EDITORIAIS
Ano novo, expectativas modestas
O Estado de S. Paulo
As projeções mais otimistas indicam
inflação ainda elevada, juros em alta e baixo crescimento econômico em 2022
Neste início do ano, otimismo é apostar em
crescimento econômico superior a 1%, sem o País afundar numa nova recessão.
Otimismo, neste início do ano, é apostar
num crescimento econômico superior a 1%, retomar o ritmo anterior à pandemia e
continuar correndo atrás da maior parte do mundo, sem afundar numa nova
recessão. A recuperação em V prometida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes,
tirou o Brasil do poço onde havia entrado em 2020. Se houve algum ganho, foi
muito modesto. No ano recémterminado, com muita inflação, muito desemprego e
consumo contido, o Produto Interno Bruto (PIB) deve ter aumentado 4,5%, segundo
a mediana das projeções captadas na última pesquisa Focus, divulgada nesta
segunda-feira pelo Banco Central (BC). Em 2022 a expansão econômica deverá
ficar em 0,36%, de acordo com a mesma pesquisa. Mas até essa estimativa pode
ser considerada rósea demais por muitos economistas fora da equipe de Guedes.
Algumas das previsões mais feias foram
formuladas no setor bancário. Para 83,3% dos consultados, haverá algum
crescimento econômico em 2022, mas inferior a 1%.
Os demais 16,7% projetam recessão. Para
metade dos participantes, neste ano a inflação continuará acima da meta (3,5%)
e só convergirá para esse ponto em 2023. Menor atividade, juros mais altos e
maiores gastos federais empurrarão para cima a dívida pública, de acordo com
88,9% das projeções obtidas no setor. Para conter a inflação, o BC continuará
elevando os juros e a taxa básica estará em 11,75% no fim do ano. Juros
continuarão subindo também segundo a pesquisa Focus, mas a previsão, nesse
caso, indica uma taxa de 11,5% no fim do ano.
Crédito mais caro dificultará o consumo e a retomada dos negócios e do emprego. O aperto das famílias, pressionadas pelo desemprego, pelo encarecimento dos bens e serviços essenciais e pela piora das condições de financiamento, é perceptível no desempenho do comércio varejista. É fácil entender por que as ações mais desvalorizadas em 2021 foram as de empresas do varejo, como o Magazine Luiza, a Via (dona de Casas Bahia e Ponto), os supermercados Pão de Açúcar e as Lojas Americanas. O desempenho dessas empresas na B3, a bolsa de valores, basicamente refletiu o empobrecimento da maior parte das famílias, em grande parte explicável pelas falhas da política econômica do poder central.
Uma das projeções mais otimistas –
crescimento econômico de 1,2% em 2022 – foi divulgada no fim do ano pela
Confederação Nacional da Indústria (CNI).
De acordo com o estudo, a economia
brasileira deve ter avançado 4,7% em 2021. O PIB industrial, depois de ter
diminuído 3,4% em 2020 e aumentado 5,2% no ano seguinte, deverá expandirse
apenas 0,5% em 2022, voltando ao padrão de mediocridade observado desde o
segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. Inflação elevada, juros altos,
amplo desemprego, insumos escassos e energia cara continuarão dificultando a
atividade nos próximos meses, de acordo com o documento da confederação. Alguma
melhora poderá ocorrer no segundo semestre.
Mas os desajustes ocasionados pela
pandemia, como as falhas de suprimento de insumos, explicam apenas em parte as
dificuldades da indústria. A crise ligada ao surto de covid-19 agravou
problemas conhecidos há muitos anos, como o custo Brasil, a insegurança
jurídica e as complicações burocráticas. A correção desses problemas dependerá,
em grande parte, da estabilidade macroeconômica e de uma pauta de reformas.
As propostas de mudança apresentadas pela
CNI são ambiciosas. Incluem, além de medidas para um crescimento econômico mais
vigoroso, uma política destinada a restabelecer o dinamismo da indústria, um
setor severamente enfraquecido nos últimos dez anos. Depois da reforma da
Previdência, nada relevante se fez na pauta de modernização institucional. Sem
plano, sem metas e sem programas típicos de governo, o poder central cuida dos
objetivos pessoais de um presidente capturado pelo Centrão.
