Não conheço local mais apropriado para alguém escrever um livro do que o campo inglês. Talvez não haja recanto mais bucólico do que aquelas terras verdejantes cortadas por riozinhos de águas transparentes e atravessadas por estradinhas que serpenteiam vales e montes.
Passear pelo campo inglês é encontrar, perdidas na paisagem, casinhas rústicas de paredes cinzentas e janelinhas pintadas de branco. Acolhedoras, elas provocam no viajante uma imediata sensação de intimidade. Imagens encantadoras povoam então a sua memória. Como esquecer aquelas cenas formadas pelas ovelhinhas que, distraidamente, pastam pelos campos? Ou o vôo livre dos pássaros e das borboletas, em espetáculo quase estonteante? O campo inglês é uma terra de fundos silêncios, onde podemos descansar prazerosamente à sombra de árvores centenárias, fincadas no alto das colinas.
E o melhor é que a literatura captou a beleza e a plenitude da vida campestre inglesa. Nutriu-se dela. A ponto de se desenvolver na Inglaterra uma novelística de base pastoril.
Curiosamente, a maior nação exportadora de produtos manufaturados do planeta voltava-se para o mundo rural. Se a revolução Industrial e o domínio dos mares significavam as principais características da economia inglesa, os vilarejos recônditos e a calma dos campos se apresentavam como a marca maior da sua literatura. Ou seja, mais as cidades se tornavam duras, poluídas e superpovoadas, mais a imaginação dos escritores clamava por lugares sossegados para se viver. Os escritores descobriam as verdadeiras fontes da vida: simplicidade, natureza, paz.
Romances como Tess, de Thomas Hardy, e Razão e sensibilidade, de Jane Austen - para ficarmos apenas nesses dois monumentos da literatura pastoril - nos ensinam que a arte existe para tornar nossas vidas efetivamente aprazíveis e serenas. As mudanças que desejamos por vezes operar no mundo real, nós as realizamos inicialmente na literatura e na arte. O imaginário sempre dá o primeiro passo para a transformação do mundo. Assim penso.
É que os livros, como os lírios dos campos, só podem ser livres.
Ivan Alves Filho, historiador e jornalista.
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