- Valor Econômico
A maior contribuição do governo para o crescimento potencial da economia é a de persistir nos ajustes
A desaceleração da economia no início da década levou o governo de Dilma Rousseff a estimular a economia com políticas de afrouxamento fiscal e monetário, incentivos setoriais, elevação de subsídios e expansão do crédito público. Naquele momento, a reação à utilização das mesmas políticas adotadas como resposta à crise de 2007 e 2008 foi relativamente favorável, para só depois se tornar bastante negativa.
Mais recentemente, cresceu a demanda pela adoção de muitas das medidas implementadas no início da década. O baixo crescimento do PIB, mais uma vez aquém do esperado, mesmo após uma dramática recessão, tem justificado esse clamor. A argumentação é de que a adoção de uma política fiscal expansionista, com aumento de gastos públicos - preferencialmente investimentos -, estimularia a retomada econômica, sem prejudicar a sustentabilidade fiscal de longo prazo. Esse impacto viria da interrupção do ciclo desfavorável causado pelo recuo da arrecadação tributária e o consequente corte de gastos necessário para o reequilíbrio do orçamento. Apesar de ter uma roupagem mais elegante, não é muito diferente do argumento defendido pelo governo Dilma.
O estímulo fiscal do início da década diminuiu o resultado primário como proporção do PIB de 2,9% em 2011 para 2,2% PIB em 2012, 1,7% em 2013 e -0,7% em 2014. Depois de recuar de 7,5% em 2010 e 4% em 2011 para 1,9% em 2012, o crescimento do PIB acelerou para 3% em 2013. Mas foi uma vitória temporária, pois os anos seguintes testemunharam a maior recessão desde a década de 1930. Mesmo quando ficou claro que as políticas não teriam resultados similares aos obtidos em 2009 e 2010, houve aqueles que advogaram que o fracasso foi causado por um volume insuficiente de estímulos.
As condições das contas públicas são, hoje, mais frágeis do que no início da década. Os estímulos fiscais ocorreriam com o déficit primário em torno de 1% do PIB e a dívida bruta próxima a 80% do PIB, números piores do que em 2012, quando havia superávit de 2,9% do PIB e dívida de 54% do PIB. A maioria projeta aumento dessa última relação nos próximos anos, com o resultado primário dificilmente sendo superavitário no mandato do atual presidente. Esse desempenho sugere que o Brasil precisa perseguir uma consolidação fiscal, não havendo espaço para uma expansão adicional.
O governo Dilma também adotou outros estímulos, como a ampliação do crédito direcionado em 2013, para atenuar a desaceleração do crédito livre observada desde 2011. A participação dos bancos públicos no total do crédito bancário aumentou no governo Dilma, de um pouco acima de 40% em 2010 para cerca de 50% em 2013. A atual retomada econômica tem sido frágil, com o crescimento do crédito bancário sendo inferior ao de recuperações passadas, por conta principalmente da expansão mais lenta dos empréstimos dos bancos públicos. Assim, alguns grupos passaram a defender uma maior ação dos bancos públicos para estimular a economia.
Eventuais críticas naquela época foram mais associadas à elevação da dívida pública causada pelos empréstimos do Tesouro Nacional, em particular ao BNDES, do que ao erro de elevar os empréstimos subsidiados às empresas. O que se confirmou mais uma vez foi que medidas daquela natureza podem até ter efeitos no curto prazo, mas seus custos de médio prazo são danosos às instituições e ao crescimento sustentável.
O Banco Central reverteu o ciclo de alta de juros ocorrido até meados de 2011, iniciando um processo imediato de corte da taxa Selic para estimular a economia, mesmo com a inflação IPCA perto do topo da meta. A argumentação da autoridade monetária foi de que a inflação recuaria mais adiante. A diminuição foi pouco expressiva, com a inflação cedendo de 6,5% em 2011 para 5,9% em 2013, por conta do declínio da inflação de administrados de 5,6% para 1,5%. Mesmo assim, as críticas a esse ciclo de corte de juros só se tornaram maiores quando cresceu a percepção de que a autoridade monetária teria sido pressionada a estender o corte da Selic até 7,25%, após uma suposta sinalização de fim do ciclo já em 2012, quando a Selic já estava próxima a 9%.
A adoção de uma expansão monetária é justificável neste momento. A inflação abaixo do centro da meta, as expectativas muito bem ancoradas e o ambiente de inflação baixa na maioria dos países explicam o reinício do corte de juros, com redução de 50 pontos base na reunião de julho. A expectativa da maioria dos participantes de mercado de uma redução dos juros para 5% ou mesmo 4% em meados de 2020 é compatível com o cenário de curto prazo.
Neste momento, a maior contribuição do governo federal e do Congresso para a elevação do crescimento potencial da economia é a de persistir com a adoção dos ajustes. O caminho consiste na implementação de reformas estruturais - previdenciária, tributária, educacional, política e administrativa - e de ajustes microeconômicos - medidas para melhorar as condições de negócios, reduzir a burocracia, melhorar a regulação, estimular a competição bancária, promover a privatização ou fechamento de empresas públicas e cortar subsídios e isenções fiscais. Uma decisão que não foi implantada pelo governo Dilma e que terá efeito favorável para a economia no curto prazo é a liberação de recursos do FGTS e do PIS/Pasep.
A aplicação desse receituário é complexa e exigirá enorme dedicação, persistência e paciência por parte do governo. A saga para convencer a sociedade sobre a necessidade de implementação da reforma previdenciária é um exemplo do empenho requerido. A história ensina que não há atalhos para garantir um crescimento potencial maior para o país. A busca desses atalhos, como uma eventual adoção de medidas próximas àquelas aplicadas pelo governo Dilma, mais uma vez não será bem-sucedida. Quando muito, haverá resultados no curto prazo ao custo, mais adiante, de perda significativa de produto. O caminho certo é persistir com o trabalho e esquecer ideias miraculosas. Não há milagres neste caso.
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