terça-feira, 9 de agosto de 2022

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Editoriais / Opiniões

Elas dão de ombros

Folha de S. Paulo

Fragilidade de medidas das big techs para combater desinformação nas eleições requer atenção do TSE

É difícil fugir à sensação de que as grandes empresas de tecnologia não dão a mínima para a democracia brasileira. Se em 2018 ainda podiam alegar desconhecimento quanto a seu alcance no processo eleitoral, em 2022 elas só encontram esse argumento na estante das desculpas esfarrapadas.

Inúmeros estudos sobre o avanço das autocracias no mundo nos últimos anos, ao listar os fatores por trás do fenômeno, põem em posição destacada a expansão desenfreada da desinformação e do discurso de ódio nas redes sociais.

Plataformas como Facebook, Instagram, WhatsApp, TikTok, Kwai, Twitter, YouTube e Telegram sabem muito bem disso, pois têm sido pressionadas nos mais diversos países a adotar mecanismos transparentes capazes de conter a manipulação, a fraude e o assédio.

A lógica por trás dessas iniciativas é cristalina. Trata-se de corresponsabilizar essas empresas pelos crimes cometidos por meio dos seus serviços, mas sem com isso manietar a liberdade de expressão.

Não foi diferente no Brasil. O Tribunal Superior Eleitoral, órgão encarregado de organizar a realização do pleito no país, negociou com as gigantes da tecnologia um acordo destinado a reduzir o volume de fake news em circulação.

Firmado no começo do ano, o pacto incluiu medidas como filtragens para identificar informações enganosas, rotulagem e até a remoção de conteúdos que violem as regras da própria empresa.

Como mostrou esta Folha, contudo, por mais bem-vindas que sejam tais políticas, elas nasceram menos rigorosas do que as empregadas na eleição americana de 2020 —e aí está o primeiro dar de ombros relativo ao Brasil.

Agora, nova apuração do jornal revelou que as principais empresas não abrem dados sobre equipes de moderação em português nem dizem se serão reforçadas para as eleições. Tampouco respondem sobre investimentos em inteligência artificial para analisar conteúdos.

De acordo com especialistas, essas questões são cruciais para saber se as empresas estão efetivamente atuando contra a desinformação e o discurso de ódio.

O pouco caso vai além. Reportagem do jornal O Globo apontou brechas no Facebook e no Instagram que têm sido exploradas por candidatos bolsonaristas para impulsionar mensagens com mentiras e ataques à integridade do processo eleitoral brasileiro.

Se Jair Bolsonaro (PL) estivesse de fato preocupado com o risco de fraude na disputa deste ano, ele cobraria mais transparência dessas empresas, não do TSE. Quanto ao tribunal, cumpre sanar esses problemas o quanto antes para fortalecer sua capacidade de deter os que tentam tumultuar o pleito.

Segundo plano

Folha de S. Paulo

Disputa presidencial ofusca questões locais no primeiro debate de candidatos ao governo paulista

primeiro confronto entre os postulantes ao governo de São Paulo, promovido na noite de domingo (7) pela Band, trouxe a disputa nacional para o centro das discussões entre os principais candidatos ao Palácio dos Bandeirantes.

Enquanto Fernando Haddad (PT) e Tarcísio de Freitas (Republicanos) buscaram se associar, respectivamente, aos dois protagonistas da corrida presidencial, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), Rodrigo Garcia (PSDB) tentou desviar da polarização estabelecida no plano federal.

A tônica do primeiro encontro foi dada logo no início, com uma lamentável, para não dizer infantil, altercação entre os dois primeiros.

Indagado por Haddad sobre qual programa educacional da gestão Bolsonaro importaria para o estado, Tarcísio, ex-ministro da Infraestrutura, sugeriu aos telespectadores que buscassem na internet pesquisas que apontaram má avaliação da gestão de Haddad como prefeito de São Paulo.

