Editoriais
Brasil
empobrecido
Folha de S. Paulo
Ao
priorizar o populismo fiscal, Bolsonaro reforça a expectativa de mais inflação
e baixo crescimento
O
vale-tudo irresponsável
patrocinado por Jair Bolsonaro (PL) para tentar amenizar a
situação dos eleitores na campanha eleitoral não esconde o fato de o país ter
empobrecido durante sua gestão.
O
Brasil ficou mais pobre com Bolsonaro não apenas por causa da Covid-19 ou da
guerra na Ucrânia, dois eventos extraordinários que abalaram o mundo e
trouxeram desafios para vários governos.
Apesar
de a maioria deles estar convivendo com surtos inflacionários e desarranjos
internos, comparativamente estão em situação mais favorável. Segundo pesquisa em
cem países da Nielsen Media Research,
64% dos brasileiros afirmam sofrer restrições orçamentárias após a fase aguda
da crise sanitária. Na média global, são 46%.
De
acordo com o IBGE, o rendimento médio mensal dos brasileiros hoje é menor,
descontada a inflação, do que quando Bolsonaro assumiu: R$ 2.613, ante R$ 2.823
no início de 2019.
No
dia a dia, além da piora nas estatísticas relativas à fome, a perda de poder
aquisitivo é explicitada pela busca generalizada da indústria em oferecer
produtos de pior qualidade aos consumidores.
Mesmo antes de a pandemia atingir o país, em fevereiro de 2020, o rendimento médio dos brasileiros já era menor do que no começo do governo Bolsonaro, consequência das escolhas do início da gestão, como a de diminuir investimentos públicos na área social e ignorar a fila de beneficiários de programas de distribuição de renda.
Em
2019, o Bolsa Família sofreu a maior queda da história, recuando o atendimento
de 14 milhões para 13 milhões de famílias; e a fila de espera superou 1,5
milhão.
Após
a introdução do auxílio emergencial de R$ 600 na pandemia, no final de 2021 o
governo substituiu o Bolsa Família pelo Auxílio Brasil de R$ 400, para cerca de
17,5 milhões de beneficiários. Agora, a três meses da eleição, fez aprovar no
Congresso o valor de R$
600 a 18,1 milhões de famílias —mas só até dezembro.
Não
resta dúvida de que algo deveria ter sido feito. Mas não são pequenas as falhas
do programa, como o pagamento do mesmo valor a todos, independentemente do
número de filhos nas famílias.
Mais
grave é o fato de um governo que se vendeu como modernizante não ter aprovado
nenhuma grande reforma estrutural, à exceção da
previdenciária, gestada por seu antecessor, Michel Temer. Outras
mudanças fundamentais, como as reformas tributária e administrativa, foram
abandonadas ao longo do caminho.
Ao
priorizar o populismo fiscal em seu último ano, Bolsonaro só reforça a
expectativa de um legado de inflação, baixo crescimento e empobrecimento
futuros.
Vacinar
os pequenos
Folha
de S. Paulo
Aval
da Anvisa para imunização de crianças de 3 a 5 anos ocorre em meio a alta das
hospitalizações
O
aval dado pela Anvisa à vacinação de crianças de 3
a 5 anos contra a Covid-19 constitui avanço importante no
imperativo de imunizar toda a população brasileira, além de trazer alívio a
pais cujos filhos se encontram entre os grupos hoje mais vulneráveis à doença.
De
maneira unânime, a agência federal aprovou de forma emergencial (13) o uso da
Coronavac para essa faixa etária, e desde a última sexta capitais já vêm
promovendo campanhas de imunização.
O
esquema vacinal indicado é idêntico ao do restante da população: mesma dosagem
e intervalo de 28 dias entre a primeira e a segunda doses. Assim, o Brasil se
junta a outros 13 países, como Chile, China, Estados Unidos e Israel, nos quais
a imunização de menores de 5 anos já acontece.
Com
o vírus circulando livremente entre os pequenos e o progressivo abandono de
medidas protetivas, como as máscaras, hospitais passaram a registrar
recentemente um aumento expressivo de internações de crianças por Covid.
