- Folha de S. Paulo
Supremo precisa decidir se pode ou não se intrometer em outros Poderes
Um espectador desavisado poderia confundir as últimas sessões do STF com um ato de contrição. Lembrando o princípio da separação de Poderes, a maioria dos ministros sustentou que juízes não podem interferir nas competências de outras autoridades.
O argumento deve embasar a liberação do decreto de indulto natalinode Michel Temer. Não se deve esperar do tribunal, porém, uma revisão dos limites de sua atuação. O Supremo deixa intocada uma coleção de momentos em que se intrometeu no Executivo e no Legislativo.
Edson Fachin reconheceu a ironia. Ele ponderou que, se o STF não tem poderes para cassar o decreto, também não deveria anular a nomeação de ministros por um presidente.
A corte não teve esse espírito em episódios recentes. Em 2016, Gilmar Mendes suspendeu a nomeação de Lula como ministro da Casa Civil. Embora Dilma Rousseff tivesse autonomia para escolher sua equipe, o magistrado considerou o ato uma “falsidade” para proteger Lula.
No início deste ano, Cármen Lúcia deu aval à decisão de um juiz de primeira instância que proibiu a posse de Cristiane Brasil no Ministério do Trabalho. Uma decisão capenga dizia que ela não poderia assumir o cargo porque havia sido condenada em um processo trabalhista.
Os braços togados também alcançaram decisões econômicas. Ricardo Lewandowski chegou a travar a privatização de uma distribuidora de energia quebrada em Alagoas e proibiu o governo de adiar o aumento de salário de servidores.
Em 2017, na intromissão mais esdrúxula dessa classe, Luiz Fux cancelou a votação na Câmara do pacote anticorrupção. O ministro afirmava que o projeto de iniciativa popular não poderia ter sido alterado —ou seja, que os deputados não podem legislar como bem entenderem.
Nos próximos anos, o Supremo certamente será chamado para administrar tensões com o governo Jair Bolsonaro. O tribunal precisará se olhar no espelho para definir as fronteiras de sua atividade política.
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