quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Balança sinaliza saldo maior, mas incertezas prevalecem – Editorial | Valor Econômico

A pandemia e sua evolução desconhecida tem repercussão importante nos preços e na demanda dos produtos exportado
 O superávit de US$ 8,06 bilhões da balança comercial em julho marcou um recorde histórico mensal de todos os tempos, ajuda a economia em momento de extrema fragilidade, reforça as contas externas, traz divisas para o país, mas está longe de ser motivo de maiores comemorações. Tanto as exportações quanto as importações caíram. Houve uma redução da corrente de comércio. As exportações estão mais do que nunca concentradas em um comprador, a China, e em um punhado de produtos. Todos esses aspectos são reflexo do enfraquecimento da economia global causado pela pandemia do novo coronavírus. 

 O saldo comercial obtido em julho foi mais do que o triplo do registrado no mesmo mês em 2019. Na mesma base de comparação, as importações, que já vinham caindo e encolheram 27% em junho, registraram novo tombo, de 35,2% no mês passado. Teve forte influência nesse resultado o recuo de 33,6% em bens da indústria de transformação, como reflexo da retração econômica interna. Já as exportações tiveram queda de 2,9%. 

 O desempenho acumulado no ano também reflete o recuo dos negócios. A corrente de comércio caiu 8,2%, de US$ 231,1 bilhões de janeiro a julho de 2019 para US$ 212,2 bilhões em igual período deste ano. No acumulado até julho, as importações ficaram em US$ 90,9 bilhões, com queda de 10,5% pela média diária apurada pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex); e as exportações somaram US$ 121,286 bilhões, com diminuição de 6,4% na comparação com o mesmo período de 2019. O saldo acumulado supera os US$ 30 bilhões. 

 A expectativa é que o ano termine com um total de exportações e importações menores do que o registrado no ano passado, embora o saldo possa até ser superior. A avaliação é que, até agora, os números sustentam a previsão do governo de superávit de US$ 55,4 bilhões. Alguns analistas projetam um saldo ainda maior, de US$ 60 bilhões, apesar da expectativa de que a retomada da economia deva ampliar as importações. 

O resultado deve assim superar com folga o saldo de US$ 46,6 bilhões registrado em 2019; e possivelmente o de US$ 58 bilhões de 2018. O desempenho será um feito, considerando que um dos mais importantes parceiros comerciais do Brasil, a Argentina, está com economia totalmente combalida e só conseguiu fechar nova renegociação da dívida no último momento, nesta semana. Os Estados Unidos, parceiro igualmente importante, também tem a economia afetada de modo importante pela pandemia. 

Mas a resposta rápida da China, que entrou primeiro na crise e começa a sair dela antes dos demais países, a desvalorização cambial e a demanda global pelas commodities, mesmo com preços em queda, sustentam as previsões otimistas. Após cair 6,8% no primeiro trimestre sobre o mesmo período de 2019, a economia chinesa cresceu 3,2% no segundo trimestre. 

Na avaliação de especialistas, a reação em V sinaliza que a China deve ser um dos raros países a crescer este ano. Não deverá repetir o desempenho espetacular de alguns anos atrás, mas ficar no terreno positivo no cenário atual já será um feito. Há quem diga que no quarto trimestre a economia chinesa já estará perto do ritmo de sua tendência de longo prazo, com crescimento de 5,5% ao ano. 

 Cálculos feitos pelo Barclays com base em dados do Ministério da Economia indicam que os embarques do Brasil para a China cresceram 14,6% de janeiro a junho, somando US$ 34,35 bilhões, enquanto caíram 15,2% para o resto do mundo (Valor 27/7). Há algumas outras exceções também localizadas na Ásia, como a Indonésia, Vietnã e Coreia do Sul, mas cujas compras do Brasil são em volumes consideravelmente menores. 

 A participação da China na pauta de exportações brasileiras cresceu mais, de 27% no primeiro semestre de 2019 para 34% no mesmo intervalo de 2020, apesar das estocadas de Brasília em Pequim. É o maior percentual desde 2000, primeiro ano da série elaborada pelo banco. Do superávit de US$ 22,3 bilhões acumulado pela balança no primeiro semestre, a China responde por US$ 17,7 bilhões, ou quase 80% do total. A demanda chinesa concentra-se nos produtos básicos: de janeiro a junho, os embarques de soja e minério de ferro cresceram 31% e 27%, respectivamente. 

 De toda forma, as previsões para a balança comercial neste ano devem ser encaradas com cautela. A pandemia e sua evolução desconhecida adiciona muita incerteza ao cenário, com repercussão importante nos preços e na demanda dos produtos exportados e na economia global.

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