Na questão seguinte, o petista exortou o público a fazer o mesmo com o presidente da República, pesquisando associações entre seu nome e a palavra "genocida", numa referência a seu negacionismo durante a pandemia de Covid-19.

O governador Garcia, cujo partido assumiu papel coadjuvante na disputa presidencial ao apoiar Simone Tebet (MDB), tentou se mostrar indiferente ao embate. "São Paulo não quer ir para esquerda ou direita, quer ir para frente", afirmou.

Se as referências à corrida presidencial podem ajudar a chamar atenção para uma disputa que ainda não desperta muita curiosidade do eleitor, ficou evidente no debate que a estratégia dos candidatos deixa em segundo plano a discussão dos problemas locais.

Ao tratar da educação, por exemplo, Tarcísio ressaltou medidas demagógicas do governo federal, como o perdão às dívidas do programa de crédito estudantil, mas nada disse de objetivo a respeito de como recuperar o atraso dos estudantes paulistas na pandemia.

Haddad e outros criticaram Garcia pela coleção de obras atrasadas deixadas pelas gestões do PSDB no estado, mas nenhum dos candidatos apresentou sugestões para superar os gargalos burocráticos que tantas vezes atravancam investimentos de maior vulto.

Para capturar o interesse do eleitor nos próximos encontros, será preciso que os postulantes enfrentem os problemas que afligem os paulistas e ofereçam soluções.

Pauta básica para um governo sério

O Estado de S. Paulo

Especialistas propõem agenda mínima para um candidato repor o País no rumo da prosperidade e eliminação da pobreza extrema, sem bondades improvisadas com objetivos eleitorais

Prosperidade e melhores condições de vida para todos devem ser bandeiras do novo governo, mas seu sucesso dependerá de algo mais que boas intenções e apoio político. Para voltar a crescer de forma duradoura, com mais dinamismo e mais justiça, o País dependerá de novos padrões de política econômica e social, voltados para a eficiência do setor público e para a liberação do potencial produtivo da sociedade. Uma agenda mínima para esse tipo de trabalho acaba de ser apresentada por um grupo de seis especialistas, os economistas Bernard Appy, Francisco Gaetani, Pérsio Arida e Marcelo Medeiros, o jurista Carlos Ari Sundfeld e o cientista político Sérgio Fausto. O documento indica no seu título algumas qualificações de seus destinatários: Contribuições para um governo democrático e progressista.

A adoção dessa pauta poderia facilitar uma ampla renovação das condições econômicas e sociais do Brasil. Os autores propõem medidas permanentes para proteção contra a pobreza extrema e para melhor funcionamento do sistema previdenciário. Defendem autorização temporária para gastos acima do teto. Seriam despesas destinadas a programas sociais, de aumento da produtividade (pesquisa tecnológica, por exemplo) e a medidas de preservação ambiental. Sugerem reforma do Estado e mudanças para tornar mais funcional e mais justo o sistema tributário.

As propostas, de modo geral, são conhecidas de quem acompanha as avaliações da economia brasileira produzidas por entidades como o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e instituições do mercado. A rigidez do Orçamento, sujeito a vinculações constitucionais e sobrecarregado de gastos obrigatórios, é discutida há décadas. A baixa produtividade da máquina governamental é um problema nunca resolvido de forma satisfatória. Houve, há muitos anos, boas tentativas de reforma administrativa, mas sem efeitos duradouros.

A tributação disfuncional e regressiva é um velho assunto de economistas e políticos, mas nenhuma reforma ampla e realista foi imposta ao sistema em vigor há mais de meio século. A criação de um ambiente regulatório mais propício aos negócios aparece em todo debate sério sobre eficiência econômica e competitividade, mas pouco se tem avançado nas mudanças.

A persistência dos entraves, agravados durante longo período, traduz-se no baixo crescimento econômico do último decênio, na escassa integração global do País e no limitado poder de competição da maior parte da indústria. Com exceção do agronegócio e de alguns segmentos e grupos industriais, o setor produtivo brasileiro mostra-se pouco preparado para participar do jogo internacional.