No
mês passado, análise do Infogripe-Fiocruz, projeto que monitora casos de Srags
(síndromes respiratórias agudas graves), apontou que o grupo etário de 0 a 5
anos tornou-se, com a exceção da população acima de 60 anos, o de maior risco
de hospitalização.
Em
novembro do ano passado, por exemplo, esse contingente não representava 5% dos
casos semanais de Srag por Covid-19 no país, mas, desde abril, esse percentual
vem alcançando até 15%.
O
país, ademais, tem registrado a inaceitável média de cerca de duas mortes por
dia de crianças abaixo de cinco anos. Segundo a análise do Observa Infância,
houve, em 2020 e 2021, 1.439 óbitos nessa faixa etária. Em 2022, já são pelo
menos mais 291 mortes.
Tão
importante quanto imunizar os menores de cinco é avançar na proteção da
população de 5 a 11 anos, apta a receber a vacina desde janeiro. Nessa faixa, o
percentual de vacinados com a primeira dose alcança 63%, e o da segunda dose
está estagnado em 40%.
A
imunização em massa de crianças não apenas reduz as chances de hospitalizações
e óbitos por Covid, mas também evita que elas possam se tornar reservatórios do
coronavírus, gerando novas cepas e transmitindo-as para outros grupos
vulneráveis.
Trata-se
de um risco que não pode ser negligenciado num país em que a moléstia ainda
ceifa mais de
200 vidas por dia.
Calor
infernal é recado incômodo
O
Estado de S. Paulo
Cabe aos líderes políticos sensibilizar a sociedade sobre defesa do meio ambiente, ainda que os eleitores estejam mais preocupados com inflação do que com as mudanças climáticas
Uma
combinação de calor extremo e tempo seco tem causado incêndios florestais
devastadores na Europa desde o último fim de semana. As noites em Madri têm
registrado temperaturas de 25 graus, o que teria ocorrido apenas 27 vezes nos
últimos cem anos – 12 delas desde 2012. São vários, além de óbvios, os efeitos
das mudanças climáticas em todo o planeta – de catástrofes a alterações na
culinária, como observado na Itália e na França. Estudos não apenas provaram,
como mensuraram as consequências de ações diretas do homem sobre a temperatura
do planeta, um fato inequívoco e irreversível. O desafio que se impõe para conter
emissões e mitigar suas consequências é gigantesco, especialmente para as
nações que dependem majoritariamente de combustíveis fósseis.
Felizmente,
esse não é o caso do Brasil. Pioneiro em biocombustíveis e dono de uma matriz
elétrica predominantemente renovável, o País tem todas as condições de liderar
a transição rumo a uma economia verde. Essa posição de destaque, porém, fica
completamente desmoralizada quando o País se recusa a fazer o mínimo que dele
se espera. Como mostrou o Estadão, a mais recente edição do Relatório
Anual de Desmatamento no Brasil, da MapBiomas, uma iniciativa do Observatório
do Clima realizada por ONGs, universidades e empresas de tecnologia, apontou
que o desmatamento aumentou assustadores 20,1% no ano passado e alcançou 16,5
mil quilômetros quadrados, o equivalente a uma área verde próxima do Estado do
Rio de Janeiro.
O
relatório é um dos mais completos diagnósticos do desmazelo do governo Jair
Bolsonaro na área ambiental. Quase 70 mil alertas foram identificados,
validados e refinados em todo o território nacional, com elaboração de laudos
com imagens anteriores e posteriores às ocorrências. O principal alvo, em
termos territoriais, não surpreende: a Amazônia, que gerou 66,8% de todos os
alertas e perdeu 18 árvores por segundo. Nada menos que 86% da área total
desmatada na região no ano passado ficava, total ou parcialmente, em um imóvel
registrado no Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural, o que permitiria
identificar e punir os responsáveis com precisão.
Mas
o projeto de destruição da democracia e do tecido social liderado por
Bolsonaro, tão agressivo com os adversários, é benevolente com aqueles que
cometem crimes ambientais e ameaçam não só o futuro da sociedade, mas a própria
economia. Estudos sobre rios voadores da Escola Superior de Agricultura Luiz de
Queiroz (Esalq-USP) provaram, ainda na década de 1970, que boa parte das chuvas
no centro-sul tem origem na Amazônia. É sabido que o desmate da floresta
comprometeria de forma irreparável o balanço hídrico das regiões que concentram
as maiores lavouras do País.
