Para a acusação e para os réus, chega a hora em que o escândalo político não substitui mais as provas
A dez dias de iniciar-se o julgamento do mensalão, forma-se, entre os que têm acompanhado o caso, o consenso de que o Supremo Tribunal Federal e a opinião pública tendem a chocar-se em muitos dos 38 julgamentos individuais. Para a acusação e para os réus, chega a hora em que o escândalo político não substitui mais as provas, e cobra dos julgadores o máximo de verdade dos fatos e de si mesmos.
O pasmo causado pelo tráfico de dinheiro entre o PT e seus aliados, e os objetivos políticos daí surgidos contra o iniciante governo de Lula, levaram a um tumulto de deduções tanto verdadeiras quanto infundadas. A começar do nome -mensalão- criado pela eloquência metafórica do denunciante Roberto Jefferson, dando a ideia de pagamentos sistemáticos e mensais que não constavam do negócio.
A acusação lida no Supremo pelo ex-procurador-geral Antonio Fernando de Souza, de virulência só usual nos tribunais de júri, submeteu-se bastante ao clima emocional da CPI. Mas não levou mais além as provas de transações financeiras e de ações pessoais obtidas pela Polícia Federal, pela CPI ou por imprensa e TV.
Com isso, muitas acusações ficaram penduradas em deduções que também poderiam ser o contrário do que foram: havia a intuição, mas faltava a comprovação, a evidência. É assim, num dos exemplos mais fortes, a afirmação de que José Dirceu comandava as operações financeiras efetivadas por Delúbio Soares e outros.
Não há dúvida de que Dirceu foi o estrategista político da eleição e da linha programática do governo Lula. Disso há comprovações. Mas de que, depois, chefiasse "a quadrilha" que montou as artimanhas financeiras, não há evidência. Por que não teria sido Antonio Palocci, o braço do governo que transacionava com os bancos, e que já na campanha lidara com os interessados na política financeira futura e, no governo, lidava com o setor privado respectivo? Palocci não foi cogitado só por ser útil ao sistema financeiro privado? Do qual hoje é o veloz multimilionário "consultor"? Dedução por dedução, sem evidência, uma valeria o mesmo que a outra.
Não se sabe o que vai surgir, no decorrer do julgamento, em fatos e acréscimos esclarecedores. Muitos depoimentos foram tomados no processo judicial, por diferentes juízes, para o trabalho de relator do ministro Joaquim Barbosa. É possível que daí venham provas ainda sigilosas. Ou que venham as respostas não dadas nos depoimentos à CPI. O que Roberto Jefferson fez dos R$ 4 milhões que, disse, sobraram do dinheiro -o "mensalão"- dado pelo PT para deputados do PTB pagarem dívidas de campanha? E que fez o deputado Valdemar Costa Neto do dinheiro recebido com o mesmo fim?
E, mais importante, quem vai repor o dinheirão do Banco do Brasil, proveniente dos descontos no valor de sua maciça publicidade, não repassados ao banco pela agência de Marcos Valério, como obrigado em contrato? A propósito, o Tribunal de Contas da União, com parecer da recém-ministra Ana Arraes, acaba de anular a responsabilidade dos dirigentes do BB comprometidos com aquele desvio. Decisão estranha, por vários aspectos.
O mensalão ainda guarda emoções. Muitas delas, é a previsão mais difundida sobre o julgamento, o Supremo não poderia evitar. Apenas lamentar. Mas talvez venha daí a grandeza de um julgamento digno do nome.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
Um comentário:
Esse e o verdadeiro advogado de defesa.
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