Folha de S. Paulo
Estratégia política de alto risco, populismo só tem êxito em circunstâncias específicas
Políticos populistas ameaçam a democracia. Difundem a
descrença nas instituições representativas, combatem o pluralismo, estimulam a
polarização e montam poderosas máquinas de desinformação. No governo, tratam de
submeter o Legislativo e, especialmente, o Judiciário à vontade do Executivo,
sob seu controle, e buscam amordaçar a mídia, as organizações autônomas da
sociedade e as oposições organizadas. O modo como agem é esmiuçado por Steve Levitsky e Daniel Ziblatt no best-seller "Como as
democracias morrem", de 2018.
Felizmente, governantes populistas não costumam ser bem-sucedidos ao buscar a destruição do sistema representativo. Essa é a tese do professor Kurt Weyland, da Universidade do Texas-Austin, no artigo "How populism dies" (Como o populismo morre: as fraquezas da liderança personalista plebiscitária"), publicado neste ano nos Estados Unidos.
Segundo ele, a eleição de um líder
populista pode ser perturbadora, mas não condena o regime democrático à
extinção. Ao contrário, a democracia com frequência sobrevive a quem se dispôs
a
destrui-la.
Para fundamentar sua tese, Weyland examinou
as 38 experiências de governos com aquele tipo de liderança, ocorridas na
Europa e na América Latina, desde 1985. Constatou que são muitos os casos em
que aqueles governos entram em colapso rapidamente. Caem e são substituídos
segundo a rotina, nos sistemas parlamentaristas, ou são derrubados por golpes
parlamentares, impeachment,
ou renúncia forçada. Quando chegam ao final do mandato, dificilmente se
reelegem.
A recente derrota de Bolsonaro nas urnas, assim como a de Trump, em 2020, são
dois exemplos que parecem confirmar os achados de Weyland. Ele argumenta que o
populismo é uma estratégia política de alto risco, que só tem êxito em
circunstâncias bem específicas. Líderes personalistas que se dispõem a
enveredar por esse rumo têm de enfrentar as elites estabelecidas e os outros
Poderes de Estado, os quais, com maior ou menor vigor, freiam sua ambição. Com
frequência, sofrem pressão também de governos estrangeiros e de organizações
internacionais. Sua capacidade de mobilizar seguidores dificilmente compensa a
força das oposições que seu estilo político desperta.
Em suma, a boa notícia é que os populistas autoritários antes fracassam do que triunfam, e a democracia resiste mais frequentemente do que sucumbe a suas investidas. Ainda assim, o fato de que forças de pendor autoritário ganhem importância crescente nas nações democráticas é inquietante, pois no mínimo tornam as disputas eleitorais mais radicalizadas e o convívio político mais áspero.
*Professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.
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