Apostando na impunidade de aliados e de si mesmo, Bolsonaro acredita que não será cobrado pelos eleitores por sua conivência com a devastação da Amazônia. Em tempos de guerra na Ucrânia, preços elevados e avanço da fome, preocupações sobre o meio ambiente e as mudanças climáticas de fato tendem a ficar em segundo plano para a parcela da sociedade que luta pela sobrevivência diária.
Isso
não acontece só no Brasil. Uma pesquisa nos EUA, publicada pelo jornal The
New York Times, mostrou que apenas 1% dos eleitores apontou as mudanças
climáticas como a questão mais importante a ser enfrentada no país, muito atrás
da inflação e da economia – e o fracasso do pacote socioambiental de US$ 6
trilhões do presidente Joe Biden talvez seja o reflexo mais claro dessa
percepção.
Não
há razões para acreditar que no Brasil os eleitores pensem de forma muito
diferente, mas isso não autoriza a classe política a ignorar essa temática.
Defender o meio ambiente e reduzir as emissões para conter as mudanças
climáticas é obrigação de qualquer liderança que tenha uma visão de longo prazo
sobre o papel do Estado e o futuro do País. No Brasil, a tarefa de sensibilizar
a sociedade a respeito de sua relevância é relativamente fácil: basta preservar
a Amazônia, algo que une os interesses do agronegócio, o setor mais pujante da
economia, aos das novas gerações, mais conectadas a uma causa que deveria ser
de todos.
Quando
o Estado funciona
O
Estado de S. Paulo
São muitas as experiências positivas de qualificação de políticas públicas em parcerias com universidades e outras entidades. Nem tudo no setor público é ineficiente ou eleitoreiro
São
notórias e desoladoras a disfuncionalidade e a irresponsabilidade do Executivo
federal. Em parceria com o Congresso, o governo de Jair Bolsonaro tem produzido
uma baciada de retrocessos sociais, econômicos e institucionais. A Emenda
Constitucional (EC) 123/2022, que inventou um estado de emergência na
Constituição para permitir a compra de votos, é a síntese desses tempos
sombrios. De toda forma, por mais que a destruição e a desorganização
promovidas por Jair Bolsonaro sejam extensas e tenham efeitos de curto, médio e
longo prazos, é preciso destacar que nem tudo no setor público é ineficiência,
negacionismo ou desperdício. Como mostrou recente reportagem do Estadão,
uma série de políticas públicas, promovidas por prefeituras e governos
estaduais em parceria com universidades e organizações da sociedade civil, tem
conseguido apresentar respostas excelentes na educação, na saúde e em várias
outras áreas.
Essas
ações eficazes são a antítese de políticas populistas e eleitoreiras, que
apenas buscam atenuar, de forma temporária e simplista, determinada demanda.
“Quando o problema é complexo, as soluções precisam ser múltiplas”, diz o
coordenador-geral do Centro de Estudos de Administração Pública e Governo da
Fundação Getulio Vargas (FGV), Fernando Burgos, ressaltando que, para
funcionar, a política pública “precisa de uma equipe técnica e deve levar em
consideração contextos de implementação heterogêneos”.
É
justamente na identificação das necessidades específicas de cada área –
requisito para a qualidade da tomada de decisão na política pública – que
universidades e centros de pesquisa têm contribuído para uma atuação estatal
mais eficiente. Tão defendida atualmente, a ideia de que políticas públicas
precisam estar baseadas em evidências não é uma espécie de rigorismo acadêmico.
A elaboração de programas públicos construídos a partir de dados sólidos é o
que permite ao Estado oferecer uma resposta mais assertiva aos problemas. “A
ideia de políticas baseadas em evidências está muito ancorada em uma
necessidade de envolver diferentes segmentos da sociedade na coleta, produção e
disseminação da informação”, avalia Beatriz Caetana, do consórcio europeu
Urbinat. É o contrário do messianismo político – centralizador, dogmático e não
colaborativo.
