sexta-feira, 17 de outubro de 2025

Desnecessário, excelência, por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Não é papel do presidente fazer juízo público de valor sobre o desempenho de outro Poder

Lula não gostaria de ouvir dos chefes do Legislativo ou do Judiciário a desqualificação do ministério

Imprudente, para dizer o mínimo; deselegante, para usar um termo ameno. Arrogante, para expressar a impressão que dá o presidente da República dizer em público, nas barbas do presidente da Câmara, que nunca houve um Congresso Nacional de tão baixo nível.

Tal juízo é voz corrente, mas nem tudo o que se diz e se constata pode ser repetido em quaisquer situações, de qualquer maneira. Há freios de civilidade na vida cotidiana. E, quando envolve autoridades públicas, à contenção acrescentam-se as regras da institucionalidade.

Imaginemos que amanhã ou depois os presidentes da Câmara, do Senado ou do Supremo Tribunal Federal resolvessem dizer aos microfones, em solenidade com plateia amiga, que o nível do ministério é o pior de todos os tempos. O chefe da equipe se sentiria afrontado, com razão.

Pois foi o que fez o presidente Luiz Inácio da Silva (PT), na quarta-feira (15), em cerimônia no Rio de Janeiro para professores da rede municipal, um público francamente amigável. Sentado atrás dele, Hugo Motta (Republicanos-PB) ouviu, claro, sem nada poder dizer em defesa do colegiado que o elegera há oito meses e que era ali desqualificado.

A atitude do presidente foi covarde pela evidente impossibilidade de reação de Motta. Imprudente para quem precisa de votos no Parlamento, deselegante por ferir mínimas normas da boa educação e arrogante por revelar salto alto decorrente da recuperação gradual da popularidade. Acrescentemos a incoerência, considerando as ocasiões em que Lula agradeceu a "colaboração" do Congresso.

Na tentativa de modular a fala, em seguida o presidente referiu-se à "extrema direita". Sim, que não integra o Legislativo por geração espontânea. Chegou lá, nunca é demais repetir o óbvio, pela mesma via que pôs Lula na Presidência: a legitimidade da eleição.

Ninguém gosta de perder, mas é o presidente mesmo quem se orgulha de ter tido ao longo da vida e da trajetória política resistência a derrotas. Se assim ele dá a conhecer, assim precisa ser a sua prática.

 

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