Valor Econômico
Governo federal alcança dois marcos considerados cruciais na economia
Incertezas em relação à robustez do sistema elétrico assombram qualquer governo. Isso aconteceu com Fernando Henrique Cardoso, Dilma Rousseff e Jair Bolsonaro. Na última disputa pela Prefeitura de São Paulo, as seguidas crises no fornecimento de luz também se tornaram tema central do período eleitoral. Em Brasília, aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva passaram a acompanhar com atenção o tema, tendo em vista um potencial problema para a campanha à reeleição. Comemoram, por outro lado, o fato de o governo federal ter alcançado dois objetivos considerados cruciais na economia.
São eles a estabilização por enquanto da taxa
de câmbio abaixo de R$ 5,40 e a taxa de desemprego na mínima histórica. A
aposta no governo é que esses dois indicadores-chave serão fundamentais para
assegurar que o brasileiro entre em 2026 com uma maior sensação de bem-estar e,
por isso, esteja mais receptivo à propaganda dos programas federais.
No trimestre encerrado em julho, informa o
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de desemprego
chegou a 5,6%. O rendimento médio real da população cresce, o que é bom para o
consumo e a sensação de bem-estar da população. Mas, como mostrou o Valor recentemente,
representa um desafio adicional para o Banco Central (BC) em sua missão de
combater a inflação.
Segundo o Cadastro Geral de Empregados e
Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho e Emprego, há geração líquida
de vagas em todas as regiões do país. O mesmo ocorre quando se analisa
individualmente os setores da economia - serviços; agropecuária, produção
florestal, pesca e aquicultura; indústria geral; construção; e comércio,
reparação de veículos automotores e motocicletas.
A outra notícia vem do dólar. É verdade que
há um movimento global de enfraquecimento da moeda americana, o qual tende a
continuar favorecendo o real. Após sinais de recuperação até o começo de
agosto, a moeda americana voltou a perder força, refletindo apostas de corte
nos juros já em setembro pelo Banco Central dos Estados Unidos, o Federal
Reserve (Fed), o que acabou se confirmando.
Entre integrantes do primeiro escalão da
administração Lula, é crescente a insatisfação com a condução da política
monetária pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central. A Selic
permanece em 15% ao ano e tudo indica que só deve começar a cair no ano que
vem. A taxa básica de juros está, sem dúvida, em um nível restritivo, até
porque o governo tem se esforçado para aquecer a economia o quanto possível e
desta forma atrapalha os esforços do BC. Mas, por outro lado, é preciso
ponderar que o elevado diferencial de juros doméstico também ajuda a dar
suporte ao real.
Taxa de câmbio mais baixa significa menos
pressão inflacionária, o que tem sido motivo de comemoração nos bastidores do
Palácio do Planalto. Porém, o discurso oficial segue sendo o de que o câmbio é
flutuante e, portanto, não existe uma meta para o valor de conversão entre real
e dólar.
Na mais recente edição do Valor 1000,
premiação do Valor às
maiores empresas que atuam no Brasil, por exemplo, o vice-presidente e ministro
do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, foi
perguntado durante “talk show” sobre o patamar ideal da taxa de câmbio, uma vez
que o dólar mais fraco ajuda a desacelerar a inflação, mas, em contrapartida,
dificulta o trabalho dos exportadores brasileiros. Como era de se esperar,
evitou comprometer-se com alguma sinalização concreta. Mas registrou: “É uma
‘escolha de Sofia’, mas o fato é o seguinte: boa notícia. A inflação em queda,
o preço de comida em queda, o dólar, que chegou a R$ 6,20, fechou em R$ 5,32”,
comentou na segunda-feira (15), referindo-se ao tenso momento observado no
mercado no fim do ano passado.
Este é, aliás, um período do ano
potencialmente mais turbulento e que mais uma vez se aproxima. É quando há
tradicionalmente uma demanda maior por dólares devido a remessas de lucros e
dividendos feitas por empresas a suas matrizes.
Na visão de autoridades do governo Lula,
houve no fim de 2024 um movimento maior do que o observado em anos anteriores.
À época, uma das conclusões de integrantes da equipe econômica foi que
multinacionais podem ter se antecipado a medidas que estavam sendo discutidas
no Brasil a fim de combater o planejamento tributário. Outra hipótese levantada
foi que “big techs” movimentaram recursos depois da sinalização de que suas
atividades passariam a ser taxadas. Foi preciso o BC entrar em campo para
assegurar a liquidez do mercado.
Pelo menos por enquanto, um cenário desses
não está no radar de interlocutores do Planalto. Mas considera-se estratégico
que o câmbio permaneça abaixo de R$ 5,40.
Nessa terça-feira (23), o dólar à vista
fechou o pregão no menor patamar desde 6 de junho de 2024, cotado a R$ 5,2791,
após queda de 1,10%. O alívio nas tensões entre Estados Unidos e Brasil ajudou,
embora nada garanta que as sinalizações de Donald Trump a Lula evoluam para uma
real reaproximação entre os dois países. A estratégia está em curso, mas não
assegura que o Palácio do Planalto fique imune a todos os riscos que se
apresentam no horizonte.
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