Nada mais natural, nessas condições, que expectativas de baixo crescimento e desajustes continuados em 2022. Na pauta oficial, votos de feliz ano novo só valem para o presidente, seus familiares e seus aliados.l
A reeleição não é o problema
O Estado de S. Paulo
Tratar o eleitor como incapaz de fazer
escolhas sensatas é rebaixar a democracia que se pretende aperfeiçoar
De quatro em quatro anos, à época das
movimentações políticas em torno das eleições gerais, o tema da reeleição volta
ao debate público com mais intensidade. Entretanto, as discussões geralmente
não se dão em torno dos atributos intrínsecos do instituto da reeleição e,
menos ainda, da responsabilidade de mandatários e eleitores para que ele
funcione a contento, vale dizer, para que sirva, de fato, como um instrumento
para o amadurecimento democrático do País.
Não raro o debate em torno da reeleição tem
como pano de fundo a sua desvirtuação pelos governantes de turno. Logo,
trata-se de discussão baseada em uma premissa errada, qual seja, a de que a
reeleição é algo essencialmente ruim. Não é, nem para o Brasil nem para outros
países, ou o instituto não estaria presente em tantas Constituições
democráticas mundo afora. O que é nefasto para qualquer nação é o
desvirtuamento do mandato pelo governante de turno que enxerga a reeleição como
um fim em si mesma, como resultado de seus estratagemas para permanência no
poder, e não como a consequência natural da formulação e execução de boas
políticas públicas reconhecidas pelos eleitores – ou seja, como a coroação
maior de um bom governo.
No afã de dissociar suas imagens desse
aspecto negativo da reeleição, candidatos à sucessão do incumbente, em geral,
optam por apresentar aos eleitores a solução mais fácil durante as campanhas
eleitorais: prometem não concorrer a um novo mandato caso sejam eleitos – quase
todos são contra a reeleição até chegar sua vez de postular um novo mandato – e
defendem o fim dessa possibilidade. É o que ocorre agora, mais uma vez.
A Coluna do Estadão noticiou recentemente
que o deputado federal Junior Bozzella (PSL-SP), espécie de coordenador
informal da pré-campanha de Sergio Moro (Podemos) à Presidência, articula entre
seus pares a apresentação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para
acabar com a possibilidade de reeleição do presidente para um mandato
consecutivo. “A história vem mostrando que a reeleição é um instrumento que fracassou
em nosso país”, disse Bozzella à Coluna. “Era para ser a consequência de um
governo, mas virou a pauta central do detentor do mandato. Bolsonaro é o melhor
exemplo disso.”
O parlamentar tem razão quando diz que a
reeleição se tornou “pauta central” do presidente Jair Bolsonaro. Durante a
campanha eleitoral de 2018, o então candidato Bolsonaro afirmou publicamente
que, caso fosse eleito, não concorreria a um novo mandato. Como hoje se sabe,
mentiu: tudo o que Bolsonaro diz ou faz desde que envergou a faixa presidencial
é pensando em formas de se manter no cargo, não em entregar a seu sucessor um
país em condições melhores do que o que recebeu. Obcecado pela permanência no
poder, provavelmente para adiar um acerto de contas com a Justiça, Bolsonaro
foge de suas responsabilidades como chefe de Estado e de governo, seja por
incapacidade, seja pelo desejo de não se indispor com parcelas de seu
eleitorado. Tudo isso pensando exclusivamente em sua reeleição.
Portanto, a reeleição, em si, não é o
problema. A questão de fundo é o desvirtuamento do exercício do poder. Já
dissemos nesta página que a liberdade do eleitor foi muitas vezes reduzida e
manipulada pelo uso da máquina estatal em favor do governante que busca a
reeleição. O sucesso do instituto, portanto, tem a ver com o amadurecimento dos
eleitores para distinguir quando um governante está agindo movido por sua
paixão cega pelo poder e quando age tendo como norte o interesse público.
Simplesmente propor o fim da reeleição, sob o argumento de que o eleito, no
primeiro mandato, tende a empregar todo o seu empenho e os recursos estatais
para ser reeleito, e não para governar, é de certa forma duvidar da aptidão do
eleitor de perceber isso e de puni-lo nas urnas.
