- O Estado de S.Paulo
A vida do próximo presidente não será fácil. A gestão da política econômica será mais desafiadora em 2019 do que em 2018. Não só o dinheiro acabou, como reformas urgentes de corte de gastos serão necessárias para o próximo presidente não incorrer em crime fiscal. As regras constitucionais que disciplinam o orçamento federal - regra de ouro e regra do teto - estarão, provavelmente, ameaçadas em 2019.
Quanto mais reformas aprovadas até lá, melhor. Seria sábio os candidatos darem apoio à reforma da Previdência neste ano, pois ela será inevitável em 2019. E convém cautela em suas promessas. Dilma negou a crise fiscal na campanha e assim não teve apoio de seu partido para fazer o ajuste.
Há outros ingredientes que desafiarão o próximo governo. Ele terá que ter muita credibilidade e capacidade política. Não só pelo desafio de rever políticas públicas, o que gera reação de grupos de interesse, mas porque o presidencialismo de coalizão como conhecemos não será o mesmo.
O presidencialismo de coalização, termo cunhado por Sergio Abranches em 1988, caracteriza o sistema político no Brasil. Um modelo muito singular. Ele decorre da necessidade do Executivo de construir maiorias amplas no Congresso, em função da elevada fragmentação partidária. Sem isso, a governabilidade é ameaçada.
A fragmentação reflete a combinação de dois fatores principais: uma sociedade bastante heterogênea – com clivagens regionais, sociais e culturais – com multiplicidade de demandas políticas, e as coligações nas eleições majoritárias e proporcionais, algo menos frequente no mundo, ao menos em intensidade.
Eduardo Mello e Matias Spektor discutem aspectos importantes do presidencialismo de coalizão na Ilustríssima. No presidencialismo, os congressistas não se responsabilizam pelo êxito ou não do governo, já que não escolhem o chefe do executivo. No Brasil, a fragmentação partidária, com muitos partidos pequenos sem princípios claros, enfraquece o compromisso dos parlamentares com sua legenda. Preocupam-se com sua base eleitoral, e não com o bem comum; diferente do que ocorre nos EUA, onde o congressista precisa conciliar sua agenda com a do seu partido.
A organização política se mostrou incapaz de processar institucionalmente a diversidade de demandas dos setores representados no Congresso e, assim, o presidencialismo de coalização foi ganhando novos contornos.
Desde a década passada, a política se transformou em um jogo de atendimento de demandas partidárias, não apenas para participação nos ministérios, mas também para cargos na administração, emendas parlamentares, relatorias de matérias e concessões de benefícios e proteções a setores, de forma a agraciar as várias bancadas no Congresso. Isso sem contar a corrupção.
Principalmente a partir do segundo mandato de Lula, o patrimonialismo cresceu de forma expressiva. O presidencialismo de coalização exacerba o intervencionismo estatal e o populismo, com diversos programas e regulações, visando beneficiar os aliados.
É possível que o PSDB operasse a política de forma diferente da do PT. De qualquer forma, o contexto conjuntural contribuiu para a mutação do presidencialismo de coalizão. Os governos Lula e Dilma beneficiaram-se do quadro externo excepcional por alguns anos e a complacência de investidores por outros tantos. Ambos não enfrentaram as mesmas restrições orçamentárias da época de FHC. Para o próximo, será bem pior.
Da mesma forma que o populismo, o presidencialismo de coalizão precisa ser irrigado com recursos para sobreviver. Mas o dinheiro acabou. Ademais, com a tendência em curso de um Estado mais enxuto e com mais governança, a oferta de cargos públicos tende a se reduzir. A munição do Executivo para conquistar apoio no Congresso vai se reduzir ainda mais. Parte dos congressistas ainda não se convenceu disso.
A política terá que ser mais eficiente. Tem o lado bom de acabar o dinheiro.
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*Economista
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