Um
caso de sucesso é o programa Jovem de Futuro, do Estado do Espírito Santo em
parceria com o Instituto Unibanco. Voltado ao treinamento de gestores de
escolas e comunidades, o programa, que une avaliação e execução, promoveu o
aumento do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) do Estado.
O
superintendente executivo do Instituto Unibanco, Ricardo Henriques, destaca
que, além de incidir de forma positiva sobre vários indicadores, o programa do
Espírito Santo é um referencial “por perdurar mesmo com mudanças
governamentais, o que é uma expressão do enraizamento na máquina pública desses
procedimentos de gestão orientada para resultados a partir de evidências”.
Além
do uso das melhores evidências disponíveis, a eficiência dessa interlocução
entre o público e o privado exige monitoramento contínuo. Mais do que seguir
cegamente uma “fórmula vencedora”, a construção de políticas públicas
eficientes assemelha-se a uma conquista gradual de habilidades por parte dos
diversos entes envolvidos. É um processo de mútuo aprendizado.
A
promissora interação entre os setores público e privado desconstrói muitos
mitos e percepções reducionistas, que julgam o todo a partir de erros
particulares. As ineficiências da esfera pública não autorizam uma avaliação de
terra arrasada. Mesmo num cenário de pandemia e de crise econômica, veem-se
experiências muito positivas.
A
qualificação de tantas políticas públicas por meio de parcerias com o setor
privado demonstra também a plena viabilidade – não é uma utopia – de o Estado
atuar além da lógica meramente eleitoreira. Não existe uma “imposição do
sistema” para uma atuação estatal corrompida. É possível fazer o certo. O atuar
mal é uma escolha.
Aperto
das famílias emperra o PIB
O
Estado de S. Paulo
Inflação, juro alto e orçamento apertado freiam o consumo familiar, atrapalham os negócios e dificultam o crescimento
Com
dinheiro curto, preços em disparada e juros altos, as famílias seguram os
gastos e impõem um freio ao crescimento da economia, como apontam os números de
maio do Monitor do PIB-FGV, a mais detalhada prévia mensal do Produto
Interno Bruto (PIB). O consumo familiar, um dos principais motores da produção,
diminuiu 2,1% entre abril e maio. Com o aperto do orçamento e o crédito caro,
reduziram-se as compras de produtos menos essenciais, como produtos
semiduráveis e duráveis, comentou a coordenadora da pesquisa, Juliana Trece.
“Após
três meses consecutivos de crescimento, a economia retraiu-se 0,8% em maio”,
resumiu a coordenadora. A produção industrial voltou a recuar, depois de alguns
meses de expansão. A atividade continuou, no entanto, em níveis superiores aos
do ano passado. Em maio, o PIB foi 4,4% maior que um ano antes. No trimestre
móvel, superou por 3,7% o resultado de igual período de 2021. Também nos meses
de março a maio o consumo das famílias foi 5,8% superior ao de um ano antes.
Apesar
de algum avanço em relação a 2021, o quadro geral da economia continua marcado
por baixo dinamismo industrial e por más condições no mercado de trabalho.
Mesmo com alguma diminuição, o desemprego permaneceu elevado nos primeiros
cinco meses do ano, assim como a informalidade e a subutilização da mão de
obra. Não há referência a esses detalhes no relatório divulgado pela FGV, mas a
desocupação, o desalento, a subocupação e a informalidade obviamente afetam as
condições de consumo das famílias.
Não
por casualidade, o número de consumidores inadimplentes chegou a 66,6 milhões
em maio, atingindo novo recorde, segundo levantamento periódico da Serasa
Experian. Muitos inadimplentes, como têm mostrado algumas pesquisas, se
endividaram em bancos para pagar outras dívidas e acabaram sem condições de
ajustar sua vida financeira. Os dados negativos do consumo refletem, portanto,
mais do que o aperto crescente do orçamento familiar. Refletem também o drama
de um número crescente de famílias atoladas em dívidas.
Mais
do que uma economia em marcha lenta, o Monitor mostra um país com
pouco potencial de crescimento nos próximos anos. O investimento em capital
fixo, isto é, em máquinas, equipamentos e obras, aumentou 1,6% entre abril e
maio, mas ainda correspondeu a 19,3% do PIB. Uma taxa de 25% seria mais
parecida com os padrões observados em emergentes mais dinâmicos que o Brasil.
Investimento em capacidade produtiva depende de confiança nas condições
econômicas e políticas do País.
Com
ações improvisadas e eleitoreiras, o presidente Jair Bolsonaro e seus aliados
têm, no entanto, semeado insegurança entre empresários e investidores. A
instabilidade cambial, o dólar caro e seus efeitos inflacionários são reflexos
das incertezas presentes nos mercados. Projeções de crescimento econômico
iguais a 2% neste ano e nos próximos são demonstrações de muito otimismo,
embora apontem um desempenho econômico muito inferior ao previsto para os
emergentes e também para alguns países avançados.
É
urgente vacinar mais crianças contra a Covid
O
Globo
Vacinas
já aprovadas pela Anvisa poderão reduzir mortes pela doença entre menores de 5
anos
Depois
de uma série de equívocos na condução da vacinação infantil, o Ministério da
Saúde parece enfim agir com sensatez. Na sexta-feira, autorizou a imunização de
crianças de 3 e 4 anos, acompanhando recomendação do comitê técnico, que também
aprovou a dose de reforço para a faixa de 5 a 11 anos. A decisão foi tomada
pouco depois que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou
por unanimidade o uso emergencial da vacina CoronaVac para crianças de 3 a 5
anos — ela estava autorizada apenas para as maiores de 6. Tanto CoronaVac
quanto Pfizer (esta na faixa de 5 a 12 anos) são usadas na vacinação infantil.
Além
da cidade do Rio, primeira a anunciar a vacinação das crianças menores (antes
mesmo do aval do Ministério da Saúde), pelo menos outras seis capitais
brasileiras já começaram a aplicar as vacinas (Salvador, Fortaleza, São Luís,
Belém, Manaus e Boa Vista). Já não era sem tempo. Os índices alcançados na
imunização infantil têm sido decepcionantes diante da necessidade de deter o
contágio —apenas 40% das crianças entre 5 e 11 anos estão com ciclo vacinal
completo, e pouco mais de 64% tomaram ao menos uma dose.
O
Ministério da Saúde orientou estados e municípios a usar os estoques
disponíveis para estender a proteção ao grupo de 3 e 4 anos. A decisão ganha
relevância quando se sabe que, a cada dia, duas crianças menores de 5 anos
morrem em consequência da Covid-19 no Brasil. Segundo a Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz), houve em 2020, primeiro ano da pandemia, 599 mortes nessa faixa
etária. No ano passado, quando a doença se revelou mais letal, o número subiu
para 840. Dados preliminares sugerem que a média macabra se mantém neste ano.
Felizmente,
o ministério não repete os erros cometidos quando da aprovação das vacinas
contra a Covid-19 para crianças, no fim do ano passado. Na época, seguindo o
roteiro traçado pelo presidente Jair Bolsonaro, que se manifestara contra a
decisão, o governo fez de tudo para atrasar o início da campanha. Convocou até
uma descabida audiência pública para discutir a questão, armando palco para
manifestação dos grupos antivacina. O Ministério da Mulher, da Família e dos
Direitos Humanos chegou ao cúmulo de criar um serviço para receber denúncias de
pais contrários à vacinação, desvario que só não foi adiante por uma
intervenção oportuna da Justiça.
O
governo precisa agora adquirir as doses quanto antes, pois não há tempo a
perder. Não importa se elas serão compradas do Instituto Butantan ou de outro
lugar, como cogita o ministério. Importa que estejam disponíveis nos postos
para as famílias que quiserem vacinar seus filhos.
O
alto número de mortes de crianças menores de 5 anos por Covid-19 no país exige
ação rápida. A Anvisa, que não aprovaria uma vacina que não fosse segura e
eficaz, fez sua parte. Agora, o governo precisa fazer a dele: comprar as
vacinas, distribuí-las aos estados e promover campanhas para esclarecer os
brasileiros sobre a importância de vacinar todas as crianças, inclusive as
pequenas. Seria um crime deixar que crendices de grupos antivacina que
contaminam as redes sociais se sobrepusessem aos critérios técnicos e científicos
que justificam a vacinação. É a vida das crianças que está em jogo.