Só uma reforma importante, a da Previdência, foi aprovada a partir de 2019 – e as condições para essa mudança já haviam avançado no governo anterior. As propostas de reformas tributária e administrativa apresentadas pelo atual governo mal chegam a valer alguma discussão. Refletem, simplesmente, a imensa dificuldade da equipe do Executivo para cuidar de questões importantes da economia real. Essa dificuldade se reflete também, como é fácil perceber, no escasso crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), durante a gestão do presidente Jair Bolsonaro, no empobrecimento de milhões de famílias, no câmbio instável e na inflação elevada.

Nenhum desses problemas será vencido, nos próximos anos, sem mudanças políticas suficientes para reconduzir o País a um crescimento mais acentuado e duradouro. Nada disso será conseguido com bondades improvisadas para objetivos eleitorais. As previsões sombrias do mercado para o período de 2023 a 2025 mostram o pouco valor atribuído a essas medidas por especialistas.

Alguns candidatos já valorizam, em seus discursos, algumas ações propostas pelos seis especialistas. Alguns parecem mais inclinados a valorizar apenas a remoção do teto de gastos. Aos eleitores, no entanto, as Contribuições oferecem alguns critérios para avaliar a seriedade e a competência dos pretendentes à Presidência da República.

Orçamento bolsonarista é a quadratura do círculo

O Estado de S. Paulo

Ministério da Economia quebra a cabeça para fechar o Ploa 2023 acomodando as novas despesas e renúncias de receitas anunciadas de supetão, sem planejamento, por Bolsonaro

Governar é fazer escolhas, e a elaboração do Orçamento talvez seja a mais relevante delas. É ali que o Executivo lista as prioridades do presente, as heranças do passado e as perspectivas de futuro. O Orçamento de 2023, tudo indica, representará a essência da administração Jair Bolsonaro. Um presidente que se recusa a governar não poderia apresentar nada além de um amontoado de gastos obrigatórios, promessas de campanha inexequíveis e verbas loteadas entre aliados do Centrão. Como mostrou o Estadão, técnicos do Ministério da Economia estão quebrando a cabeça para fechar o Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) do ano que vem. O motivo são os recorrentes pedidos de Bolsonaro por novas despesas e renúncias de receitas. Não são iniciativas para aumentar a parcela do investimento público de forma a impulsionar o crescimento econômico, tampouco medidas para elevar os recursos reservados para pesquisa, ciência e tecnologia, fundamentais para um país que pensa no longo prazo. São simplesmente acenos que tentam tirar da estagnação a candidatura de um presidente desesperado por sua reeleição.

Até o dia 31 de agosto, os técnicos terão que enviar uma proposta ao Congresso. Fechar as contas demandará rezar por um milagre ou apelar ao malabarismo. Bolsonaro pediu à equipe econômica para incluir um reajuste linear de 5% nos salários de todo o funcionalismo público, congelados desde 2017 na maioria das carreiras. Quer que o piso do Auxílio Brasil, temporariamente elevado a R$ 600 até dezembro, seja mantido nesse mesmo valor a partir de janeiro. E a ordem mais recente é atualizar a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física no ano que vem. À Rádio Guaíba, Bolsonaro disse que a revisão já estaria garantida, faltando apenas definir o porcentual da correção. “Imposto de Renda está virando um redutor de renda”, afirmou o presidente. 

Nisso o presidente tem razão. Manter inalterada a tabela do Imposto de Renda é aumentar indiretamente a carga que incide sobre o trabalhador formal ao sabor da inflação. Se tudo permanecer como está, quem ganhar 1,5 salário mínimo em 2023, ou R$ 1.965, passará a ser tributado na fonte. É justo que parte dos servidores, especialmente aqueles com rendimentos mais defasados, tenham alguma recomposição. É provável que o piso do Auxílio Brasil seja insuficiente para famílias monoparentais chefiadas por mães e seus filhos pequenos. Todas essas demandas têm mérito, mas atender a uma ou a todas elas impõe fazer escolhas, tudo que Bolsonaro nunca fez como presidente. Ele sabe que não há como incluir tudo isso no Ploa – e o fato de o Ministério da Economia, às vésperas da eleição, ter escondido o valor bloqueado das emendas de relator, tudo para evitar uma guerra com o Congresso, só reforça o nível de ficção a que o Orçamento chegou sob o atual governo.

