segunda-feira, 29 de setembro de 2025

Na mesma toada: mais gastos, mais impostos. Por Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

O governo ainda está precisando de truques para cumprir a meta de déficit zero neste ano

O noticiário tem sido dominado pela política. Faz sentido. Não é todo dia que um ex-presidente é condenado a 27 anos de prisão num julgamento televisionado ao vivo. Além disso, já está na pauta a eleição nacional de 2026, com os eventuais candidatos em plena campanha.

As questões econômicas tornam-se secundárias, e isso até ajuda o governo na busca por mais arrecadação. Mas basta olhar mais de perto, e lá está a equipe econômica naquela mesma toada: elevando os gastos e procurando impostos para fechar as contas, tanto as deste ano como as de 2026.

Temos alguns exemplos.

O ministro Fernando Haddad costuma reclamar dos gastos tributários. Refere-se a subsídios e isenções de impostos que cidadãos e empresas deveriam pagar e não pagam. Não se está falando de sonegação, mas de benefícios fiscais concedidos por lei. Não raro, Haddad e outros integrantes do governo associam essas vantagens a injustiças do sistema tributário. É muito dinheiro. Neste ano, o governo estima um gasto tributário de R$ 544 bilhões.

Assim, sem surpresa, o governo anunciou um corte linear de 10% nos benefícios fiscais. Seria um extraordinário ganho para os cofres da União, nada menos que R$ 54,4 bilhões. Para ter uma ideia do tamanho: neste ano, a Fazenda espera um déficit de R$ 30,2 bilhões. Isso se tornaria um superávit folgado se o corte no gasto tributário estivesse em vigor.

Mas a coisa saiu bem menorzinha. Pelo Projeto de Lei apresentado pelo líder do governo na Câmara dos Deputados, José Guimarães (PT-CE), o corte incidirá sobre benefícios que somam apenas R$ 95 bilhões. Ficam de fora gastos tributários no valor de R$ 449,2 bilhões, de acordo com dados apurados pelo jornal Valor Econômico. São justamente os benefícios mais caros.

Por exemplo: subsídios às empresas do Simples Nacional, R$ 121 bilhões; benefícios ao sistema MEI (Microempreendedor Individual) e a pessoas físicas (deduções de educação e saúde na declaração do IR), mais R$ 126 bilhões. Também foram poupados a Zona Franca de Manaus (R$ 30 bilhões) e o agronegócio (R$ 83 bilhões).

Por que esses e outros setores foram poupados? Primeiro, porque alguns, como a Zona Franca, estão previstos na Constituição, de alteração muito mais difícil. Outros são, digamos, politicamente sustentados, como os referentes às micro e pequenas empresas e às deduções no IR.

Por isso o projeto inclui o aumento na tributação das empresas que declaram no sistema do lucro presumido. Isso deverá dar ao Tesouro uma receita adicional de uns R$ 10,4 bilhões. Somada aos R$ 9,5 bilhões de corte nos benefícios, já dá um bom alívio para o Orçamento de 2026.

Também está em tramitação no Congresso uma Medida Provisória apelidada de “alternativa ao IOF”. Lembram? O governo baixou um decreto aumentando alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O Congresso barrou, o caso foi parar no STF, que deu razão ao governo. Assim, entraram já em vigor as novas alíquotas. No vaivém do decreto, o governo enviou ao Congresso uma MP que taxa títulos de crédito até aqui isentos, como os vinculados ao setor imobiliário e ao agronegócio. Era para substituir a receita perdida com a queda do IOF.

Pois o IOF vingou, e a MP continua lá.

Mesmo assim, o governo ainda está precisando de truques para cumprir a meta de déficit zero neste ano. Ocorre que essa meta tem margem de tolerância de 0,25% do PIB, para mais ou menos. Em dinheiro, isso corresponde a R$ 31 bilhões. O último relatório da Fazenda sobre as contas deste ano prevê déficit de R$ 30,2 bilhões — e esse é o verdadeiro objetivo do governo.

A Fazenda diz ser obrigada a trabalhar com o piso da meta. Mas o Tribunal de Contas da União decidiu que a meta obrigatória é zero. O governo recorre dessa decisão, e a coisa ficará para o ano que vem. Assim, o truque se fecha: o governo encerra o ano com déficit de uns R$ 30 bilhões e dá por cumprida a meta de déficit zero. Os aumentos de impostos deste ano não deram conta. Por isso, a busca de novos para 2026.

 

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