Ademais da mistura de ceticismo do mercado e de avaliação negativa pelos analistas e pela imprensa, o pacote de medidas basicamente de estímulo ao consumo com recursos dos bancos públicos, apresentado ao Conselhão na última quinta-feira, teve seu verdadeiro objetivo – a criação de um protagonismo político-administrativo da presidente Dilma – frustrado pela sucessão de manchetes relativas às investigações sobre corrupção envolvendo diretamente o ex-presidente Lula. Manchetes que dividiram, e dividem, espaço com as que tratam do salto no Brasil dos casos de microcefalia associados ao vírus zika, às vésperas das Olimpíadas no Rio, sobretudo por isso convertidos em emergência internacional pela Organização Mundial da Saúde. Quanto às medidas anunciadas no Conselhão, editorial da Folha de S. Paulo, de sábado – “O que fazer” – resumiu bem o ceticismo e as críticas que elas suscitaram: “Em vez de pacotes de crédito, o governo Dilma precisa apresentar um conjunto de reformas do gasto público para devolver rumo ao país”. Enquanto o do Estado de S. Paulo, do mesmo dia, foi mais agudamente crítico: “O pacote de crédito apresentado no convescote do Palácio do Planalto é a reedição do estilo de política fracassado nos últimos anos. Intervencionista quando deveria delegar a iniciativa ao mercado, o governo se revela – mais uma vez – incapaz de tomar a dianteira dos investimentos quando sua liderança seria essencial”.
Quanto às investigações (as dirigidas de Curitiba pelo juiz Sérgio Moro, as paralelas e convergentes da operação Zelotes e as desencadeadas pelo Ministério Público de Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro, reforçadas por iniciativas da própria imprensa), quase a cada dia apuram-se e revelam-se fatos comprometedores, legal e politicamente, do ex-presidente Lula. Ligados ao triplex do condomínio Solaris no Guarujá e ao sítio de Atibaia (com área equivalente à de 24 campos de futebol, piscina, lago, várias suítes). Por ele e familiares, frequentado assiduamente nos fins de semana, com a custosa escolta de vários seguranças da Polícia Federal, mesmo na sua ausência. O primeiro imóvel sendo avaliado por Sérgio Moro como parte de um “empreendimento imobiliário utilizado para repasses disfarçados de propina a agentes envolvidos no esquema criminoso da Petrobras”.
Os efeitos eleitorais da nova fase dessas investigações já foram medidos por pesquisa nacional realizada pelo Instituto Ipsos, divulgada e analisada em ampla reportagem da edição de ontem do Valor. Trechos da matéria: “Dois terços dos entrevistados acham que Lula não tem mais moral para falar de ética...”. “Na avaliação de 67%, o escândalo da Lava-Jato mostra que o ex-presidente é tão corrupto quanto outros políticos. No mensalão, 49% tinham essa percepção”. “Para o presidente do Ipsos, Cliff Young, a investigação sobre os desvios na Petrobras reforçam o vinculo do ex-presidente à corrupção, e teria tornado ‘inviável’ sua eventual candidatura à Presidência em 2018”. Segundo ele, a imagem de Lula está muito fragilizada, acrescentando “Mesmo sem os escândalos já seria difícil para ele candidatar-se novamente por conta da má avaliação do governo da presidente Dilma e do ‘cansaço’ com o PT”.
A implicação política imediata mais significativa do forte desgaste de Lula será a piora das relações entre o Executivo e o Congresso, inclusive no Senado, no ano legislativo que começa. Num cenário em que a contraposição ao governo (para a troca dele ou choque com seus interesses) se fortalecerá com uma postura antipetista que as bancadas não esquerdistas de partidos da base oficial de sustentação do Planalto vão assumir nas eleições municipais. Sob pressão das reações sociais ao desemprego, à inflação, a mais impostos, aos escândalos de corrupção. O que provavelmente inviabilizará o principal projeto do Executivo – a recriação da CPMF. E se refletirá também no PMDB por meio de uma retomada pela direção a ser reeleita do distanciamento em relação ao Executivo (no caso da continuidade deste) e do projeto de candidatura presidencial própria em 2018, baseada numa disputa do antipetismo com o PSDB. Outra implicação do desgaste do lulopetismo será o enfraquecimento da aliança no Congresso contra a operação Lava-Jato e seus desdobramentos, articulada pelo ex-presidente com os caciques do Senado, à frente Renan Calheiros. Porque, ao invés de esvaziadas e contidas, como essa aliança esperava, as investigações anticorrupção estão ganhando mais apoio social e fôlego institucional.
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Jarbas de Holanda é jornalista
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