Candidatos que não estão investidos no cargo podem fazer as promessas que desejarem livremente. Como adversários e desafiantes do incumbente, eles têm, a seu favor, a falta de conhecimento prévio sobre as agruras da gestão orçamentária. Uma vez eleitos, o esperado é que o peso da responsabilidade inerente à função pública os obrigue a enfrentar a dura realidade das contas públicas sem ilusões. Bolsonaro, ao contrário, não detém mais essa prerrogativa. É o resultado de seu trabalho como governante que estará sob avaliação do eleitor, não suas promessas futuras ou reeditadas. Ao insistir em vestir o figurino de candidato, como se presidente não fosse, ele demonstra ter consciência de que esse julgamento não lhe será favorável. Apavorado, renova, na reta final de seu mandato, o rol de compromissos que foi incapaz de cumprir. Assim, além do legado de destruição e retrocessos sem precedentes na história brasileira, Bolsonaro deve deixar um Orçamento inviável como herança para seu sucessor. Quatro anos de completo desgoverno exigirão do futuro presidente escolhas ainda mais difíceis, sobretudo para compensar as decisões de um mandatário que nunca honrou os votos conquistados.

Uma retaliação inaceitável

O Estado de S. Paulo

União tenta impedir Estados de buscar compensação por perda de receitas com ICMS imposta pelo governo federal

O governo ameaçou retaliar os Estados que buscarem fazer valer os termos da lei que o próprio governo impôs para reduzir o preço dos combustíveis. Depois de obrigá-los a arcar com perdas decorrentes da definição de um teto para o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre bens essenciais, avançando frontalmente contra o pacto federativo, o Executivo parece surpreso com a cobrança dos governadores pela compensação financeira tal como foi prevista na legislação. Já são quatro os Estados que apelaram ao Supremo Tribunal Federal (STF) para garantir o abatimento de suas dívidas com a União em resposta à queda da arrecadação. O novo capítulo dessa guerra veio na forma de ofícios enviados pelo Tesouro Nacional. Como revelou o Estadão, Alagoas, Maranhão e Piauí foram informados de que poderão ter a capacidade de pagamento reclassificada “em decorrência da declaração, no âmbito de processo judicial, de dificuldades financeiras” – como se o Tesouro não estivesse ciente de que esses problemas foram criados pelo próprio governo federal.

O rebaixamento da nota de crédito impediria os Estados de tomarem financiamentos com garantia da União e bloquearia o recebimento de repasses financeiros oriundos de fundos constitucionais. Mais do que uma represália, no entanto, a atitude do Tesouro é uma coação e visa a dissuadir outros governadores de tomarem a mesma atitude, haja vista a receptividade que as primeiras liminares tiveram no Supremo Tribunal Federal (STF). Enquanto os Estados buscam o ressarcimento imediato das perdas que superarem 5% de sua arrecadação, a União quer aguardar o fechamento do ano para comparar as receitas auferidas em 2022 com as de 2021 para só então definir quem deve ser indenizado. Até lá, os Estados que se virem para manter, sob as mesmas bases, ainda que sem as mesmas receitas, serviços de saúde, educação e segurança pública, áreas que afetam diretamente a qualidade de vida da população. Como disse o secretário de Fazenda do Piauí, Antônio Luiz Santos, seria o mesmo que “esperar o paciente entrar na UTI para depois salvá-lo, em vez de tratar logo no começo da enfermidade”.