Aumento
do desmatamento é marca incontestável do governo Bolsonaro
O
Globo
Relatório
do MapBiomas mostra que, desde 2019, Brasil perdeu um Estado do Rio em
vegetação nativa
Por
mais que o presidente Jair Bolsonaro queira minimizar os efeitos devastadores
de sua política antiambiental, os números não lhe dão trégua. O Relatório Anual
de Desmatamento no Brasil (RAD) do MapBiomas, divulgado ontem, mostra que, em
2021, o país manteve o padrão nefasto de destruição de florestas, com perda de
16.557 quilômetros quadrados em todos os biomas. O total representa aumento de
20% em relação a 2020. Do início do atual governo, em 2019, até 2021, a área
desmatada chegou a 42 mil quilômetros quadrados, quase o tamanho do estado do
Rio. O estudo levou em conta todos os sistemas de alerta de desmatamento (do
Inpe, da SOS Mata Atlântica e do Imazon).
De
acordo com o relatório, a Amazônia (59%) e o Cerrado (30,2%) responderam pela
maior parte do desmatamento no ano passado. Na Amazônia, foram destruídos 111,6
hectares por hora, ou 1,9 hectare por minuto. Equivale a dizer que 18 árvores
foram derrubadas a cada segundo. O Pará, mais uma vez, aparece no topo do
ranking das motosserras, com participação de 24,3% no total. Em seguida vêm
Amazonas (11,75%), Mato Grosso (11,4%), Maranhão (10,1%) e Bahia (9,2%).
O
levantamento do MapBiomas afirma que a pressão exercida pela agropecuária foi
responsável por quase todo o desmatamento (97%) nos últimos três anos. São
citados também como relevantes o garimpo, a mineração e a expansão urbana.
De
acordo com o coordenador do MapBiomas, Tasso Azevedo, a situação está
“literalmente fora de controle”. Não fosse a crise econômica, diz ele, o
cenário seria ainda pior. A degradação começou com a promulgação do novo Código
Florestal, em 2012, que afrouxou regras e concedeu anistia a multas aplicadas
até 2008. Foi crítica, para Azevedo, a ação deliberada do atual governo para
evitar punir infratores, “partindo do chefe do Executivo”.
O
relatório do MapBiomas não é o único a atestar a agonia do meio ambiente sob
Bolsonaro. O sistema de alertas do Laboratório de Aplicações de Satélites
Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Lasa/UFRJ) revela que a
destruição provocada por queimadas na Amazônia está 30% acima da média
histórica, superando as piores projeções, como mostrou reportagem do GLOBO.
Neste ano, até a semana passada já haviam sido queimados 622 mil hectares, mais
que os 490 mil registrados no mesmo período do ano passado.
A leniência com atividades clandestinas de madeireiros, garimpeiros e grileiros, paralelamente a uma política ambiental tóxica e ao desmonte dos órgãos de fiscalização, criou um ambiente propício a todo tipo de ilegalidade. Não é impossível reverter essa situação pavorosa — até porque o Brasil já fez isso no passado. Mas, em vez de agir, Bolsonaro prefere atacar ou desqualificar os números e as organizações que os divulgam. Costuma dizer que o Brasil é o país que mais preserva as florestas. Goste deles ou não, os números estão aí. São um legado incontestável do governo Bolsonaro.
PIB
chinês fraqueja após o combate à onda de covid-19
Valor
Econômico
A
economia chinesa não vai se recuperar com a mesma agilidade que demonstrou em
2020
Sinal
de alerta para a economia global acendeu na semana passada quando o governo
chinês informou que o Produto Interno Bruto (PIB) do país cresceu 0,4% no
segundo trimestre, na comparação com o mesmo período de 2021, e caiu 2,6%
frente ao primeiro trimestre. A forte desaceleração surpreendeu e mostra o
impacto da política chinesa de “covid zero”, que determinou o lockdown e
extensas quarentenas durante a maior parte de abril e maio de Xangai, a maior e
mais importante cidade chinesa, e uma das maiores do mundo, com mais de 28
milhões de habitantes.
