• O novo presidente, populista, erra ao culpar a globalização pelo desemprego, e parte para o protecionismo, cujo resultado será ruim também para os EUA
Não se pode acusar o novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de cometer estelionato eleitoral. Desde que entrou no Salão Oval da Casa Branca para despachar, passou a colocar assinaturas desenhadas com capricho e forte tinta preta sob várias medidas fortes, defendidas no palanque.
Trump causa espanto ao seguir um roteiro anunciado na campanha, quando muita gente dentro e fora dos Estados Unidos preferia acreditar que as teses nacional populistas e isolacionistas defendidas pelo candidato republicano eram só para atrair votos. Depois, seriam deixadas de lado.
Trump tomou posse e logo, por meio de medida executiva, uma espécie de decreto presidencial, investiu contra o Obamacare. Como prometido. É verdade que o novo Congresso, sob controle dos republicanos — na Câmara dos Representantes e no Senado —, já havia começado a fazer o mesmo.
O resto veio quase que por força da gravidade: retirou os Estados Unidos da Parceria Transpacífica (TPP), amplo acordo comercial ainda não homologado e pelo qual Obama se bateu, para reduzir a influência da China na Ásia; ajustou a mira no Nafta (acordo com México e Canadá); por tabela, deixou de lado qualquer acerto comercial mais amplo com a União Europeia; determinou a construção do muro na fronteira com o México, também um ataque ao Nafta. E, pelo visto, continuará assim, pelo menos até cumprir promessas feitas em tom de bravatas.
A linha nacionalista e protecionista de Trump representa forte suporte à onda, de mesmo pedigree ideológico, que avança na Europa, sob a torcida do também hipernacionalista Putin. Emerge de tudo isso uma surpreendente aproximação entre a Casa Branca e o Kremlin, enquanto o presidente chinês, Xi Jinping, se arvora em defensor da globalização. Tempos estranhos.
O presidente da Organização Mundial do Comércio (OMC), o brasileiro Roberto Azevêdo, em entrevista ao GLOBO antes da posse de Donald Trump, alertou que, segundo estudos, a globalização só pode ser relacionada de forma direta a apenas 20% dos empregos perdidos. O resto, a maior parte, se deve a inovações tecnológicas e avanços da produtividade.
O balanço do mercado mundial de trabalho, porém, é bastante positivo, a favor da globalização, considerando-se o bilhão de pessoas resgatadas da pobreza na Eurásia pelo processo de interconexão planetária, acelerado na reciclagem da China de uma economia comunista para um sistema misto, com a adoção de mecanismos de mercado.
Na esteira do nacional populismo trumpista vem o isolacionismo do país dono da maior economia e das forças armadas mais poderosas. Chega a ser uma incongruência, e que não produzirá desdobramentos positivos para o mundo. Nem, é certo, para os americanos.
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