Ao que tudo indica – e o envio de ofícios em tom intimidatório apenas reforça esse entendimento –, a União perderá a disputa e busca apenas ganhar tempo. Este jornal já criticou, neste espaço, a conivência do STF com alguns Estados, sobretudo os mais endividados. Há alguns anos, alegando a existência de graves problemas financeiros, governadores receberam aval para dar calote nas dívidas com a União ao mesmo tempo que anunciavam reajustes salariais para servidores públicos e que concediam benefícios fiscais. Há, no entanto, uma enorme diferença entre essas situações do passado e a crise atual. Desta vez, não foram os Estados que agiram de forma inconsequente sem zelar pelas contas públicas. Foi a União que depenou as receitas dos Estados em nome dos interesses eleitorais do presidente Jair Bolsonaro e de sua obsessão com o preço dos combustíveis.

Desinformação já campeia solta na campanha eleitoral

O Globo

Candidatos e redes sociais não estão nem aí para as normas que vetam propaganda contra sistema de votação

À medida que as eleições se aproximam, vai ficando mais evidente a ineficácia das medidas tomadas pelas redes sociais para coibir a desinformação. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) passou a proibir neste ano que candidatos disseminem “fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados” sobre o sistema eleitoral. Mas as redes e os candidatos não estão nem aí para a lei.

Um levantamento feito a pedido do GLOBO por pesquisadores do NetLab, laboratório vinculado à UFRJ, constatou a veiculação nas redes da Meta — dona de Facebook, Instagram e WhatsApp — de pelo menos 21 anúncios com mentiras sobre as urnas eletrônicas, a apuração e o processo eleitoral. A publicidade atingiu 500 mil impressões entre 26 de junho e 31 de julho. Cada anúncio custou entre R$ 100 e R$ 600, pagos por candidatos a deputado ligados ao Palácio do Planalto.

O conteúdo basicamente repete as teorias da conspiração que volta e meia surgem no discurso bolsonarista. Um deputado exige um “plano de fiscalização paralelo às eleições” pelas Forças Armadas. Outro especula sobre a “anunciação de uma fraude, de um golpe nas urnas eletrônicas”, acusando ministros do Supremo de já saber o resultado. Um terceiro faz denúncia falsa de fraude em 2020. Dois defendem o voto impresso, como se fosse a única forma de haver eleições limpas. Uma candidata chega ao disparate de aventar interferência estrangeira na apuração apenas porque o TSE contratou sistemas de uma empresa americana.

Nada disso, obviamente, tem o menor cabimento. Dado que a norma do TSE a respeito da questão é cristalina, caberia à Meta e às demais redes sociais banir esse tipo de anúncio de suas plataformas. Em vez disso, continuam a faturar e a estimular o “engajamento” veiculando fake news. Embora a Meta tenha tomado medidas de combate à desinformação nos últimos anos, o levantamento mostra que na prática elas continuam ineficazes.

O TSE deverá, mediante pedido do Ministério Público Eleitoral, ordenar a suspensão dos conteúdos. Mas essa continua a ser uma solução ruim. Por dois motivos. Primeiro, é inevitavelmente interpretada como censura a uma opinião política — e, dependendo do caso, pode ser mesmo isso. Não é de hoje que candidatos mentem, a mentira em si não é proibida — nem deve ser — e não exclusiva do bolsonarismo. A Justiça Eleitoral precisa ter a sabedoria de distinguir mentiras que não passam de propaganda da desinformação deliberadamente golpista (caso da tentativa de questionar a lisura da apuração e de atribuir às Forças Armadas o papel inconstitucional de fiscal da eleição).

O segundo motivo é que se trata de uma resposta lenta. O TSE só pode agir depois dos fatos, quando a desinformação já chegou ao ouvido de meio milhão de eleitores. Deter a circulação do conteúdo golpista exige uma ação determinada e urgente das redes sociais, tomada em tempo real, de modo compatível com sua relevância no panorama político contemporâneo.

Diante da omissão deliberada delas, que preferem continuar a faturar disseminando desinformação, a responsabilidade recai inevitavelmente sobre as autoridades eleitorais, que se veem no papel desconfortável de inspetores de conteúdo e alimentam as fantasias sobre censura a vozes divergentes. Enquanto isso, o brasileiro se prepara para o início de mais uma campanha suja, com desinformação campeando solta.

É bem-vinda a nova legislação contra aquecimento global aprovada nos EUA

O Globo

Medidas colocam segundo maior poluidor do planeta mais perto da meta de redução das emissões de CO2

Quando a maior economia do planeta toma uma decisão histórica sobre o combate ao aquecimento global, o mundo deve comemorar. Nos Estados Unidos, os senadores aprovaram no domingo um pacote que destinará US$ 369 bilhões à redução da crise climática, a maior injeção de dinheiro público na área já aprovada no país. O Senado era o maior empecilho no caminho das medidas. Em Washington, é tido como certo que serão aprovadas na Câmara e sancionadas pelo presidente Joe Biden provavelmente até o fim desta semana.

Batizada com o esdrúxulo nome de Lei da Redução da Inflação, a legislação prevê várias medidas além da agenda ambiental, como regras para a compra de medicamentos pelo governo federal ou aumento dos impostos para grandes empresas. Mas seu principal foco é sem dúvida o aquecimento global.

Trata-se da primeira legislação de vulto que tenta coibir explicitamente a emissão de gases, num país onde o negacionismo climático ainda tem representação política expressiva. Ao longo do século XX, os Estados Unidos foram o maior emissor de gases do planeta. Perderam o posto para a China, mas ainda estão isolados na segunda posição. Sem a transição americana para uma economia de baixo carbono, não haverá uma redução do ritmo do aquecimento planetário.

Entre as principais medidas aprovadas estão multas maiores pelo lançamento ilegal de metano na atmosfera; investimentos para que comunidades de baixa renda se tornem mais sustentáveis; subsídios para painéis solares, turbinas eólicas, baterias e reatores nucleares; dinheiro para reduzir emissões do setor agrícola e para estimular o processamento de minerais; e auxílio de até US$ 7.500 para a compra de carros elétricos.

Os US$ 369 bilhões são muito pouco se comparados aos planos trilionários dos democratas quando conquistaram o controle das duas Casas do Congresso em 2020. Naquela época, falava-se em US$ 4 trilhões, e uma das metas era chegar a 2035 com toda a eletricidade produzida sem emitir carbono. Em 2050, o país tranquilamente neutralizaria 100% das emissões. Mas a oposição dentro do próprio Partido Democrata, de estados como Arizona ou Virgínia Ocidental, inviabilizou o sonho mais ambicioso. A vitória no Senado só aconteceu depois de uma costura política que resultou em incentivos para gasodutos — contradição para os críticos; pedágio necessário no caminho da energia limpa para os defensores.

Quando assumiu, a meta de Biden era que as emissões em 2030 equivalessem à metade do nível de 2005. Com a nova lei, estima-se que a redução será de 40%. Sem ela, não chegaria a 30%. Dado o histórico e o presente dos Estados Unidos como grande poluidor, o país ainda pode — e deve — fazer muito mais pelo planeta. Mas pelo menos começa a andar na direção certa.

Censo começa com atraso e verba inferior à necessária

Valor Econômico

Diante da falta de recursos, a realização do Censo teve que ser defendida no STF

Começou na semana passada o Censo Demográfico de 2022, que até o fim de novembro deverá desenhar um retrato atualizado do país. As informações colhidas pelos recenseadores vão permitir ao IBGE reunir dados que vão ajudar na elaboração das políticas públicas, na definição da distribuição dos recursos federais entre Estados e municípios e na realização de projetos de investimento públicos e privados.

Não foi fácil dar partida ao novo censo, que acontece com um atraso de dois anos e só tornou-se possível por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou ao governo federal alocar verba para a tarefa. O Censo deveria ter sido realizado em 2020, mas acabou não acontecendo por causa da pandemia do novo coronavírus. Não fosse por ela, provavelmente não teria sido realizado de qualquer forma porque o Orçamento daquele ano não reservou verba para ele. Com seu liberalismo míope, o ministro da Economia, Paulo Guedes, chegou a sugerir, em 2019, que o IBGE deveria vender ativos para financiar a realização da pesquisa.