Ora, as eleições periódicas servem
justamente para tirar do poder quem não o exerce corretamente. Tratar o eleitor
como incapaz de fazer escolhas sensatas é rebaixar a democracia que se pretende
aperfeiçoar.
Populismo no Fies
Folha de S. Paulo
Ao renegociar dívida bilionária, Bolsonaro
perde a chance de aperfeiçoar funcionamento do programa
Antecipando o festival de populismo que
tende a dar o tom da campanha eleitoral de 2022, o presidente Jair Bolsonaro
(PL) editou na virada do ano medida provisória para permitir a renegociação
de dívidas com o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil).
A decisão beneficiará parte do 1 milhão de
estudantes hoje inadimplentes no programa de financiamentos de cursos
superiores para alunos de baixa renda em universidades particulares.
Criado em 2001 no governo Fernando Henrique
Cardoso (PSDB), o Fies já atendeu 3,4 milhões de alunos e tem a receber dos
devedores R$ 123 bilhões. Ao fim de 2020, a União calculava como irrecuperáveis
R$ 27,9 bilhões desse total.
No início de dezembro, Bolsonaro afirmara
que o governo considerava a anistia. "Estamos estudando, não quero
anunciar, né? Pessoal inadimplente aí, do Prouni, brevemente...", disse,
sem completar a frase e fazendo confusão com outro programa federal, de bolsas
de estudos, iniciado no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seu maior
adversário neste ano.
Uma semana antes, Lula havia defendido
"anistiar os meninos" do Fies. Ao que Bolsonaro comentou, imitando a
voz do petista: "Tem gente que fica prometendo: ‘Se eu for presidente, vou
anistiar todo mundo’. Por que não fez lá atrás, pô? Está aí de sacanagem".
A despeito do mau uso
eleitoreiro do tema, é certo que muitos dos alunos beneficiados pelo Fies
não têm condições hoje de arcar com suas dívidas, sobretudo em um país com a
economia estagnada.
Nesse sentido, a MP prevê que estudantes
inscritos no CadÚnico para programas sociais ou beneficiados pelo auxílio
emergencial poderão ter desconto de até 92% do valor devido. Para os restantes,
o abatimento pode chegar a 86,5%.
Como em diversas ocasiões, Bolsonaro mais
uma vez perdeu a oportunidade de exigir uma reformulação para melhorar o
programa, vinculado a um Ministério da Educação inoperante.
O Fies sofreu certo
descontrole a partir de 2011, na gestão Dilma Rousseff (PT), ao ser
rapidamente ampliado, mas sem a incorporação de mecanismos que o tornassem mais
sustentável, como ocorre em outros países.
Um bom exemplo a seguir seria o da
Austrália, em que os montantes cobrados dos ex-alunos são proporcionais ao
rendimento que obtêm quando empregados —e recolhidos pela autoridade fiscal,
simplificando todo o processo.
No caso brasileiro, porém, é imprescindível
que o próximo governo recupere a estabilidade fiscal e monetária para que o país
volte a crescer e a gerar empregos livre da inflação. Sem isso, qualquer
programa social estará comprometido.
Mais pressão
Folha de S. Paulo
Diante da necessidade de reajustar
passagens, prefeitos pleiteiam R$ 5 bi do governo federal
O ano começa exigindo decisões difíceis dos
governantes no financiamento do transporte público.
Com o prejuízo causado pela pandemia, que o
setor estima em R$ 21 bilhões, e a demanda de passageiros ainda abaixo do
período anterior à crise sanitária, muitas cidades consideram inevitável um
aumento das tarifas de ônibus nas próximas semanas.
Ao mesmo tempo, prefeitos buscam a ajuda do
governo federal para evitar que a população sofra o impacto de reajustes
significativos nas passagens e, como se viu no passado, acabe indo para as ruas
protestar.
Permanece viva na classe política a memória
das grandes
manifestações de 2013, que em poucos dias derrubou à metade a aprovação da
então presidente Dilma Rousseff (PT) e abalou a popularidade de prefeitos e
governadores.