Acredita-se
que a economia chinesa não vai se recuperar com a mesma agilidade que
demonstrou em 2020, quando eclodiu a pandemia do coronavírus em Wuhan. No
primeiro trimestre daquele ano, o PIB chinês caiu 6,8%. Já no seguinte crescia
3,2% e, um ano depois, disparava 18,3%, com os negócios a todo vapor para
atender a demanda global de produtos inclusive de uso médico.
Desta
vez há alguns sinais preocupantes. Um deles vem do mercado imobiliário, cujos
problemas não se restringem ao conhecido caso da incorporadora Evergrande, mas
começaram com ele. Medidas do governo chinês para conter as dívidas excessivas
das incorporadoras imobiliárias provocaram a desaceleração do mercado
imobiliário residencial, que afugentou os compradores. Há uma crise de
confiança na população que reluta em gastar com imóveis diante da estagnação da
renda. Do seu lado, as empresas do setor desaceleraram os investimentos,
temendo novos lockdowns. O cenário internacional também não é favorável com a
perspectiva de elevação dos juros nos mercados europeu e americano e de
recessão global, o que prejudica a receita com as exportações.
Outro
fator negativo é o desemprego elevado para os padrões chineses. Em junho, a
taxa foi de 5,5%, uma melhora em relação a abril e maio, mas perto do nível mais
alto desde que o país começou a divulgar os números em 2018. Junto à população
mais jovem, de 16 a 24 anos, a taxa é mais do que o triplo, de 19,3%.
Diante
desse quadro, especialistas na economia chinesa estão revisando para baixo as
estimativas para o ano. A meta oficial, de crescer 5,5% parece impossível de
ser atingida uma vez que exigiria um aumento de pelo menos 8% do PIB a cada
trimestre até o fim do ano. Para os especialistas, o mais provável é que o
crescimento fique entre 3% e 4%. Antes dos resultados do segundo trimestre, o
Fundo Monetário Internacional (FMI) previa 4,4%.
Se
as estimativas mais pessimistas se confirmarem, o resultado não é bom para o
mundo, uma vez que a economia chinesa é considerada uma de suas locomotivas. É
especialmente negativo para o Brasil, grande fornecedor de commodities para o
mercado chinês. A China é o maior parceiro comercial do Brasil. No ano passado
comprou US$ 87,7 bilhões, absorvendo 31,3% das exportações brasileiras e
suprindo 21,7% das importações. O problema é que nossas exportações são
concentradas em alguns produtos (Valor 10/7).
Em valores, a China absorveu 70,4% da soja exportada pelo Brasil, 69,7% do
minério de ferro, 56,2% da carne bovina congelada desossada e 46,6% do
petróleo. O Brasil foi o maior fornecedor de soja e carne bovina desossada
congelada para a China, o segundo de minério de ferro e o sétimo de petróleo.
Do
lado positivo, alguns indicadores econômicos chineses deram sinais de
recuperação em junho, quando governo retirou as restrições feitas por conta da
covid-19, o que pode melhorar os resultados do terceiro trimestre. As vendas no
varejo aumentaram 3,1% em relação ao mesmo período do ano anterior,
recuperando-se de uma queda de 6,7% em maio, surpreendendo positivamente, mas
com queda de 0,7% no primeiro semestre. A produção industrial cresceu 3,9%,
acelerando em relação ao crescimento de 0,7% em maio, e 3,4% no semestre. O
investimento em ativos fixos teve expansão de 6,1% no primeiro semestre do ano,
ligeiramente abaixo do aumento de 6,2% no período de janeiro a maio, mas acima
do projetado. As exportações chinesas também ganharam espaço, mas essa é uma
conta que depende muito do cenário global, afetado pelas políticas destinadas a
combater a inflação.
Há
ainda que se levar em conta que o governo pode acelerar os investimentos
públicos. Pequim costuma fazer pesados investimentos em infraestrutura para
estimular a economia e essa estratégia é bastante possível neste momento em que
o presidente Xi Jinping busca um terceiro mandato presidencial, e não gostaria
de ver tensões sociais e econômicas neste momento.
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