dos objetivos partidários diferentes e contraditórios nas eleições municipais à vista. Especialmente entre o PT e o PMDB, empenhados em reforçar-se, em muitos casos um contra o outro, mas envolvendo também os demais partidos da base, entre os quais o PSB, cujo plano de ampliação do peso que já tem no Nordeste e de avanço em mais regiões conflita com o projeto de hegemonia petista. Como conduzir as relações com a heterogênea base de sustentação do Executivo, com os governadores e com o Congresso nesse cenário delicado – e no qual a oposição liderada por um hábil articulador como Aécio Neves poderá ganhar bem mais espaço – é o grande desafio político de Dilma a partir já do semestre que começa esta semana.
Quanto à economia, as preocupações maiores dos analistas se voltam para o próximo ano. Parte delas foi bem tratada em reportagem do Estado de S. Paulo, de domingo último, com o título “Governo empurra despesas para 2012”. Abertura da matéria: “O governo vem empurrando com a barriga uma série de despesas cuja fatura será cobrada em 2012, tornando o quadro econômico do ano que vem bastante complicado. Um grande reajuste do salário mínimo, quitação de subsídios dados pelo BNDES, investimentos (inclusive os da Copa e da Olimpíada) e as pressões da base política em ano eleitoral são apenas alguns exemplos dos problemas que terão de ser enfrentados. Nessa conta ainda tem de ser acrescentada a soma da decisão do STF que mandou o governo pagar de uma só vez a dívida judicial (precatórios) que havia sido parcelada em dez anos”. Declaração de uma das fontes da reportagem, o economista Fernando Montero, da Corretora convenção: “Isso (a expansão das despesas) vai fazer com que o Banco Central segure os juros e as medidas macroprudenciais por muito tempo. O BC sabe que há esses fatores expansionistas já contratados”.
Jarbas de Holanda é jornalista
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