Rumor de rebaixamento assusta e governo Sarkozy corre para promover ajuste nas contas
Os mercados ontem voltaram a assombrar, principalmente na Europa e nos Estados Unidos. Cresceram rumores de que a França, muito endividada, poderia ser a próxima a perder a nota "AAA", como aconteceu com os EUA na última sexta-feira pelas mãos da Standard & Poor"s. A Bolsa de Paris caiu 5,45%. Mas não foi só: desabaram as bolsas de Frankfurt (5,13%), Madri (5,49%) e Londres (3,05%). Cotações de bancos como Société Générale e Credit Agricole despencaram 14,7% e 11,8%, respectivamente. Em Wall Street, houve queda de 4,62% no Dow Jones. A Bovespa chegou a cair 2,35%, subiu 1,98% e encerrou o dia com alta bem menor, de 0,48%. O jornal "Le Monde" publicou uma radiografia da dívida francesa, atualmente em 1,646 trilhão, ou 85% do Produto Interno Bruto (PIB), dos quais 65% estão em mãos de estrangeiros. Nesse quesito, o país atrás apenas de Portugal (75%) e Grécia (71%). A média da Europa é de 53%. Já o déficit público francês correspondia a 7,1% do PIB em 2010. Assustado, o governo francês anuncia que fará esforços para cortar gastos. O medo é um só: de que a crise que atinge a periferia do euro (em países como a Grécia ou Portugal) pode chegar a uma economia central, a segunda maior da região.
'Dívidas são pirâmides como a de Madoff'
Para economista Jacques Attali, Europa precisa urgentemente limitar endividamento
PARIS. O economista Jacques Attali, que foi conselheiro especial de François Mitterrand, vê fortes chances de a França perder sua classificação "AAA" pelas agências de risco. Em entrevista ao jornal francês "Le Monde", o presidente do grupo PlaNet Finance - associação de estímulo ao microcrédito - lembrou que, ao rebaixar os Estados Unidos na última sexta-feira, a Standard & Poor"s cita a França como sendo o único país com classificação "AAA" que chegaria a 2015 com uma dívida equivalente, em proporção do PIB, à americana. Ele ainda comparou a atuação dos governos à de Bernard Madoff, responsável por uma fraude bilionária.
"Contrariamente ao que todos afirmam, nós fomos explicitamente citados!", afirmou Attali. "É preciso, a qualquer custo, trazer a dívida para abaixo de 85% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2013, depois chegar a 70% em dez anos".
Mesmo considerando a reação dos mercados nos últimos dias exagerada, Attali vê um fundamento para o pânico, já que "a crise não foi resolvida", nem a do endividamento, nem a da governança, tanto na Europa como nos Estados Unidos. "O sistema está superendividado, e os mercados sabem que um dia será preciso pagar a conta", afirmou.
De 2008 para cá, crise só foi adiada
Attali ressaltou que na Espanha e nos EUA já começaram as moratórias no setor privado - e que um calote da dívida pública americana só não ocorrerá "graças à impressão de dólares". Mas permanecem, afirmou, o risco de inflação e a incapacidade de o governo agir. O economista lembrou que o acordo fechado entre democratas e republicanos para a elevação do teto de endividamento terá de ser rediscutido dentro de 16 meses. "Foi como uma reunião de alcoólatras anônimos que decidem nunca mais beber e dizem: "Agora vamos tomar um último copo para celebrar o acordo"".
O economista, que ano passado publicou na França o livro "Tous ruinés dans dix ans?" ("Todos arruinados em dez anos?", sem tradução no Brasil), não poupou críticas ao endividamento dos governos. "O mestre dos Estados não é nem Keynes nem Schumpeter, é Madoff e sua capacidade de construir pirâmides de dívidas". Attali não considera o endividamento em si ruim, principalmente se é usado para investir na economia, "mas quando ele passa de 50% a 60% do PIB e não gera crescimento, torna-se um círculo vicioso".
Ele criticou ainda o fato de que, depois do estouro da crise financeira global, em 2008, o Ocidente não fez reformas estruturais, apenas aumentou o nível da dívida pública. Para Attali, o problema foi apenas adiado. "Foi como dizer: "Um momento, Sr. Carrasco". A única coisa que poderia resolver o problema da dívida, como mostra a história econômica, é a guerra, ou a inflação, ou o crescimento. As duas primeiras soluções não são desejáveis. Então é preciso fazer de tudo para restabelecer as condições de crescimento".
Solução para Europa para por federalismo
Segundo Attali, isso passa "pela educação, pelos grandes projetos", tanto nos EUA como na Europa. "É preciso recriar a economia do conhecimento". O economista ressaltou, porém, não haver uma "solução sã" de curto prazo. "Nos Estados Unidos, é preciso uma verdadeira reforma governamental para evitar bloqueios políticos".
Na Europa, Attali defende a adoção de um maior federalismo para os orçamentos dos países. "O risco não é ver a Grécia sair da zona do euro por baixo (em crise), mas ver a Alemanha sair por cima (para se livrar dos países com problemas). Para evitar isso, é preciso criar as condições de um verdadeiro federalismo".
A China, segundo Attali, ajudaria se permitisse a valorização do yuan. Mas ele acredita que os países emergentes ainda não têm força suficiente para serem o motor da economia mundial.
FONTE: O GLOBO
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