Marcos de Moura e Souza | Valor Econômico
BELO HORIZONTE - A corrupção no Brasil é um problema, mas não tão grave quanto parece. E para de fato enfrentá-la é inútil alimentar a ideia de que basta eleger políticos ficha-limpa. É preciso acabar com a concentração de medidas e decisões que dependem do Estado e que muitos agentes públicos se especializam em vender em troca de propina.
Essas são algumas das avaliações de Adriano Gianturco, cientista político italiano radicado no Brasil desde 2011 e que tem se dedicado a estudar a percepção sobre a corrupção no país.
As comparações com a Itália são inevitáveis. Desvios e maus feitos têm um longo histórico na política italiana, como aqui; e os dois países promoveram ações de larga escala contra corrupção.
A Operação Mãos Limpas, dos anos 90, foi um terremoto político-empresarial. "Nas eleições que vieram em seguida, nenhum partido se apresentou com o mesmo nome e houve uma mudança geracional na política", lembra Gianturco. "Mas a elite política tem formas de se preservar." E o que os italianos viram foram medidas anticorrupção que tiveram vida curta, diz ele. Uma dessas medidas foi a extinção do Ministério da Agricultura, tido então como um dos antros de desvios. "Logo depois, foi criado o Ministério das Políticas Agrícolas", conta ele. O financiamento público de campanhas também era objeto de denúncias de ilegalidades. Foi abolido e em seguida veio outro sistema, o Reembolso Eleitoral.
"Ninguém acha que o problema da corrupção na Itália sumiu. O que aconteceu depois da Mãos Limpas é que a corrupção ficou mais profissionalizada", diz Gianturco, um siciliano de 34 anos, doutor pela Universidade de Gênova e professor da Faculdade de Direito do Ibmec em Belo Horizonte desde 2012.
"Não tenho dados de pesquisas de opinião, mas me parece que há atualmente entre os italianos uma visão bastante realista e negativa dos bastidores da política."
No Brasil, ele diz ver ainda prosperar uma ideia de que o fundamental é eleger políticos e governantes sobre as quais não pesam suspeitas de desvios.
"Há uma ideia quase monopolista de que é só eleger pessoas de bem, honestas. Mas essa é uma ideia de crianças que vivem em bolhas", diz. "O problema não é tanto a corrupção, mas a percepção idealista que as pessoas têm sobre a política."
Gianturco insiste que não é o componente pessoal que pesa, mas o componente institucional.
"Tirar os políticos não resolve. É como tirar o chefe do tráfico de hoje. Amanhã haverá outro em seu lugar. Prender é importante, mas é preciso agir na raiz: ou seja, desregulamentar, desburocratizar, desestatizar. O mercado compra o político porque o político tem algo a vender. Autorizações, concessões, alvarás."
O acadêmico afirma ver outro traço disseminado no Brasil: a ideia de que se não fosse a corrupção, o país teria recursos para oferecer escolas, hospitais, segurança de melhor qualidade. "É verdade que a corrupção é um problema, mas está muito longe de ser um problema tão grande quanto as pessoas pensam", diz o italiano. "O maior problema é que há um desvio de atenção. A crença de que no Brasil a corrupção é o problema principal é mais grave do que o problema em si."
Ele cita duas pesquisas conhecidas sobre a percepção dos entrevistados sobre corrupção. Uma delas do World Economic Forum e outra da Transparency International. A primeira, diz o acadêmico, leva em conta opiniões sobre quanto determinadas instituições são corruptas. Os resultados costumam ser sempre ruins. A segunda pesquisa - que para Gianturco é mais precisa - pergunta aos entrevistados se nos últimos 6 ou 12 meses algum agente público lhe pediu propina. Nessa, o país aparece na metade mais honesta das nações pesquisadas.
Mesmo cético em relação aos efeitos de ações como a Mãos Limpas, Gianturco vê a Lava-Jato como uma mudança importante no combate à corrupção no Brasil. "A indignação dos brasileiros é legítima, mas parece-me claramente que as coisas estão melhorando", disse.
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