Os problemas do setor resultam
principalmente do descompasso entre a demanda de usuários e a oferta de
veículos. De acordo com a Associação Nacional das Empresas de Transportes
Urbanos, no início da pandemia foi registrada uma diminuição de 80% na
quantidade de passageiros.
Tais números cresceram desde então, mas, em
outubro de 2021, a queda ainda era de 38%. Já a redução da oferta foi de 16,6%.
É nesse cenário delicado de rombo nas
contas e risco de colapso no sistema que empresas e prefeitos têm recorrido à
administração federal em busca de uma solução.
Após o governo Jair Bolsonaro ter vetado,
no ano passado, um
repasse de R$ 4 bilhões para o transporte público em municípios com
mais de 200 mil habitantes, os alcaides buscam agora que a União banque as
gratuidades para idosos acima de 65 anos —que, segundo o setor, responde por
aproximadamente 20% dos custos.
O pleito, que se justificaria pelo fato de
a gratuidade ser um benefício garantido por lei federal, implicaria um socorro
estimado em nada menos que R$ 5 bilhões.
Por mais necessária que seja a ajuda
federal neste momento, seria preferível que o benefício viesse atrelado a
critérios de renda, como propõe o Instituto de Defesa do Consumidor. Essa
tarifa social poderia começar pelos mais velhos e eventualmente ser estudada
para outras faixas etárias.
A medida, ademais, deveria vir acompanhada
de contrapartidas do setor, que tornem o serviço melhor e o sistema mais
eficiente, rentável e adaptado à nova realidade.
É preciso um plano para reduzir a economia
informal
O Globo
Entender por que a economia informal no
Brasil parou de encolher na última década é parte crucial do debate sobre os
objetivos de quem assumirá a Presidência em janeiro de 2023. Atacar esse
problema será uma contribuição importante para melhorar a vida dos
trabalhadores na base da pirâmide social e, em consequência, diminuir a
desigualdade. Será também chave para a busca por um ambiente de concorrência
mais justa entre as empresas e, por fim, para a saúde das contas do governo
(com destaque para a Previdência). As soluções exigem uma estratégia
abrangente, que inclua reformas na área trabalhista, crescimento econômico,
fiscalização e, no caso de atividades como contrabando e pirataria, repressão.
Em 2011, o Índice de Economia Subterrânea,
calculado pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO) e pelo
Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), era de
16,9% do PIB brasileiro. O percentual de 2021, divulgado no final do ano passado,
é quase idêntico: 16,8%. Isso equivale a um montante de R$ 1,3 trilhão
circulando à margem do Fisco e das leis. Na década passada, o melhor ano foi
2014, quando o índice caiu para 16,1%, patamar mais baixo já registrado.
O termo economia informal engloba um grupo
heterogêneo — e cada parte exige resposta distinta. Há donos de negócios que
tentam escapar do Fisco e da regulamentação; empresários com empresas formais
que mantêm parte ou todos os seus empregados sem registro; criminosos e seus
funcionários; gente que decide ou é forçada pelas circunstâncias a trabalhar
por conta própria e não vê vantagem ou não consegue abrir uma empresa;
trabalhadores domésticos sem registro ou trabalhadores eventuais.
Como explicou ao GLOBO Fernando de Holanda
Barbosa Filho, do Ibre/FGV, entre os fatores que contribuíram para a queda da
economia informal até 2014 estão a ampliação da escolaridade, a expansão do
mercado de crédito (incentivo à formalização) e o aumento na eficiência do
Fisco. Mas tais fatores estruturais não foram suficientes para sustentar a
tendência. Um dos efeitos do baixo crescimento da economia e das recessões (com
exceção da que ocorreu em 2020 com a população em casa) é o aumento da
informalidade, uma vez que mais gente é obrigada a abrir negócios próprios para
se sustentar.
Além de se concentrar no crescimento
econômico, o próximo presidente deveria tomar providências que ajudariam a
endereçar a questão. Uma das áreas que merecem atenção são as leis
trabalhistas. Mesmo depois da reforma de 2017, elas continuam bizantinas e
garantem direitos a apenas 59% da força de trabalho ocupada, deixando 41% sem
direito algum. O fato de o percentual de informais nunca ter ficado abaixo de
30%, mesmo nos momentos mais aquecidos do mercado de trabalho, deveria ser
motivo de reflexão. Será mesmo que não há nada de errado com nossa legislação?
