Nagasaki comprova que erros se repetem; a pandemia mostra que a complacência com os riscos é fatal
Completa hoje 75 anos o último ataque
nuclear da história, o bombardeio de Nagasaki. A primeira bomba, lançada três
dias antes sobre Hiroshima, mostrara ao planeta o horror atômico. Por que a
segunda? Foi a repetição do erro, portanto um erro ainda maior. A decisão de
lançá-la foi tomada por militares de escalão inferior, à revelia do presidente
Harry Truman. O alvo original nem era Nagasaki, mas Kokura, salva pelo tempo
encoberto. A bomba caiu sobre uma área onde, na descrição de um historiador,
“nada havia além de casas, escolas, igrejas e prisões”. Foram 80 mil mortos,
além dos 140 mil de Hiroshima. Desde Nagasaki, nunca mais uma arma nuclear foi
usada em guerra. Em parte pelo tabu, em parte por sorte.
A guerra nuclear passou a fazer parte
da lista de perigos em que todos resistem a crer — exatamente como uma
pandemia. Mas o risco se torna a cada dia mais real. Todo ano novos países
tentam entrar no clube atômico (hoje são nove). Nas últimas décadas, o Ocidente
fracassou na tentativa de impedir a entrada de Paquistão e Coreia do Norte. O
Irã caminha a passos determinados. O programa nuclear saudita também preocupa.
Alguns abdicaram, como Brasil ou África do Sul. Mas não há garantia sobre as
ambições nucleares dos estados-párias. As notícias mais preocupantes,
curiosamente, têm vindo das potências nucleares, em particular dos Estados
Unidos de Donald Trump, Rússia e China.
Décadas de desarmamento reduziram em 90% os arsenais da Guerra Fria. Mas os acordos que permitiram a distensão vêm sendo abandonados aos poucos. Em 2001, George W. Bush saiu do tratado de mísseis balísticos. Em 2018, Trump anunciou a retirada do tratado de forças intermediárias (INF). Em seguida, do acordo que regula o sobrevoo de observação. O principal dissuasivo em vigor é o acordo firmado com os russos por Barack Obama, o novo Start. Sua validade expira depois da posse do próximo presidente.
Os EUA exigem que, além da Rússia, também a China seja incluída. Os chineses alegam que seu arsenal é pequeno para justificar a inclusão. E não há tempo para negociar outro acordo. Sem renovação, o mundo estará lançado a uma nova corrida nuclear. As três potências têm investido pesado na modernização de seus arsenais. Só os americanos destinaram, em 25 anos, US$ 1,7 trilhão à tarefa e ameaçam romper a moratória de testes atômicos. Enquanto o horror de Hiroshima e Nagasaki se dissipa da memória, poucos dão atenção ao risco de guerra nuclear. Mas ele está aí, a cada dia maior. A lição da pandemia é que a complacência pode ser fatal.
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