Em meio a forte pressão tanto da União Europeia como de parte da população de seu país, o presidente da Polônia, Andrzej Duda, decidiu vetar parcialmente uma reforma que, na prática, deixaria todo o Judiciário, inclusive a Suprema Corte, sob controle do governo. Essa aparente boa notícia, contudo, não foi suficiente nem para contentar a União Europeia nem para arrefecer os ânimos dos poloneses, pois está claro que a democracia daquele país continua sob risco.
O perigo maior é representado pelo direitista Partido da Lei e da Justiça (PiS, em sua sigla em polonês), que está no poder desde 2015. O PiS sempre deixou claro que faz restrições ao jogo democrático. Como resultado de suas manobras, por exemplo, o Tribunal Constitucional está paralisado. O presidente Duda, a quem cabe dar posse aos juízes daquela corte, depois de aprovados pela Câmara, se nega a fazê-lo no caso de três magistrados eleitos pela legislatura que antecedeu a atual, dominada pelo PiS. Além disso, a primeira-ministra polonesa, Beata Szydlo, se recusa a publicar as sentenças emitidas pelo tribunal, passo necessário para que entrem em vigor. Enquanto isso, leis aprovadas pelo PiS são implementadas sem que tenham sido submetidas a qualquer forma de controle legal.
Essa situação causou muitos protestos nas ruas da Polônia no ano passado e também levou a União Europeia a advertir o país de que seu poder de voto no bloco poderia ser cassado se não fossem restabelecidos os mecanismos de freios e contrapesos entre os Poderes. Nada disso fez o PiS e o governo recuarem. Ao contrário: o partido usou sua maioria parlamentar para aprovar três leis que lhe retiram totalmente a independência.
A primeira lei criou um mecanismo por meio do qual os juízes da Suprema Corte poderiam ser trocados a qualquer hora pelo ministro da Justiça. A segunda deu ao governo autoridade para nomear os integrantes do Conselho Nacional do Judiciário, órgão independente de supervisão do sistema judiciário. O pacote incluía uma lei que deu ao governo o poder de nomear e destituir juízes de tribunais inferiores.
A aprovação dessa reforma deflagrou uma segunda onda de grandes protestos e renovou a irritação da União Europeia. Enquanto dezenas de milhares de pessoas exigiam que o presidente Duda vetasse as leis, as autoridades do bloco europeu tornaram a ameaçar a Polônia de suspensão, com base no artigo 7 do Tratado de Lisboa, segundo o qual é passível de punição o membro da União Europeia que permitir a violação dos valores europeus, como o Estado de Direito. Segundo o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, o bloco “não pode aceitar um sistema que permita destituir juízes de forma arbitrária”, pois “a independência do Judiciário é condição essencial” para a adesão à União Europeia.
A pressão da União Europeia foi mantida mesmo depois que Duda resolveu vetar parte da reforma do Judiciário – apenas a lei que põe os tribunais inferiores sob controle do governo foi sancionada. Tanto o bloco europeu como a população que foi às ruas exigem o veto completo das três leis.
A União Europeia não pode permitir que um país desafie de maneira tão aberta os pilares da democracia, ainda mais quando o país é a Polônia, símbolo da resistência à tirania soviética nos anos 80. Para muitos poloneses, a tentativa do PiS de interferir no Judiciário lembra os piores hábitos do antigo governo comunista. Lembra, também, a experiência bolivariana na Venezuela, que se consolidou com o fim da independência do Judiciário. Felizmente, a decisão do presidente Duda indica que o partido pode estar rachado, e sem força para derrubar os vetos.
O governo polonês se mantém desafiador e diz que não aceitará “chantagem” da União Europeia. Já os líderes dos protestos de rua prometeram uma campanha de “desobediência civil numa escala sem precedentes” se o governo não recuar. A luta que se trava hoje na Polônia dirá até onde a Europa está disposta a ir para defender a democracia.
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