quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

Jorge Arbache* - A dança das cadeiras na América Latina

- Valor Econômico

É a maior integração regional das economias grandes que fará a América Latina criar mais oportunidades de investimento e emprego

A comparação do crescimento econômico da América Latina com o de outras regiões emergentes nos coloca numa posição um pouco desconfortável. Isto porque a região cresceu nas últimas décadas relativamente menos que a média dos países emergentes, o que nos levou a perder espaço na economia global.

Porém, uma mirada mais atenta para dentro da região sugere um quadro de diversidade do crescimento. Enquanto alguns países experimentaram taxas de crescimento modestas, outros experimentaram taxas bastante razoáveis até mesmo para países emergentes.

Embora o crescimento médio seja uma característica distintiva, o que mais diferenciou o padrão de crescimento dos países da região foi a volatilidade. Um grupo de países cresceu não apenas a taxas relativamente elevadas, mas, sobretudo, de forma persistente. Dentre aqueles países estão Bolívia, Chile, Costa Rica, Panamá, Peru e República Dominicana, que experimentaram taxas médias superiores a 4% desde 1990.

De outro lado estão economias cujo padrão de crescimento foi caracterizado pela alta volatilidade em torno de uma média relativamente baixa. Ali estão Argentina, Brasil, México, dentre outros.

A Venezuela também compartilhou essas características, porém, com uma intensidade substancialmente maior. Haveria, ainda, um terceiro grupo de países que, grosso modo, se caracterizou, cada um a seu modo, por um pouco de cada característica dos outros grupos.

O primeiro grupo de países vem experimentando, também cada um a seu modo, um período longo e quase contínuo de crescimento que viabilizou um processo cumulativo e virtuoso de expansão da renda e da riqueza que se mostrou determinante para o estabelecimento de bases econômicas mais sólidas.

Já o segundo grupo tem crescido esporadicamente a taxas até satisfatórias, porém, seguindo trajetórias erráticas que, ao final, pouco têm contribuído para que os países possam explorar todo o seu enorme potencial de aumento da prosperidade. Em razão dos tamanhos das economias nesse grupo, o padrão “stop and go” que tanto caracteriza internacionalmente o crescimento da região, poderia ser creditado, ao menos em parte, àqueles países.

A heterogeneidade dos padrões de crescimento tem implicações para os países e também para a região. Uma delas está associada à dança das cadeiras nas contribuições para o PIB regional. Enquanto as economias de crescimento sustentado experimentaram aumento na contribuição, as economias maiores experimentaram diminuição. A participação das economias de crescimento sustentado no PIB da América Latina praticamente dobrou entre o início da década de 1990 e o fim da de 2010. Nos casos do Chile e Peru, por exemplo, as contribuições para o PIB regional passaram de 2,7% para quase 5%, e de 2% para 3,5%, respectivamente. Já a participação das quatro maiores economias diminuiu cerca de 7%, e isto não se deveu apenas à contração da economia venezuelana.

Uma outra implicação está associada à dança das cadeiras em termos de PIB per capita. Se, no começo da década de 1990, as maiores rendas per capita estavam nas maiores economias da região, três décadas depois muitas das maiores rendas per capita estavam em países de crescimento sustentado. De fato, houve notável alteração na distribuição intra-regional da renda per capita.

Embora seja necessário reconhecer a óbvia influência das peculiaridades econômicas, políticas e sociais nos respectivos padrões de crescimento dos países, há, também, que se reconhecer que algumas similaridades estão presentes em praticamente toda a região. Dentre elas, incluem-se, em maior ou menor grau, debilidades na institucionalidade e na gestão pública, baixos investimentos em infraestrutura, baixa produtividade, serviços públicos deficientes e ambiente pouco encorajador para se fazer negócios.

Uma outra similaridade é a relativamente alta influência das commodities nas economias. Mas, a despeito disto, o fim do super-ciclo das commodities teve repercussões distintas nos países - enquanto alguns se recuperaram e continuaram em suas trajetórias anteriores de crescimento, outros passaram a enfrentar dificuldades.

Que políticas deveriam os países da região perseguir para entregar melhores resultados econômicos e aumentar o protagonismo na economia mundial? Ao menos dois conjuntos de políticas. Um está associado à medidas que elevem a média do crescimento. Para isto, será preciso promover políticas setoriais que fomentem novas fontes de crescimento, de dinamismo econômico e de competitividade, o que requer diversificar e agregar mais valor e promover a inovação e a tecnologia e, claro, atacar as debilidades acima destacadas.

A industrialização das vantagens comparativas e o desenvolvimento do conhecimento em setores em que a região já tem ou poderá ter papel protagônico, como agricultura, mineração, biodiversidade, novas energias, florestas, águas, saúde, certos segmentos industriais, dentre outras áreas, é um caminho seguro que poderá dar vazão a oportunidades de novos negócios e até de liderança em cadeias globais de valor.

Um segundo conjunto está associado a medidas que promovam o crescimento sustentado. Afinal, já sabemos que tão importante quanto taxas elevadas de crescimento são taxas de crescimento persistentes que permitam que os esforços e sacrifícios não se percam em colapsos de crescimento. Para isto, será preciso perseguir políticas fiscais, monetárias e setoriais consistentes e coerentes.

Por fim, por mais que o crescimento de cada país seja importante, é o crescimento e a maior integração regional das economias grandes que poderão fazer especial diferença para a região criar mais oportunidades de emprego, investimento e comércio.

*Jorge Arbache é vice-presidente de setor privado do Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF)

Nenhum comentário: