Há duas informações particularmente notáveis nas últimas pesquisas de aferição da popularidade do governo e de intenção de voto para presidente. A primeira é o derretimento geral da presidenta Dilma Rousseff, que despenca nas avaliações relativas à aprovação de seu governo. A outra é o crescimento significativo da candidatura presidencial de Marina Silva.
A causa imediata do derretimento de uma e do crescimento da outra é a mesma: a mudança no clima político nacional acarretada pelas mobilizações de junho. Muito já se escreveu e disse sobre elas, na tentativa de encontrar um motivo: a qualidade dos serviços públicos e dos políticos, a truculência policial, a corrupção, o aumento da inflação etc.
Diante de tantas explicações plausíveis e parcialmente verdadeiras, sobra algo: o mal-estar com o status quo. E nenhum candidato representa tanto a rejeição ao status quo como Marina. É dissidente do PT e do atual governo; tem imagem avessa à corrupção e discurso contrário aos partidos tradicionais; é aberta a ideias econômicas mais liberais, sem descurar do apoio a políticas sociais e sem sucumbir ao aliciamento pelo grande capital; defende a sus-tentabilidade nas suas várias acepções. É verdade que é também evangélica e tem posições pessoalmente conservadoras em temas sensíveis aos religiosos. Porém, mostra-se pluralista, tolerante e aberta ao diálogo.
Com tudo isso, Marina mostrou-se a candidata certa no momento certo, o que explica crescer 10% de uma pesquisa para outra -mais do que a soma do crescimento dos demais candidatos de oposição. Mas nem tudo são flores. Justamente aquilo que impulsiona Marina parece ser sua principal limitação. Pode ganhar a eleição sem preocupar-se com alianças eleitorais, o que já não é fácil. Contudo, como fará para governar comum Congresso dominado por partidos de adesão, que apoiam qualquer governo desde que (e apenas se) bem recompensados? Seria mais fácil se a Rede, viabilizando-se, também tivesse um acachapante desempenho nas eleições congressuais. Isso, porém, é algo em que apenas "sonháticos" acreditam, tendo em vista as limitações financeiras, de tempo de TV e as redes políticas rivais - já constituídas.
Lula foi acusado de populista, sem sê-lo. E não era justamente porque rendeu-se à institucionalidade vigente. Marina, para governar, terá de vencer a despeito das instituições vigentes, que sabotariam seu projeto. Como o fará sem ser populista (o que claramente não é)? Esse é o desafio.
Cientista político, professor do curso de administração pública da FGV-SP e pesquisador do CEPESP-FGV e do CNPQ
Fonte: O Estado de S. Paulo
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