Para seguir como favorita, Dilma precisa manter acesa a chama de satisfação da
maioria do eleitorado. E isso, agora, passa a depender também das condições da
economia
A testa apoiada na mão direita, os olhos cerrados em sinal de cansaço, os
lábios formando um ríctus da irritação. O teor do bilhete pendente na mão
direita deve ter sido apenas gota d"água, na torrente de problemas dos
últimas dias, que levou a sempre contida e litúrgica presidente Dilma Rousseff
a permitir o registro da imagem, durante cerimônia sobre mudanças climáticas na
quarta-feira passada. Nenhuma outra fotografia, depois de sua posse, revelou
tanto estresse. Nosso sistema límbico não falha, denuncia os sentimentos pelas
expressões faciais. Mas a foto e as agruras decorrem de um momento ainda
distante da prova de fogo de 2014. Analistas e protagonistas não devem
subestimar a conjuntura nem fazer apostas fatalistas em seu agravamento e
consequências políticas.
O primeiro semestre está terminando com problemas agudos nas frentes
econômica, social e política. Ao longo da semana passada, o dólar disparou, as
bolsas caíram e a inflação, embora exibindo recuo em maio (0,37% contra 0,55%
em abril), encostou no teto da meta em 12 meses (6,5%). A ata do Copom, da
reunião que elevou os juros para 8%, fez várias advertências sobre a renitência
da inflação. Maio terminou com o IBGE divulgando um crescimento de apenas 0,6%
no primeiro trimestre, menor que o esperado, embora tenha havido crescimento de
1,9% em relação ao mesmo período de 2011. Na balança comercial, deficit de US$
5,392 bilhões desde janeiro. E para completar, pela primeira vez desde 2002,
uma agência de risco, a mesma que em 2008 conferiu ao Brasil o festejado
"grau de investimento" (S&P), fez apreciação negativa sobre a
economia brasileira. O governo não nega o inegável, mas aposta que o vento ruim
na economia vai começar a virar.
Na área social, houve a anárquica onda de saques dos benefícios do Bolsa
Família, provocados pela mal explicada antecipação dos depósitos pela Caixa e
pela ainda não esclarecida onda de boatos sobre o fim do programa. A questão
indígena ressurgiu forte, com ocupação de obras e conflitos na desocupação de
fazendas. A violenta ação policial terminou com um índio morto e um ferido.
Muito feio, na hora em que o brasileiro Paulo Vannucchi é eleito para a
Comissão Interamericana de Direitos Humanos. O aumento de tarifas de ônibus
deflagrou ações de vandalismo em São Paulo e outras cidades. Ao Nordeste que
sofre com a seca, Dilma anunciará um plano para a agricultura do semiárido.
Apesar de tudo isso, dizem auxiliares dela, não há desemprego nem encolhimento
da renda. O sentimento de melhora de vida continua alto. O governo tem lá suas
pesquisas.
Na política, as dificuldades econômicas dão discurso para o principal
candidato de oposição, o tucano Aécio Neves. Dilma enfrenta problemas com a
base aliada no Congresso, que ameaça derrubar seus vetos à Lei dos Portos e
aprovar o orçamento impositivo. A antecipação da campanha atiçou as disputas
estaduais na coalizão. Mas, enquanto a aprovação ao governo e a popularidade da
presidente se mantiverem altos, ninguém vai saltar do barco. Dos nove partidos
que a apoiaram em 2010, todos já se comprometeram com ela para 2014, exceto o
PSB do provável concorrente Eduardo Campos.
Há muito jogo pela frente, mas, para seguir como favorita, Dilma precisa
manter acesa a chama de satisfação da maioria do eleitorado. E isso, agora,
passa a depender também das condições da economia, uma variável de controle
relativo.
Vida real
Garantidos os direitos plenos das domésticas, a maior demanda das mulheres que
trabalham e criam filhos é por creches públicas. A partir de 2016, a creche e a
pré-escola, a partir dos quatro anos, serão obrigação do Estado, estabelece a
lei geral da Educação (LDBE). Dilma prometeu criar 6 mil creches até o ano que
vem. Segundo o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, foram planejadas
5.665, das quais 1.031 já foram entregues, l.872 estão com mais de 80% das
obras concluídas e serão entregues em 2014. Outras 630 estão mais atrasadas.
Dilma, que acompanha o cronograma por um tablet do MEC, providenciou recursos
para mais 3 mil, que já foram licitadas por pregão eletrônico. Um projeto
técnico comum permitirá que sejam construídas em até sete meses. Essa é uma
corrida que tem a ver com o voto. O mais claro adversário em 2014, Aécio Neves,
já começou a cobrar a promessa.
Na Bahia, quem diria
Na política, o impossível não existe mesmo. O governador da Bahia, Jaques
Wagner, viabilizou o compromisso de apoio do PTB a Dilma-2014, indicando o
presidente em exercício do partido de Roberto Jefferson, Benito Gama, para uma
vice-presidência do Banco do Brasil. E, lá no calor baiano, já se discute a
hipótese de uma aliança entre o PT e o prefeito de Salvador, ACM Neto. No
programa de TV do DEM que foi ao ar na quinta-feira, ele não atacou Dilma. Resumo
de Wagner: "O que ACM Neto disse é que não fecha a porta. E eu, do outro
lado, disse: ótimo. Se ele quiser vir, eu vou dizer o quê? Que acho ruim?"
Fonte: Correio Braziliense
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