segunda-feira, 28 de julho de 2025

Transporte no Brasil está no buraco - Irapuã Santana

O Globo

Quem depende do ônibus, do metrô ou do trem não enxerga eficiência: vê o tempo escorrer na fila

Trump, Bolsonaro, Lula, STF… tudo isso está tomando a nossa atenção ultimamente, mas os problemas de sempre seguem sem solução alguma. Pela primeira vez na História, a cobertura de saneamento básico da Índia ultrapassou a do Brasil. Nas últimas semanas, cidades como Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo escancararam, mais uma vez, o colapso do transporte público brasileiro.

O trabalhador segue refém de um sistema repleto de atrasos, superlotação, greves, janelas quebradas, redução de frotas e caos tarifário.

No fim de junho, em Belo Horizonte, 22 linhas ficaram sem circular após paralisação dos motoristas, que denunciaram salários atrasados, falta de pagamento do FGTS e jornadas excessivas. A greve expôs a fragilidade da relação entre empresas e poder público, agravada pela queda na arrecadação e pela demora nos repasses de subsídios. E a crise não é restrita a Belo Horizonte: o sistema metropolitano de Minas segue em colapso, com demanda em queda, tarifas acima do aceitável e veículos sucateados — alguns com 18 anos de circulação e estrutura precária.

No Rio de Janeiro, houve diminuição da frota de ônibus, especialmente nas zonas mais pobres. Somado a isso, o novo sistema de bilhetagem Jaé — que deveria democratizar o acesso ao transporte — atrasou e tem gerado confusão na integração entre modais. O BRT continua lotado, com longas filas, e os trens da SuperVia seguem sucateados.

Em São Paulo, entre o fim de junho e meados de julho de 2025, surgiu uma onda de apedrejamentos e ataques a ônibus: 569 veículos foram danificados desde 12 de junho até 7 de julho, com casos de janelas estilhaçadas, passageiros feridos e suspensão temporária de linhas.

Apesar do impacto direto na mobilidade de milhares de trabalhadores e estudantes, o governo estadual demorou a se posicionar com firmeza. Não houve anúncio imediato de reforço no policiamento preventivo, nem de ações integradas com inteligência digital.

Uma pesquisa elaborada pela Rede Nossa São Paulo revela que, em 2024, o tempo médio de deslocamento dos paulistanos foi de duas horas e 47 minutos por dia. Vamos imaginar que, tirando as oito horas de sono diárias (na prática é menos, mas adotamos como referência), chegamos ao total de 16 horas ativas. Quase 20% desse período é passado no transporte público de má qualidade.

Isso faz pensar, em especial, nos governadores Romeu Zema (Minas) e Tarcísio de Freitas (São Paulo), que figuram como presidenciáveis e vendem a imagem de gestores eficientes — quando a realidade da população é bem diferente ao usar os serviços públicos oferecidos por seus respectivos estados. Quem depende do ônibus, do metrô ou do trem não enxerga eficiência: vê o tempo escorrer na fila, a dignidade suar entre corpos espremidos, e o futuro se distanciar a cada engarrafamento.

O transporte público não é só um problema urbano, mas sim um vetor de desigualdade, um desafio de governança e, mais do que nunca, um teste de viabilidade para qualquer projeto de país. Enquanto rola a briga de poder entre extremos lá em cima, capturando nossos olhares, o dia a dia mostra que, quando se trata de Brasil, o buraco é muito mais embaixo.

 

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