Valor Econômico
Brasil e Índia têm atuações convergentes em várias frentes
No admirável mundo novo da geopolítica de
hoje, os negócios entre o Brasil e a Índia poderão ter um impulso, na
expectativa em Brasília e Nova Deli.
Em recente palestra na Fundação Dom Cabral, o embaixador brasileiro na Índia, Kenneth Félix Haczynski da Nóbrega, destacou como fatores geopolíticos influenciam as decisões econômico-comerciais indianas. Ou seja, inserir oportunidade concreta de negócios no atual contexto global é um desafio para qualquer relação de comércio e investimento “e com a Índia isso é indispensável, repito, indispensável”.
Além da eficiência econômica, “confiança” e
“diversificação de parcerias” tornaram-se critérios essenciais para estreitar
laços de negócios com o país mais populoso e quinta maior economia do mundo.
Para Nova Deli, a parceria com o Brasil pode não ser crucial, mas é importante
para diversificação com um dos maiores produtores de commodities e fora do
complexo ambiente geopolítico asiático.
Brasil e Índia têm atuações convergentes pela
reforma das estruturas de governança global, nas Nações Unidas; na busca de
garantir para os países em desenvolvimento espaço regulatório para definir suas
políticas públicas nos campos econômico e tecnológico; de fazer valer as
flexibilidades do sistema de proteção de propriedade intelectual; reafirmar
direito dos países emergentes nos foros ambientais, frente ao G7.
Essas convergências se refletem na
participação comum em vários grupos e esquemas de coordenação diplomática, a
começar pelo Brics. E ambos também sempre resistiram à ideia de serem meros
“rule takers”, cumpridores passivos de regras criadas e impostas por outros
países.
As relações comerciais bilterais ainda são
modestas. Atingiram US$ 15,2 bilhões em 2022, mas declinaram para US$ 11
bilhões no ano passado com a queda dos preços internacionais de commodities,
que pesam forte na balança bilateral.
Mas os relatos são de que há coisas
acontecendo cada vez mais no plano bilateral, refletindo maior relevância
geopolítica da relação. Em um ano, 36 missões brasileiras visitaram a Índia, e
mais 12 estão programadas. No mesmo período, mais de 20 missões indianas foram
ao Brasil. A parceria “confiável e segura” pode acelerar em áreas como
agricultura, defesa e energia.
O agronegócio brasileiro nunca entrará na Índia como entra na China. Isso ocorrerá com comércio fortemente administrado, para suprir a demanda de pelo menos alguns produtos. Mas ter acesso mesmo a certos nichos num país com 1,4 bilhão de pessoas não é desprezível. No momento, os indianos parecem ansiosos para concluir um acordo de garantia intergovernamental de fornecimento de feijão. Exportadores brasileiros estão ressabiados, porque há três anos a Índia abriu uma janela de importação, os brasileiros se mobilizaram para atender a demanda e, com as cargas no mar, foram surpreendidos quando Nova Deli fechou repentinamente o mercado e ficaram com o prejuízo. Agora, será necessário garantia de acesso por alguns anos, pelo menos.
No agro, há oportunidades em tecnologia de
genética, alimentação de gado, investimentos em logística, armazenamento e
processamento de alimentos nos dois lados.
O segundo setor de mais potencial é a defesa.
Imperativos econômicos e geopolíticos que condicionam a realidade do país na
defesa e segurança levam Nova Deli a buscar novos fornecedores e ao mesmo tempo
novos clientes. É grande produtor, mas é também hoje o maior importador de
produtos de defesa no mundo. E a Embraer busca se credenciar para vender o
avião cargueiro KC-390 e ampliar a frota local de ERJ-145 que fornece
plataforma para os indianos instalarem radar.
A demanda indiana por energia cresce na
medida da aceleração economica do país. Hoje, óleo bruto de petróleo representa
25% do que o Brasil exporta para o mercado indiano. A experiência brasileira
com biocombustíveis poderia qualificar o Brasil como parceiro relevante para a
transição energética indiana, na expectativa nos meios do governo.
Na área de investimentos, uma política
agressiva de internacionalização leva mais empresas indianas rumo ao Brasil. O
estoque de investimentos diretos indianos no Brasil alcança US$ 6,7 bilhões,
comparado a US$ 400 milhões do Brasil na Índia.
Nos últimos meses, houve vários anúncios de
novos investimentos. Do lado indiano, a Tata Consultancy Services (TCS)
anunciou a duplicação do seu delivery center em Londrina, com previsão de
criação de 1.600 postos de trabalho, somando-se ao atual 1.700. A Mahindra vai
ampliar fábrica de tratores no Rio Grande do Sul; e a Hero Motocorp vai
investir em fábrica de motocicletas na Zona Franca de Manaus.
Do lado brasileiro, a Packem fez investimento
greenfield de US$ 30 milhões, para construção de planta de “big bags” em
Gujarat, em joint venture com empresa indiana; a WEG, maior investidora
brasileira na Índia, vai expandir sua unidade de fabricação de turbinas eólicas
em Tamil Nadu, e fez aquisições para expandir sua capacidade produtiva no país;
a Tramontina inaugurou oficialmente sua marca n Índia neste ano e planeja
iniciar fabricação local de produtos customizados para o mercado indiano.
Também destacam-se o início de operações de unidades produtivas da indiana
Bajaj Auto (Zona Franca de Manaus), e das brasileiras CBC (Andhra Pradesh) e
Taurus (Haryana).
O cenário internacional reforça a vontade política nos dois lados para ampliar negócios. Se haverá um boom, e isso se sustenta, é algo a ver.
Nenhum comentário:
Postar um comentário