A comissão formada na Câmara dos Deputados para propor uma nova versão da PEC 37, que impede o Ministério Público de realizar investigações criminais, é um exemplo auspicioso de como encaminhar questões polêmicas como essa para soluções de consenso.
Como já escrevi aqui, só a sua criação já é uma derrota para aqueles que viam na PEC um instrumento de retaliação à atuação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, no julgamento do mensalão. E uma ducha de água fria nos que, aproveitando-se da sede de vingança, queriam mesmo era um ambiente mais propício à maracutaia, sem o Ministério Público para investigar. Não é à toa que a proposta é conhecida como "PEC da impunidade".
Em um seminário organizado pelo Ministério Público do Rio que contou com a participação de representantes de todo o país, participei de um debate sobre a atuação do Ministério Público, onde expressei minha preocupação com "ações voluntaristas e partidárias". Ressaltei que nos últimos anos os acertos foram maiores que os erros, mas houve vários momentos em que o agente do MP foi acusado de abusar de suas prerrogativas.
"É ruim para a instituição uma identificação com petistas ou tucanos, por exemplo, pois coloca em risco as atribuições do MP", disse na ocasião, referindo-me a dois casos exemplares: a atuação do procurador Luiz Francisco de Souza nos governos do PSDB, acusado de trabalhar a favor do PT, e também a do subprocurador José Roberto Santoro, acusado pelo PT de ser ligado aos tucanos, notadamente a José Serra.
Já naquele momento discutia-se a participação do MP em investigações, e eu disse na ocasião que era "equivocada" uma substituição de poderes. "O ideal é que o exemplo de atuação do MP contaminasse a polícia. O trabalho conjunto seria ideal, não a substituição", disse. Defendi uma divulgação do trabalho do Ministério Público nas áreas de Proteção ao Meio Ambiente e do Consumidor, pois são assuntos que dão respaldo à imagem de que o Ministério Público defende a cidadania.
Com o julgamento do mensalão, o papel do MP ganhou maior visibilidade no combate à corrupção, e isso trouxe também problemas políticos adicionais para ele. A firmeza com que o relator do caso, hoje presidente do Supremo, ministro Joaquim Barbosa, levou o processo foi atribuída à sua origem no Ministério Público; e, da mesma maneira, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, caiu em desgraça junto ao PT por suas acusações, que levaram à condenação de líderes petistas como o ex-ministro José Dirceu e os deputados José Genoino e João Paulo Cunha.
Tudo indica que a comissão formada na Câmara, que conta com a participação de representantes das polícias e do Ministério Público, encontrará uma maneira de reforçar, e não tolher, o combate à corrupção, regulamentando a atuação do Ministério Público nas investigações sem tolhê-las.
Esta semana o procurador-geral do Banco Central, Isaac Sidney Menezes Ferreira, divulgou uma nota revelando a importância fundamental do trabalho do Ministério Público no combate aos crimes financeiros. Diz ele que a obrigação legal de comunicar ao MP os indícios de crimes fez com que mais de 16 mil comunicações tenham sido feitas pelo Banco Central.
Além disso, a lei permite que o Banco Central atue nas ações penais iniciadas pelo Ministério Público, existindo atualmente 55 processos em andamento. O procurador-geral do Banco Central diz na nota que a "atuação investigativa do Ministério Público tem resultado em relevantes contributos para a persecução penal", e pede que o " modelo de atuação compartilhada" seja mantido.
Fonte: O Globo
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