quinta-feira, 9 de abril de 2020

Ricardo Noblat - Bolsonaro está atrás de culpados para salvar a própria pele

- Blog do Noblat | Veja

Que país é este onde se aproveita uma pandemia para fazer política?

Um presidente da República pode muito, mas não pode tudo. Entretanto, por dispor de um poderoso aparelho de coleta de informações, ele pode não saber tudo, mas sabe muito mais do que qualquer outra pessoa no país ou fora daqui.

Ao jornalista Luiz Datena, da Rede Bandeirantes de Televisão, sem que ele nada lhe tivesse perguntado sobre isso, Jair Messias Bolsonaro disse, sem mais nem menos, e depois mudou de assunto: “Não é hora de derrubar presidente”. Como?

Jamais um presidente brasileiro disse algo parecido a respeito de si próprio. O que ele sabe que não sabemos? Existe alguma trama para derrubá-lo? Quem está por trás dela? Cercado por militares de confiança, como ele pode ter medo de ser deposto?

Na melhor das hipóteses foi mais uma manifestação da paranoia de Bolsonaro que o acompanha desde o seu tempo de deputado. À época, em muitas ocasiões, ao sair da Câmara, ele se agachava ao lado do seu carro à procura de uma possível bomba.

Bolsonaro entende de explosivos. Planejou detonar alguns dentro de quarteis quando era um simples soldado, a reclamar sempre do valor do soldo. Foi por isso que acabou processado e expurgado do Exército, acusado de indisciplina e conduta antiética.

Já como presidente eleito e empossado, pelo menos uma vez ele ajoelhou-se para conferir se havia uma bomba debaixo do carro que o transportaria do Palácio da Alvorada para o Palácio do Planalto. Morre de medo de drones e vive olhando para o céu.

Na hipótese mais provável, a advertência disparada por Bolsonaro durante a entrevista trai a preocupação com os possíveis efeitos sobre o seu mandato da desastrosa maneira como tem conduzido até aqui o combate à pandemia que mudará o mundo para sempre.

Pois como fez questão de afirmar o ministro Luiz Henrique Mandetta, Jair Messias Bolsonaro é quem está no comando. A julgar por sucessivas pesquisas nacionais de opinião pública, ele tem mais atrapalhado do que ajudado a derrotar o vírus.

Bolsonaro ouviu do deputado Osmar Terra (PMDB-RS), candidato à vaga de Mandetta, que o vírus causará a morte de muita gente, principalmente de velhos, e que não há o que fazer. A contaminação só diminuirá quando muitos forem contaminados.

A taxa de letalidade da nova peste, ou seja, a proporção das mortes registradas em comparação com o número de casos confirmados, deu um salto de 42% nas últimas 24 horas. Era de 3,5% em 1ª de abril – 7 mortos em 200 casos. Agora, 5% – 10 mortos em 200.

Em 24 horas, o número de mortos aumentou em 16%, um novo recorde. Passou para 800, o equivalente à lotação completa de 4 Airbus 320. Ou três vezes mais do que o número de mortos pelo rompimento da barragem de Brumadinho, em Minas Gerais.

O vírus começou a ceifar vidas em favelas do Rio. Na Rocinha, onde 150 mil pessoas se amontoam em minúsculas casas e circulam por vias estreitas, foram dois óbitos. Mais quatro em outras comunidades. O prefeito decretou o Estado de Calamidade.

Bolsonaro está à procura de culpados para salvar sua pele. Os governadores são um dos seus alvos – e voltou a distanciar-se das medidas restritivas tomadas por eles na 5ª fala à Nação que fez desde que chamou a pandemia de gripezinha, resfriadinho.

Sem coragem para atacar diretamente o confinamento social apoiado por Mandetta e adotado no resto do mundo, estimulou o retorno ao trabalho porque é preciso também salvar a economia. Não arredou pé de nenhuma de suas ideias, apenas baixou o tom.

Como não bastasse, tornou a prescrever o uso da Cloroquina como se ela fosse capaz de curar infectados. O médico Roberto Kalil, do hospital Sírio Libanês, em São Paulo, tomou um coquetel de remédios para se curar – entre eles a Cloroquina.

Mas nem ele nem seu pneumologista garantem que a droga o livrou da morte. Por sinal, o pneumologista foi contra o uso da droga por falta de provas de que ela seja eficaz contra o vírus. Kalil contou que tomou o remédio para não “se arrepender depois”.

Por que a Cloroquina não está sendo usada em outros países – nem mesmo nos Estados Unidos onde o presidente Donald Trump é seu maior garoto propaganda? Bolsonaro tem evitado a imprensa para não ter que responder a essa e a outras perguntas.

Um governo em fim de linha

Cloroquina nele!
O paciente número um do coronavírus no Brasil foi o presidente Jair Bolsonaro. Sua reeleição parece cada vez mais distante. E por mais que ele queira livrar-se dos estragos produzidos pelo vírus, não escapará. Seu mandato inspira sérios cuidados.

No dia em que ele se apresentou mais uma vez ao país, e desta em versão light para horror do gabinete do ódio, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal, aplicou-lhe mais um esculacho. Bolsonaro está proibido de revogar ordens de governadores.

O paciente número dois do coronavírus foi o ministro Paulo Guedes, da Economia, ex-Posto Ipiranga. Tudo o que ele planejou fazer com o país desce pelo ralo e não haverá retorno. Reformas e ajustes nas contas públicas ficarão para o seu sucessor.

A Câmara dos Deputados deverá votar, hoje, um pacote de alívio financeiro de curto prazo para os Estados. A contrapartida? Nenhuma. Guedes chama o pacote de uma bomba fiscal da ordem de R$ 180 bilhões. Bomba que explodirá no colo dele.

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