Por Miguel Caballero | O Globo
Um dos elementos da narrativa bolsonarista de que o presidente é um homem de fora da política, eleito para limpá-la, é a tese de que Jair Bolsonaro é vítima da classe política e os parlamentares são "chantagistas". A frase do ministro Augusto Heleno sobre a negociação com o Congresso de um acordo sobre a execução de emendas do Orçamento ilustra o dilema que trava a relação entre o governo e o Parlamento há um ano: o presidente quer avançar seus projetos, mas sem abrir mão do discurso eleitoral que exige o achincalhe dos congressistas.
Até aqui, foi possível manter as duas coisas. Mesmo entrando em choque com o Congresso para acenar a seu público, Bolsonaro conseguiu aprovar a reforma da Previdência no ano passado, com um Legislativo alinhado à sua agenda econômica.
Os ataques do general Heleno ao acordo, costurado pelo também general e ministro Luiz Eduardo Ramos, mostram que o "núcleo militar" do governo não é homogêneo. A Ramos, cabe a articulação política com o Parlamento. Na semana passada, ao GLOBO, ele fez um mea culpa, dizendo que errou ao não manter diálogo institucional com os partidos. Seu discurso mostra que ocupa fileira oposta à de Heleno, contrário a uma moderação na relação com o Congresso.
Nessa área, Bolsonaro oscila entre os dois lados. Primeiro, sancionou o fundo eleitoral de R$ 2 bilhões. A nomeação do deputado tucano e ex-secretário da Previdência Rogério Marinho para o Ministério do Desenvolvimento Regional foi outro gesto que pende ao lado dos que defendem a necessidade de fazer política.
O que resultar da negociação do poder de governo e deputados sobre a execução de emendas orçamentárias mostrará se dessa vez o presidente dará a martelada no cravo, que serve para aparafusar a relação com o Congresso, ou na ferradura, para confirmar a narrativa com que se elegeu.
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