Mesmo que o currículo básico esteja previsto na Constituição, resistências políticas o retardaram, e, por isso, o projeto já elaborado precisa ter andamento rápido
A construção de uma política educacional que retire o ensino público básico de uma crise de qualidade preocupante não é tarefa simples nem de curto prazo. Uma característica positiva do caso brasileiro é que tem havido continuidade entre governos de tendências políticas diversas, como os do PSDB e do PT.
Felizmente, o trabalho do ministro tucano Paulo Renato Souza, na montagem de testes e exames para monitorar o rendimento dos alunos, teve sequência com o ministro petista Fernando Haddad, na expansão do fundo do ensino fundamental para todo o básico (Fundeb) e no aprofundamento de mecanismos de aferição da qualidade das escolas, para citar alguns pontos importantes.
À universalização da matrícula no ensino fundamental somaram-se avanços, ainda não suficientes, no ensino básico como um todo, mas persistem gargalos no ensino médio. O Brasil continua nas piores colocações em exames internacionais (Pisa) para adolescentes, porém existem melhorias localizadas e, o que é mais importante, uma direção a seguir.
Para se continuar a perseguir a meta de atingir em 2030 a média de notas verificadas nos países ricos, congregados na OCDE (órgão para cooperação e desenvolvimento econômico), é crucial que seja logo aprovada, no Conselho Nacional de Educação (CNE), a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), chamada de forma simplificada, e mesmo pouco exata, de “currículo único”.
É um erro não haver uma indicação clara do que não pode faltar nas aulas em todo o país, série a série. Esta peça básica do trabalho pedagógico foi prevista na Constituição de 88, mas nunca executada, por resistência nos mundos acadêmico e sindical ligados à educação, mesmo que haja em países com educação avançada.
O argumento é que este currículo tiraria a liberdade do professor de ensinar. Um equívoco. Além de não se poder ir contra a necessidade de o aluno obter informações mínimas sobre matérias essenciais para ele exercer qualquer ofício — e o ensino delas precisa ser uniforme em todo o país —, não é verdade que o currículo básico engesse as escolas. Tanto que ele prevê, por exemplo, carga horária para o ensino de conteúdos regionais.
Preocupa que a Base Curricular enfrente tantos percalços para ter a aprovação final no CNE. A sua montagem foi um longo e exaustivo trabalho de consulta, de ordenamento e de debates de sugestões iniciado em 2015, quando o Ministério da Educação (MEC) anunciou, enfim, a montagem da BNCC.
Há muitos interesses em torno da educação, e por isso os processos decisórios costumam ser lentos. O assunto já estava na pauta do Conselho, quando se noticiou que há dois projetos, um na Câmara, outro no Senado, para que a BNCC seja discutida e aprovada no Congresso.
Ora, não se trata de função do Legislativo, mas de fóruns técnicos. Instâncias políticas não podem interferir nesse e em outros assuntos educacionais muito específicos que requerem formação profissional. Parte do atraso no ensino público básico se deve a este tipo de ingerência nas escolas por parte de governadores e prefeitos. Será um retrocesso permitir mais esta invasão de área.
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