Num ato de sensatez, a presidente Dilma desceu do pedestal em que costuma ficar e aceitou a sugestão do ex-ministro Delfim Netto de comparecer à abertura dos trabalhos no Congresso e apresentar propostas contra a crise. Mas só cumpriu parte do conselho de Delfim, porque não seguiu na íntegra a pauta de mudanças que ele e muitos economistas defendem: além da reforma da Previdência, já metabolizada por Dilma, a desindexação e desvinculação do Orçamento, e mais a reforma trabalhista, para enfim desengessar as relações patrão-empregado.
Mas o pedido de ajuda feito pela presidente ao Congresso, necessário dada a gravidade da crise criada com a participação dela a partir do segundo mandato de Lula, precisa ter desdobramentos concretos. O tempo passa, e as estatísticas econômicas apontam cada vez mais para o pior.
Não é fácil entabular esta conversa, também em função da fragilidade da presidente e da própria crise política, simbolizada, na terça- feira, pela presença na Mesa do Congresso, junto com Dilma, de dois investigados pela Operação Lava- Jato, o senador Renan Calheiros (PMDB- AL) e o deputado Eduardo Cunha (PMDB- RJ), presidentes do Senado e Congresso, e da Câmara. Mas o entendimento tem de ser buscado, em nome do país.
Como diálogo implica ceder, o governo tem de rever a postura inflexível quanto à recriação da CPMF, cuja rejeição da sociedade foi sonoramente simbolizada por vaias de pelo menos metade dos parlamentares presentes na Casa, toda vez que Dilma a mencionava. Com uma carga tributária já nas alturas, a via de mais impostos reduz ainda mais a renda pessoal. Piora a recessão.
Com acerto, a presidente propõe limitar o crescimento dos gastos, mas, cavilosamente, defende metas fiscais “flexíveis”. Isso porque o seu compromisso com a austeridade nunca é firme. E ela prefere manter a maior parte dos gastos (Previdência e outros ditos sociais) indexada ao salário mínimo. Há, portanto, uma impossibilidade aritmética de a meta de superávit primário de 0,5% do PIB ser atingida. Esta é a conclusão de quem analisa as últimas estimativas do mercado (Relatório Focus) para este ano: inflação de 7% e recessão de 3%. Mais uma vez haverá queda de receita e o salário mínimo terá um reajuste que elevará bastante as despesas públicas. Déficit alto, sem dúvida. Na verdade, o governo quer metas “flexíveis” para acomodar as coisas diante das pressões do PT e de aliados contra o ajuste.
É inaceitável, além de ser erro crasso, porque as expectativas continuarão negativas, os investimentos não voltarão no setor privado — o único capaz de investir —e o Brasil se manterá na trajetória de uma depressão.
Renan Calheiros aproveitou a solenidade de abertura do ano legislativo para lembrar medidas de peso: a autonomia do Banco Central, mudanças na regra do pré-sal para aliviar a quase falida Petrobras etc. Mas a prioridade tem de ser a agenda do ajuste fiscal.
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