quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Carlos Alberto Sardenberg: Novo na política, o clássico na economia

- O Globo

No imediato, o que mais atrapalha os negócios é o sistema fiscal, confusão de impostos sobre impostos, burocracia absurda

Teste: considerando o próximo ano, qual destes fatores provocará efeito mais positivo nos negócios? eleições presidenciais; reforma da Previdência; investimentos em infraestrutura; reforma tributária. Se você pensou em reforma da Previdência, o tema do momento, errou. Para os representantes de 750 empresas ouvidos pela consultoria Deloitte, em uma amostra bem variada, a infraestrutura é mais importante. Nada menos que 93% dos respondentes a colocaram em primeiro lugar na lista de eventos que provocam impacto positivo nas atividades de suas companhias.

Em segundo lugar, a reforma tributária, citada por 84% dos entrevistados. Finalmente, a Previdência, considerada importante para 70%.

E as eleições? Um resultado curioso. Para 43%, a maioria, o pleito, no final das contas, será bom para os negócios. Já para 26%, o efeito será negativo. E 14% responderam que tanto faz, nem ajuda, nem estraga.

Deve ter torcida neste quesito. Os que esperam um efeito positivo certamente acham que a eleição produzirá um presidente bom para as negócios, e isso, claro, no bom sentido: um governo que estabilize as contas e crie condições para investimentos e consumo ou que, pelo menos, não atrapalhe.

Melhor esclarecer esse ponto porque, como a Lava-Jato descobriu, bom para os negócios significava um método para assaltar o Estado.

De todo modo, a pesquisa Deloitte guarda coerência com o que se observa no dia a dia das empresas. A Previdência, dado seu déficit gigantesco e crescente, é a maior ameaça à economia brasileira e, pois, aos negócios. Sem reforma, esse déficit conduz a um colapso das contas públicas. Traduzindo: dívida do governo em nível de calote, juros em alta, dólar disparando, inflação e recessão. Não é terrorismo — é simplesmente o que aconteceu no Rio, em escala nacional.

Mas se a gente sabe qual seria o pior cenário, não se sabe quando ele se tornará realidade. Em quatro anos, cinco?

Enquanto isso, ali nos negócios diários, a falta de infraestrutura é muito concreta. O conceito aqui é amplo: rodovias, ferrovias, portos, aeroportos, energia, telecomunicações. Não tem uma empresa que não sinta pelo menos uma carência nesse ambiente.

Isso evidencia que o programa de concessões e privatizações deveria ser uma prioridade urgente. Sim, porque o governo, meio quebrado, não tem como investir na rapidez e no volume necessários. Já no setor privado, local e internacional, há muito capital disponível.

E resta a reforma tributária. A carga tributária é muito alta para um país emergente, mas daria para tocar os negócios assim mesmo. Há concorrentes com carga só um pouco mais baixa e, depois, eficiência e produtividade podem compensar parcialmente o gasto com impostos.

No imediato, o que mais atrapalha os negócios é o sistema fiscal — uma confusão de impostos sobre impostos, uma burocracia absurda para a empresa manter em dia suas obrigações com os fiscos federal, estaduais e municipais.

A pesquisa Fazendo Negócios, do Banco Mundial, que avalia o ambiente institucional no qual as empresas operam, tem um item que mede a qualidade do sistema tributário. Não a carga, mas os procedimentos. Pois então, numa relação de 190 países, indo do melhor para o pior, o Brasil fica em 184º. Entre as nações relevantes, é, disparado, o pior e o mais custoso sistema tributário do mundo.

É claro, portanto, que se deve começar a reforma pela simplificação e unificação de impostos e de instâncias com as quais as empresas precisam lidar. Seria um avanço extraordinário.

Já para a redução da carga de impostos, o objetivo é ainda mais difícil. Começa que os governos estão praticamente todos com as contas apertadas. Mesmo aqueles que mantêm algum equilíbrio fiscal não podem abrir mão de receita, porque as despesas cresceram muito nos últimos anos e o gasto com Previdência tem uma dinâmica de alta. Ou seja, se não houver uma contenção das despesas, o que depende da reforma previdenciária, fica difícil reduzir receitas.

Além disso, há um conflito político entre os diversos níveis de governo. Qualquer mudança provoca uma redistribuição de receitas entre a União, os estados e os municípios e, mais ainda, de estado para estado, de cidade para cidade. Também há uma redivisão da carga entre os diversos setores da economia.

Assim, toda vez que se modela uma reforma, o passo seguinte é estabelecer a compensação para os perdedores e tempo para que todos se adaptem. Isso atrasa todo o processo.

E atrasa o crescimento da economia brasileira. É curioso: o novo na política — uma demanda que se ouve por aí — deveria ser capaz de produzir receitas antigas na economia, práticas, digamos, clássicas, ortodoxas, já testadas em países que deram certo: infraestrutura de qualidade, simplificação tributária e, por fim, a reforma da Previdência.

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