Em fevereiro de 2021, o IBGE chegou a confirmar o censo e até divulgou os protocolos para a proteção dos profissionais do instituto e da população recenseada. Mas o Orçamento aprovado pelo governo Bolsonaro destinou poucos e insuficientes milhões para a pesquisa. Diante da falta de recursos, a realização do Censo teve que ser defendida no STF. Em maio, o Supremo formou maioria para determinar sua realização neste ano.

O IBGE obteve para financiar a pesquisa R$ 2,3 bilhões, quantia inferior aos R$ 3,2 bilhões inicialmente estimados em 2019 e sem atualização para compensar a inflação do período. A defasagem causou algum estresse adicional neste ano, especialmente após a escalada do preço dos combustíveis, gasto importante no trabalho. O presidente do IBGE buscou minimizar o problema, mesmo ainda faltando contratar 15 mil recenseadores para completar o quadro de 183 mil.

Um problema de última hora foi a exigência do Ministério Público de incluir pergunta sobre a orientação sexual e identidade de gênero ainda nesta edição, o que obrigaria a novo adiamento do censo dada a necessidade de refazer o questionário. A decisão acabou sendo revista.

Seguindo a tradição, o primeiro entrevistado do censo foi o presidente Jair Bolsonaro. Em seu estilo habitual de criar dúvidas e insegurança, disse a apoiadores no cercadinho da entrada do Palácio da Alvorada para “não se comprometerem” e terem “cuidado com perguntas capciosas” dos recenseadores. As respostas dadas ao censo são confidenciais e destinadas apenas a fins estatísticos.

O primeiro censo foi feito em 1870 para fazer um balanço do país após a guerra do Paraguai e contou 10,1 milhões de habitantes. O mais recente, de 2010, constatou 190 milhões. Agora, o IBGE prevê que chegará a 215 milhões e traçará o retrato da população após a pandemia, com faixa etária, raça, gênero, educação, características dos domicílios, deslocamentos, mortalidade e, pela primeira vez, número de autistas.

Para isso, serão aplicados dois questionários. Um deles básico, com 26 perguntas, e o outro ampliado, com 77, que será destinado a 11% dos 75 milhões de domicílios visitados pelos recenseadores, das grandes cidades a aldeias indígenas e grupos quilombolas. Para economizar recursos, foram retiradas algumas perguntas do questionário. Um tema excluído é o da emigração internacional, que deve ter crescido acentuadamente com a deterioração da economia brasileira. Será indagada a renda total do responsável pelo domicílio, como em 2000, e não mais a renda de todos os moradores, como em 2010. Questões sobre as características dos domicílios, como posse de bens e condições de uso, ficarão restritas à pesquisa ampliada.

Apesar da má vontade do governo, o censo é importante instrumento para a elaboração de políticas públicas, dimensionar a disponibilidade de mão de obra, a partir da quantificação do ritmo de envelhecimento da população, taxa de natalidade e participação dos jovens. Os dados levantados indicam as necessidades de cada região do país em relação a programas de saúde, educação e de planejamento urbano, por exemplo. A contagem populacional é usada para a definição das cotas do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). O perfil da população e sua localização são a base para a criação das amostras populacionais nas pesquisas eleitorais e outros tipos de enquetes por amostragem.

Um comentário:

Anônimo disse...

Gostaria de fazer um pedido a todos os jornais aqui publicados que comentassem a pesquisa eleitoral do Instituto de Pesquisa Brasmarket, divulgada ontem segunda-feira
A pesquisa explícita toda sua metodologia de forma muito clara e no final coloca Bolsonaro com 39.8% e o Lula com 33.1%
É a primeira pesquisa que coloca Bolsonaro à frente e com uma grande margem , acima da margem de erro