O Estado de S. Paulo
Um orçamento transparente e coeso, fruto de planejamento e avaliação de políticas públicas, é necessário para forjar o futuro
Este é um período de renovar ideias e de
comprometerse com mudanças para o ano que se inicia. Costumamos fazer votos por
mais saúde, paz e felicidade. Vaticinamos, uns aos outros, bons agouros. Desta
vez, no entanto, não há voto mais importante do que desejar o fim do governo
Bolsonaro. Nada avançará na presença deste horror, em que reinam o
obscurantismo, a falta de empatia, a indiferença em relação ao sofrimento do
próximo e o amadorismo.
Infelizmente, 2022 será um novo ano perdido. Na economia, projeta-se crescimento baixo, talvez parcialmente compensado por despesas avalizadas pelo rombo no teto de gastos (Emenda Constitucional n.º 95). O desemprego seguirá elevado e o número de pessoas vivendo em condição de pobreza ou de extrema pobreza será alto. A inflação elevada corroeu a renda dos mais pobres e, mesmo desacelerando, em 2022, imporá novo fardo ao orçamento das famílias.
A estagnação da economia brasileira não é
necessariamente um fato novo. Entre 2017 e 2019, a taxa média de crescimento do
Produto Interno Bruto (PIB) ficou em torno de 1,5%, abaixo do produto potencial
(espécie de medida das possibilidades de crescimento de um país). Depois de uma
recessão brutal, na esteira da pandemia, o ritmo de recuperação não tem sido
suficiente para melhorar as perspectivas de médio prazo.
Hoje, há quase 5 milhões de pessoas a mais
em situação de pobreza em relação a 2019. O Estado está falhando gravemente em
prover o mínimo necessário para a subsistência. A inépcia na gestão do Auxílio
Emergencial, a criação de um programa polêmico no lugar do Bolsa Família, a
ausência de um plano de saída da crise e a má qualidade do gasto público ajudam
a explicar este quadro geral tão ruim.
As contas públicas estão cada vez mais
desorganizadas. O teto de gastos foi abandonado por meio das Emendas
Constitucionais n.º 113 e n.º 114, derivadas da PEC dos Precatórios. Os
investimentos públicos estão no menor nível da série histórica e o processo orçamentário
recebe, ano a ano, novos golpes.
Um orçamento transparente e coeso, fruto de
planejamento e avaliação de políticas públicas, é necessário para forjar o
futuro. A modernização do Estado e do seu Orçamento é o fio condutor de todas
as reformas que precisarão ser endereçadas quando esta súcia de despreparados
deixar o Planalto. A partir dela, pode-se abrir caminho para discutir as
prioridades do País em todas as áreas.
A concepção de um plano de desenvolvimento
de longo prazo pode parecer ideia ultrapassada, mas é, na verdade, inescapável
para o Brasil voltar a crescer e a distribuir renda e riqueza. Não há
prosperidade por geração espontânea. Estado e mercado são instituições
complementares, ambas fundamentais para o progresso econômico e social numa
democracia consolidada.
Um governo preparado estaria, agora,
dialogando com o resto do mundo para identificar portas de saída desta crise
sem precedentes. Há diagnósticos e propostas que poderiam balizar um plano de
recuperação pós-pandemia. Apreender a experiência dos países da Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), por exemplo, poderia ser
um bom começo.
No lugar disso, estamos presos a uma
espiral de loucura, crueldade e despreparo. É como estar no pesadelo de Alice
sob os desmandos da Rainha de Copas. A diferença é que não é fantasia, mas,
sim, uma realidade horripilante.
Este governo orienta-se para o mal. Basta
vê-lo pregar, diuturnamente, contra a vacinação, em meio a uma pandemia, ou dar
de ombros quando contempla a morte de seus concidadãos. É por isso que se pode
afirmar com segurança: este governo nunca será capaz de avançar em qualquer
área relevante a contento.
Esperar mudança de atitude ou bom propósito
desta turba é dar murro em ponta de faca. O bolsonarismo governa sem projeto. É
o poder pelo poder. Para ficar na economia, o programa supostamente liberal do
ministro não saiu do papel. Na verdade, tratava-se, desde o início, de um
conjunto de ideias mal-ajambradas, de indicações gerais sobre tamanho do
Estado, descentralização de recursos e quetais. Um mol de platitudes.
Tanto é assim que as propostas da lavra do
Executivo tiveram um de dois destinos: ou foram aprovadas, como a PEC
Emergencial (Emenda 109), para piorar o arcabouço constitucional; ou morreram
na praia, como a reforma tributária.
A base de sustentação do governo compõe-se
de cidadãos desinformados e ludibriados por bandeiras ditas moralistas. As
hostes oficiais, a começar pelo próprio presidente, desacreditam os veículos de
comunicação, substituídos por redes de fake news. Esses apoiadores, que ainda
somam fatia relevante do eleitorado, acabam enlevados por um ideário simplista,
mas eficiente ao que se propõe: mostrar que Bolsonaro teria sido eleito para
tirar o País das mãos do comunismo, dos corruptos, etc. É esse o grau de
loucura, de burrice e de calhordice.
Sair dessa armadilha requererá união. A
reconstrução do País, a partir de 2023, começa agora. Por essa razão, meu único
voto para 2022 é este: que termine logo o pior governo da história do País.
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