Insatisfeita com a não liberação de emendas parlamentares e as demissões em ministérios controlados por partidos aliados e envolvidos em escândalos, parte da base do governo Dilma na Câmara decidiu obstruir as votações esta semana. Um bloco informal, liderado pelo PMDB, foi montado por 201 parlamentares rebelados
Base se rebela e para votações
Em reação à faxina nos ministérios e ao atraso de emendas, deputados aliados fazem "greve"
Maria Lima, Fernanda Krakovics e Gerson Camarotti
A primeira retaliação concreta às demissões nos ministérios e à demora na liberação de emendas de parlamentares ao Orçamento da União foi anunciada ontem por líderes da base aliada, que decidiram fazer uma "greve branca" e obstruir todas as votações na Câmara até a próxima semana, pelo menos. Além disso, o PMDB do vice-presidente Michel Temer e dos ministros Wagner Rossi (Agricultura) e Pedro Novais (Turismo) - dois ministérios envolvidos em denúncias de desvios de recursos e outras irregularidades - liderou a formação de um bloco informal com PR, PP, PTB e PSC, com 201 deputados. E deram recado claro ao Planalto em tom de ameaça: não votam nada até que "os problemas" sejam resolvidos.
Um líder partidário que participou da criação desse bloco informal resumiu os problemas:
- Enquanto não resolver os problemas de emendas e cargos, não se vota mais nada. O que um partido decidir terá o apoio do outro. O ambiente no Congresso está péssimo, principalmente depois das investidas do Planalto contra os ministérios partidários.
Apesar de não existir no regimento a figura do bloco informal, os cinco partidos devem agir conjuntamente. Seus dirigentes cobram do Planalto um cronograma para liberar emendas, além de tratamento mais solidário. O Planalto prometeu apresentar proposta na terça-feira.
- Há quanto tempo venho avisando que há insatisfação generalizada na base? O resultado, vemos agora: ninguém vota nada - resumiu o líder do PR, deputado Lincoln Portela (MG).
"O governo só quer falar de crise mundial"
O líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO), externou a insatisfação dos demais líderes com o fato de a crise financeira global ter sido o foco das discussões na reunião de ontem do Conselho Político, no Planalto. A presidente Dilma Rousseff convocou a reunião do conselho - formado por presidentes e líderes de siglas aliadas - para tratar exclusivamente da situação econômica.
- Não é uma rebelião, é uma contrariedade. O governo agora só quer falar de crise mundial, não quer administrar o país. Nossos prefeitos não vivem em Nova York - disparou Jovair.
Na reunião do conselho, o vice-presidente do PSB, Roberto Amaral, foi um dos poucos que manifestaram preocupação com o quadro político. Embora tenha tratado apenas da questão econômica, Dilma fez um gesto para distensionar o clima sobretudo com o PMDB: em tom mais humilde, segundo participantes, Dilma fez elogios a Michel Temer, ao líder Henrique Eduardo Alves e aos ministros da legenda. E pregou a harmonia:
- Temos uma base ampla, mas é preciso estreitar nossos laços. Num país como o Brasil, a liderança é do presidente, mas é importante também o conjunto dos agentes políticos atuando em harmonia - disse Dilma aos aliados.
Dentro da ação do governo para contornar a insatisfação, Ideli Salvatti (Relações Institucionais) procurou o ex-ministro Alfredo Nascimento. E, no meio da tarde, o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), reuniu-se com líderes aliados e o presidente da Casa, Marco Maia (PT-SP), para uma última tentativa de retomar as votações. Sem sucesso.
- Fui informado de que eu teria muito problema hoje. Dificilmente haverá quórum. Há um cansaço, uma fadiga. Mas acho que semana que vem melhora - disse Vaccarezza.
À noite, as reuniões continuaram. Sem acordo, votação, só semana que vem.
Em outra reunião com representantes de todos os partidos na Câmara, o líder do DEM, ACM Neto (BA), também informou que a oposição engrossaria a obstrução, até que Maia costurasse uma pauta de votação "do Congresso, não a do Planalto". E voltou a insistir na defesa de uma CPI sobre as denúncias no governo. Mas a preocupação do governo é com os aliados.
- A obstrução da oposição não é o foco de nossas preocupações. Vou admitir que há suposta crise na base por um conjunto de fatores. A base está unida, mas hoje existe desconforto. Se fosse pressionar uma votação (ontem), poderia criar dificuldade maior - disse Vaccarezza.
Com a insatisfação da base, o Planalto quer evitar o depoimento do ministro Paulo Bernardo, das Comunicações, no Congresso. O convite seria para ele dar explicações sobre os aditivos para obras do Dnit, quando era titular do Planejamento no governo Lula. O Planalto avalia que, pelo fato de ele ser do PT, Paulo Bernardo corre o risco de ser atacado até mesmo pela base aliada.
Colaborou: Isabel Braga
FONTE: O GLOBO
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