Folha de S. Paulo
Encerramento da ditadura venezuelana seria
uma boa notícia para o mundo
Mas uso de força bruta em vez de diplomacia
viola sistema internacional estimulado pelos EUA
Donald Trump autorizou
a CIA a
empreender ações que possam derrubar Nicolás
Maduro na Venezuela.
Ele pode fazer isso?
Precisamos, antes de tudo, distinguir entre os reinos do ser e do dever ser. No primeiro, lidamos só com a força e o que ela pode realizar. Trump comanda a mais fabulosa máquina militar do planeta, de modo que pode fazer o que lhe der na telha, já que não há quem consiga resistir-lhe. Mas daí não se segue que ele deva fazer tudo o que pode. Isso nos remete ao reino do dever ser, onde entram as considerações éticas e cálculos políticos mais sofisticados, que vão além da força bruta. Aqui, as coisas ficam mais complicadas.
Existem situações em que é perfeitamente
legítimo para um país adotar medidas que vão contra os interesses de outro ou
violem sua soberania. Se a nação A entende que a nação B está incorrendo em
práticas desleais, pode deixar de relacionar-se com ela. Se entende que está
violando direitos humanos, pode decretar algum tipo de embargo. Deve apenas
estar atenta para não desrespeitar tratados internacionais nem sua legislação
interna.
Antes que os admiradores do bolivarianismo me
acusem de estar limpando a barra para Trump, lembro que estamos aqui lidando
com a mesma família de argumentos que a esquerda usa para cobrar um boicote
contra Israel. A questão não é se ocorre ou não uma interferência, mas se ela
tem base ética e fática.
Maduro comanda uma ditadura que prende e mata
opositores, além de ter piorado a vida da esmagadora maioria dos venezuelanos.
Sua queda seria boa notícia. O problema é que Trump está recorrendo a
"fake news" para justificar o emprego do poderio americano
contra Caracas,
o que é uma violação às leis de seu próprio país.
Mais importante, ainda que o presidente americano tenha êxito em depor Maduro, sua ação vai contra os interesses de longo prazo dos EUA. Washington foi o maior beneficiário da ordem internacional do pós-Guerra. Perderá muito se o sistema baseado em regras e consensos for substituído pela força bruta.
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