Em nota, Presidência afirma que denúncia é ‘rechada de absurdos’; defesa busca adiar tramitação
Eduardo Barretto, André de Souza e Cristiane Jungblut | O Globo
BRASÍLIA- Dez minutos depois de chegar ao gabinete, voltando da viagem ao Tocantins e ao Pará, o presidente Michel Temer foi denunciado criminalmente pela segunda vez. Ele preferiu deixar um possível pronunciamento para hoje, enquanto sua defesa pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que pare a tramitação da denúncia, evitando que a peça de acusação da ProcuradoriaGeral da República (PGR) seja enviada logo à Câmara.
Em nota, Temer fugiu à tradição de comunicados sóbrios do Palácio do Planalto e partiu para o ataque direto ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, acusando o chefe do Ministério Público Federal de irresponsabilidade, incompetência e de arriscar o mecanismo de delação premiada, ironizado pelo Planalto como “delação fraudada”.
A segunda denúncia contra o presidente — desta vez por organização criminosa e obstrução à Justiça — foi qualificada pelo Palácio como “recheada de absurdos” e “realismo fantástico em estado puro”. Temer diz ter “certeza” de que “versões, fantasias e ilações” darão lugar à “verdade”. “O governo poderá então se dedicar ainda mais a enfrentar os problemas reais do Brasil”, conclui a nota.
A estratégia contra a denúncia tem quatro frentes. O objetivo do Palácio do Planalto é paralisar a peça acusatória o máximo possível no âmbito do Judiciário. No plano político, a ordem é que os aliados defendam esse adiamento e ainda redobrem os ataques a Janot, destacando que ele mesmo se desgastou ao admitir “omissões gravíssimas” no processo de delação da JBS — o objetivo é montar cerco a Janot, à JBS e ao ex-procurador Marcello Miller dentro da CPI da JBS. E o Planalto fará ainda um “pente-fino” na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ), para ver se há risco de traições. A expectativa é que o caso não chegue à Câmara antes da próxima quarta-feira.
“MARCHA IRRESPONSÁVEL”
Auxiliares de Temer reconhecem o desgaste de mais uma denúncia contra o presidente, principalmente travando a aprovação da reforma da Previdência, carro-chefe das reformas econômicas que o governo pretende aprovar no Congresso. Os aliados, entretanto, tentam minimizar as acusações de Janot, apostando na “fragilidade” da denúncia. O discurso repetido à exaustão no Planalto é o da “árvore envenenada”. Isto é: os elementos que enfraqueceram os acordos de delação premiada de executivos da JBS e provocaram as prisões desses empresários invalidariam as provas contra Temer.
O presidente, segundo assessores, estava “mais tranquilo do que na primeira denúncia”.
“O procurador-geral da República continua sua marcha irresponsável para encobrir suas próprias falhas. Ignora deliberadamente as graves suspeitas que fragilizam as delações sobre as quais se baseou para formular a segunda denúncia contra o presidente da República, Michel Temer”, diz comunicado do Planalto, que fala em urgência para investigar “indícios consistentes” contra a equipe de Rodrigo Janot.
Antônio Mariz, advogado de Temer, quer que o STF conclua um julgamento iniciado na quarta-feira em que ele pediu a suspensão de apresentação de denúncia até que termine a apuração sobre a validade das provas da delação da JBS.
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin, relator dos processos da Lava-Jato e da maior parte das investigações que envolvem Temer, só enviará a denúncia ao Congresso depois do julgamento do pedido da defesa.
Um novo áudio lançou suspeitas sobre ações tomadas pelos colaboradores, levando Janot a abrir uma investigação interna sobre o caso.
O STF não concluiu a análise do caso, que será retomado apenas na semana que vem. Assim, não houve impedimento para Janot apresentar a segunda denúncia contra Temer.
O Planalto avalia que o cenário é mais favorável a Temer do que na primeira denúncia. Um dos motivos é o desgaste de Janot, as contradições dos irmãos Batista e a contestada atuação de Marcello Miller no processo. A meta é barrar a denúncia ainda na discussão no STF ou até no Ministério Público Federal. Mas, se isso não ocorrer, querem uma tramitação rápida na Câmara. Nos bastidores, o temor no Planalto não é com a acusação de Janot, mas sim com uma delação do ex-ministro Geddel Vieira Lima. Por isso, querem enterrar a denúncia “antes que Geddel fale”.
Na primeira denúncia, o governo teve que trocar quase todos os integrantes da CCJ da Câmara. Agora, a avaliação é que a situação é mais tranquila, mas é preciso “ficar de olho”, segundo um aliado. Outra preocupação é com o presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), que, da primeira vez, escolheu o deputado Sergio Zveiter (Podemos-RJ) para ser relator do caso. Ele acabou votando pelo prosseguimento da denúncia. Com a derrota do parecer de Zveiter, Pacheco foi enquadrado e escolheu o deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG), alinhado ao governo, para ser o relator do parecer vencedor, ou seja, da decisão de rejeitar a denúncia contra Temer. Agora, querem saber o humor de Pacheco e dizem que a relatoria está sendo negociada.
Segundo aliados, o próprio Temer vai receber os integrantes da CCJ para estabelecer a estratégia de defesa. Temer terá que atuar porque grande parte da base aliada, principalmente os partidos do centrão, não aceitam a articulação política do ministro Antonio Imbassahy (Secretaria de Governo).
— A base vai vender dificuldades para colher facilidades — resumiu um interlocutor de Temer.
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