sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Defesa de Lula é frágil diante de tantas denúncias – Editorial | O Valor Econômico

O ex-presidente Lula entrou em uma roda-viva judicial na qual pode perder a liberdade. Com o novelo da corrupção já em grande parte desenrolado, deixaram há muito de ser críveis as alegações de Lula - na verdade, uma só, repetida à exaustão, a da perseguição política. Hoje esse é o mesmo argumento do presidente Michel Temer para tentar se desviar da pilha de suspeitas que se acumula à porta do Planalto, na qual sobressai seu círculo íntimo: Geddel Vieira, Moreira Franco e Eliseu Padilha.

O ex-presidente Lula, sempre pródigo em discursos, foi por todo o tempo em que tem sido investigado pela Lava-Jato muito parcimonioso com os assuntos que podem levá-lo à cadeia. Quando se explicou, explicou-se pouco e mal, sempre alegando desconhecer a roubalheira generalizada que progrediu em seus governos. Uma pequena parte da história já fora revelada com o mensalão, e Lula também não se moveu com coerência no episódio. A princípio negou, depois se disse indignado por ter sido traído pelos "companheiros" e por fim prometeu escrever um livro comentando a verdadeira farsa do "mensalão", mais um capítulo da história da conspiração das elites que tratava com especial deferência como presidente.

Não foram os petistas que inauguraram a corrupção no Estado, nem foram os únicos, nem mesmo os maiores beneficiários dela. Mas foram os mais persistentes e enfáticos durante anos - fora do poder - ao prometer realizar uma faxina geral no Estado e acabar com a pandemia de roubo do dinheiro público. O PT cometeu a proeza de se adaptar rapidamente a esquemas escusos, quando chegou ao poder, e a de ganhar a pecha de principal responsável pelo assalto ao Estado, que muitos partidos antes dele praticaram com dedicação.

O alegado e reiterado desconhecimento dos malfeitos por Lula teve consequências, já que a Justiça busca responsáveis. José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil, foi tido como líder de organização criminosa e está prestes a cumprir uma longa pena por crimes cometidos durante o mensalão e depois dele. Praticamente nenhum tesoureiro do PT escapou da polícia, a começar por Delúbio Soares, que frequentava o Palácio do Planalto e vaticinou que as falcatruas do mensalão se tornariam piada de salão no futuro - e se tornaram, pelas quantias modestas então movimentadas.

A principal figura dos governos de Lula foi Antônio Palocci, ministro da Casa Civil após a queda de Dirceu. Palocci não só aplainou o caminho de Lula entre as elites, confeccionando um programa moderado distante do petista, expresso na "Carta aos Brasileiros", como embrenhou-se no submundo de relações nada republicanas que envolvem governo, partidos, empresas privadas e estatais. Caiu em um episódio rumoroso que envolveu a quebra de sigilo bancário de um caseiro. Teve mais uma chance no mesmo posto em novo governo, como contrapeso lulista à inexperiência de Dilma Rousseff, mas teve que sair diante de sinais marcantes de enriquecimento ilícito.

Palocci, o homem de confiança de Lula, está na cadeia desde setembro de 2016 e foi condenado a 12 anos de prisão. Jogou uma cartada pessoal decisiva para salvar-se, com efeitos devastadores para Lula e o PT. Ao candidatar-se à delação premiada, Palocci depôs e confirmou todas as suspeitas da Lava-Jato. Será preciso que as prove. Em seu relato estão o sítio de Atibaia, as palestras de R$ 200 mil de Lula pagas pela Odebrecht, o Instituto Lula e mais R$ 300 milhões para as necessidades do ex-presidente, já fora do poder. Afirmou ainda que Lula sabia de toda a rede de ilicitudes que permeava seu governo, da qual Dilma Rousseff teria também conhecimento - seria então Lula, como Janot o acusou, o chefe de uma organização criminosa.

Lula é réu em cinco processos e foi denunciado em mais três. Em seu depoimento de anteontem ao juiz Sergio Moro, ele tratou de reagir a Palocci acusando-o de mentiroso, frio e calculista. A ameaça mais imediata a Lula é a confirmação em segunda instância, pelo Tribunal Federal de Porto Alegre, da condenação de 9 anos e meio no caso do tríplex do Guarujá. Ela pode impedi-lo de concorrer à Presidência, tornar mais próxima a perspectiva de prisão e pôr fim a sua carreira política. A cúpula petista, por sua relutância ativa em realizar uma honesta crítica sobre os anos do PT no poder, tende à desmoralização. A perspectiva de uma surra nas urnas é a antessala da cisão do partido e de sua perda de influência na esquerda do país, hoje atônita e sem rumos.

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