Reforma, é óbvio, não pode ser sinônimo de vale-tudo, como parecem pensar os
que lutam contra a formalização dos que trabalham por meio de aplicativos.
Entre os extremos, ainda há muito a avançar.
Se desfile for mantido, controle nos
sambódromos deverá ser rigoroso
O Globo
A chegada da variante Ômicron ao Brasil no
momento em que a pandemia arrefecia cancelou shows de Réveillon, manteve nos
portos navios de cruzeiros e já põe em xeque os desfiles de carnaval, no fim de
fevereiro. A incerteza quanto aos possíveis estragos esfriou a euforia de
sambistas, governantes e agentes econômicos. Belo Horizonte, Fortaleza e
Salvador já cancelaram a festa dos blocos de rua. São Paulo confirmou ao GLOBO
que manteria desfiles e blocos. No Rio, a decisão sobre os blocos ainda é
incerta, e a prefeitura se diz favorável a controles rígidos nos desfiles.
Se, antes da Ômicron, o carnaval já exigia
cautela, agora mais ainda. É admissível, entre outras hipóteses, até cancelar a
festa. Milhares de foliões aglomerados cantando em voz alta facilitam o
contágio, e há perigo de a alegria virar tragédia sanitária. Caberá à ciência
dizer se o risco pode ser administrado com a vacinação.
O carnaval de rua por natureza foge a
controles. O cancelamento pode ser mesmo a medida mais sensata. Nos desfiles, é
possível reduzir danos. É fundamental exigir certificado de vacinação
atualizado de quem trabalhará ou ficará na plateia dos sambódromos do Rio e de
São Paulo. A exigência se estende às escolas de samba. Pode ser cumprida porque
há controle sobre quem desfila: a maioria das alas é de comunidade, os componentes
são cadastrados e precisam ir a ensaios para ganhar a fantasia.
O problema não é o mérito da exigência de
vacinação. A decisão é consenso entre os organizadores da festa. A polêmica
virá quando a medida for aplicada, porque, certamente, foliões negacionistas ou
desleixados tentarão ir ao desfile sem apresentar comprovante. Prefeituras e
escolas de samba precisam estar preparadas desde já para resistir à pressão de
quem insistirá em driblar a regra. Nos estádios, teoricamente, os torcedores e
a comissão técnica teriam de ficar de máscara; na prática, quase todos
dispensaram a proteção facial.
Os diretores das agremiações são rigorosos
ao conferir o samba e as coreografias. Pois que sejam mais ainda ao exigir que
os componentes comprovem estar em dia com a vacinação. Caso contrário, ficam
sem a fantasia e ponto final. O interesse é de toda a sociedade, obrigada a
fazer imensos sacrifícios para combater o vírus.
Há uma particularidade no caso das escolas
de samba: quem trabalha com grandes eventos precisa que os desfiles não tragam
uma nova onda de contágio para não sofrer com novas paralisações. O setor parou
na pandemia e ainda não recuperou os prejuízos. Restaurantes fecharam, as taxas
de ocupação se aproximaram de zero nos hotéis. O cancelamento do carnaval de
2021 tirou a renda dos trabalhadores da folia.
Um desfile com risco reduzido e impacto
irrelevante nos números da pandemia abre o caminho a outros grandes eventos,
criando parâmetros seguros para organizadores e autoridades. Mas isso só será
possível se o certificado de vacinação for exigido de todos, sem exceção.
Permitir que se dê um jeitinho será pior que atravessar o samba.
Consumo fraco freia a recuperação da
economia
Valor Econômico
Não se espera melhora significativa do
mercado de trabalho
O consumo das famílias deve desacelerar
neste ano e pouco vai ajudar na sustentação da economia. Apesar de a taxa de
desemprego ter diminuído nos últimos meses, o Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE) constatou forte queda da renda real. Já está havendo
impacto na redução da poupança e aumento do endividamento, o que inibe ainda
mais as compras.
As despesas com consumo por parte das
famílias chegaram a saltar 10,5% no segundo trimestre do ano passado, em
relação ao mesmo período de 2020. Nesse mesmo período, o Produto Interno Bruto
(PIB) teve expansão de 12,3%. Mas perderam o fôlego no terceiro trimestre,
quando aumentaram 4,2% em relação ao terceiro do ano anterior e o PIB avançou
4% na mesma base de comparação.
As vendas na Black Friday e no Natal já
mostraram consumidores mais arredios, o que pode ser atribuído à redução da
renda, apesar de o desemprego seguir diminuindo aos poucos. Isso acontece
porque predomina a oferta de vagas de menor remuneração, principalmente no
setor informal.
A taxa de desemprego caiu para 12,1% da
população em idade ativa no trimestre de agosto a outubro, em comparação com
12,6% no trimestre anterior, no levantamento do IBGE, a Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. Conseguiram emprego 3,3 milhões de
pessoas, 60% das quais sem carteira assinada. O total de informais representa
40,7% da população ocupada, ou 38,2 milhões de pessoas, incluindo os
trabalhadores por conta própria, que estão no maior patamar da série, com 25,8
milhões de pessoas, grupo diverso que inclui desde o empreendedor sem CNPJ ao
vendedor de óculos de sol na praia.
Houve aumento na ocupação com carteira de
trabalho no setor privado de 1,3 milhão de pessoas, chegando a um total de 33,9
milhões, ou 36,1% do total de ocupados. O aumento da concorrência da mão de
obra, porém, empurra os salários para baixo. Ainda há 12,9 milhões de pessoas
em busca de trabalho.
A expansão da ocupação principalmente no
trabalho informal e a concorrência pela carteira assinada diminuíram o
rendimento real habitual, que foi de R$ 2.449 em outubro, o menor patamar desde
2012. Na comparação com o mesmo trimestre de 2020, a queda foi de 11,1%. Já a
massa de rendimento ficou em R$ 225 bilhões e permaneceu estável frente aos
dois trimestres anteriores em função do aumento do número de empregados. A
recuperação é quantitativa, mas não qualitativa, disse a coordenadora de
Trabalho e Rendimento do IBGE, Adriana Beringuy.
Levantamento da LCA Consultores também
reforça a piora da qualidade da ocupação. O percentual de trabalhadores que
ganha até um salário mínimo subiu de 29,2% em 2019 para 36,4% em setembro
passado. Já o percentual dos que ganham mais de dois salários mínimos caiu de
35,1% para 28,8%.
Outra faceta da nova realidade é a redução
da poupança entre a baixa renda. Depois de ter crescido no primeiro ano da
pandemia em consequência da cautela das pessoas e da impossibilidade de se
gastar devido ao isolamento social, a poupança começa a se esvair,
especialmente entre as camadas mais pobres da população. Levantamento feito
pelo Centro de Estudos de Mercado de Capitais da Fundação Instituto de Pesquisa
Econômica (Cemec/Fipe) constatou que a poupança financeira das famílias teve
uma injeção recorde de R$ 165,9 bilhões no segundo trimestre de 2020, mas
começou a ser esvaziada neste ano inclusive para o pagamento de contas e, no trimestre
encerrado em setembro, somou apenas R$ 44,94 bilhões. Somente quem possui
poupança com saldo superior a R$ 50 mil continuou gerando fluxo positivo,
segundo o Cemec/Fipe.
Não por acaso, o endividamento das famílias
segue crescendo, mesmo com a nova metodologia adotada pelo Banco Central (BC)
que inclui auxílios, férias, horas extras e 13º salário. Com essa alteração, o
endividamento das famílias brasileiras com o sistema financeiro aumentou de
48,7%, em agosto, para 49,4% em setembro.
As previsões não são otimistas. Não se
espera melhora significativa do mercado de trabalho. Se a inflação ceder, como
se espera, a renda real das famílias até vai aumentar; e o desemprego pode
seguir diminuindo ligeiramente até o primeiro trimestre deste ano. Mas há o efeito
negativo da trajetória de alta dos juros e a expectativa de um cenário
econômico mais turbulento com a campanha para as eleições presidenciais.
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