Piora em índice de assassinatos desafia o governo do Rio
O Globo
Violência cresceu no estado no primeiro
semestre, em contraste com a melhora no resto do país
A sensação de maior insegurança
experimentada por cidadãos fluminenses no dia a dia foi comprovada pelas
estatísticas divulgadas nesta quinta-feira pelo Monitor da Violência,
parceria do portal g1 com o Núcleo de Estudos da Violência da USP (NEV/USP) e o
Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O estado registrou crescimento de 17,3%
no número de assassinatos no primeiro semestre de 2023. Foi a segunda maior
alta em todo o país, atrás apenas do Amapá (65,1%).
De acordo com o levantamento, foram registrados 1.790 assassinatos no Rio no primeiro semestre, ante 1.526 no mesmo período do ano passado. Isso significa que, a cada dia, quase dez cidadãos são mortos no estado. A estatística reúne homicídios intencionais (incluindo os feminicídios), latrocínios e lesões corporais seguidas de morte, mas não as mortes decorrentes de intervenções policiais, que deixariam os dados ainda mais sombrios.
A violência no Rio contaminou os números do
Sudeste, única região do país a registrar piora nos indicadores (alta de 4,3%,
para 5.099 assassinatos no primeiro semestre). Todas as outras regiões
registraram queda. A mais expressiva no Centro-Oeste (9,7%) e a menor no Sul
(2,8%). No Norte e no Nordeste, que nos últimos anos vinham registrando
crescimento ininterrupto, houve redução de 6,3% e 5,8%, respectivamente. Rio e
Sudeste vão na contramão do Brasil. Os assassinatos no país caíram 3,4% no
primeiro semestre deste ano na comparação com o mesmo período de 2022 (para
19.742). Entre as 27 unidades da Federação, dez apresentaram alta nos
assassinatos. Das 17 que conseguiram reduzir seus índices, o resultado mais
expressivo é Roraima (22,5%).
Há aspectos positivos para o país nesses
números. O total de mortes violentas no ano passado (40.824) é o menor da série
histórica do Monitor, iniciada em 2007. Apesar disso, eles devem ser vistos com
cautela. Primeiro, porque ainda são altíssimos. No Brasil, 112 pessoas são
assassinadas todo dia, um absurdo. Segundo, porque a queda está ligada não
necessariamente ao resultado de políticas públicas, mas também aos períodos de
guerra e armistício entre as facções que infernizam o país. No Rio, a alta no
primeiro semestre é atribuída em parte à disputa das quadrilhas pelo espólio do
chefe da maior milícia do Rio, assassinado em junho de 2021.
Nas últimas semanas, o país tem sido
sacudido por episódios de violência. No Guarujá, depois do assassinato de um
agente da Rota, seguiu-se uma operação policial que resultou em pelo menos 16
mortos. No Rio, uma única ação da polícia no complexo de favelas da Penha
provocou dez mortes. Na Bahia, no início do mês, confrontos entre policiais e
bandidos terminaram com pelo menos 19 mortos. Histórias trágicas, como a da
menina Eloah, morta por uma bala perdida dentro de casa, no Rio, têm chocado a
população.
Fica claro que o Brasil ainda não conhece uma política eficaz para conter a violência e que os métodos não têm dado os resultados esperados. O governo federal tem de se articular com os estados na área de segurança pública, traçando uma política nacional, investindo em inteligência e tecnologia, estabelecendo protocolos mínimos para as polícias. Sem isso, não será possível reduzir a sensação de insegurança entre os fluminenses — e no resto do país.
Governo sofre pressão generalizada do
Centrão
Valor Econômico
Lira garantiu a tramitação dos projetos
mais importantes para o governo, em troca de uma tutela do Executivo que se
tornou invasiva
Há uma ofensiva generalizada dos partidos
do Centrão para obter concessões sem fim de um governo cuja base é minoritária
no Congresso. O lamento do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de que a
Câmara tem “poder demais” e não pode “humilhar” o Executivo e o Senado, mais do
que ferir os melindres do todo-poderoso presidente da Câmara, Arthur Lira, é a
constatação tácita de uma realidade. Outra é o fato de que o arcabouço fiscal,
aprovado com rapidez na Casa, estancou agora, depois de votada pelos senadores,
porque Lira quer cobrar antes uma contrapartida por serviços prestados. As
exigências são muitas e crescentes.
Em poucos dias, enquanto Lula se debate no
dilema da reforma ministerial - entregar ou não peças importantes da máquina
pública a Lira e aliados -, de cujo desenlace depende a votação final do novo
regime fiscal, surgiram demandas que reduzem a capacidade de ação do Executivo.
Há pleito firme por aumento do valor das emendas parlamentares como um todo,
acima dos R$ 37,5 bilhões do atual exercício. Há exigências de que as emendas
de comissão sejam impositivas também. E, para todas as emendas, há a intenção
de que eliminar o a discricionaridade do Executivo em sua liberação, definindo
um cronograma para isso.
Nos trilhos da liberdade expandida da
apropriação das emendas ocorre a disputa de poder. A reforma ministerial é
parte dela, pois poderá dar aos partidos do Centrão novos eixos em ministérios
e autarquias para onde essas mesmas emendas serão preferencialmente destinadas.
Lira chegou a sugerir que a liberdade poderia ser total, porque um deputado
sabe muito mais as necessidades dos eleitores que um ministro encastelado na
burocracia de Brasília.
A demagogia é um dos elixires usuais da
disputa pelos bilhões do Orçamento. Um levantamento mostrou que, deixados à
própria sorte, os parlamentares só pensam em beneficiar seus redutos
eleitorais, que os reelegerão e também a seus apaniguados. Nos empenhos de
emendas parlamentares até 18 de julho, nenhum tostão foi indicado para a área
de educação, cultura e ambiente - a pesquisa abrangeu 57 instituições, entre
elas 32 universidades, fundações e institutos federais (O Globo, 23 de julho).
Em contrapartida, os parlamentares enviaram
para órgãos estatais dominados pelo Centrão R$ 611 milhões. Mais da metade (R$
356,1 milhões) foram para o Departamento Nacional de Infraestrutura de
Transportes (Dnit), e R$ 131 milhões para a Codevasf, cujos projetos, sob
suspeita de corrupção no governo Bolsonaro, se tornaram o destino predileto de
emendas de legendas fisiológicas.
O governo Lula fez acordo para pagar, antes
da posse, metade das emendas do relator fulminadas pelo Supremo como emendas
individuais, com o compromisso informal de que os deputados e não os
ministérios indicariam o destino dos recursos. Foi a contrapartida à PEC da
Transição que, em troca, lhe deu mais R$ 165,7 bilhões para gastar. Aí também
houve rapidez exemplar na entrega de recursos.
Os parlamentares encontraram, com o
orçamento secreto banido, mais formas de agilizar a remessa de recursos aos
redutos eleitorais e aos fazedores de obras e, o que é nefasto, sem qualquer
transparência. As emendas PIX, nas quais deputados enviam recursos de emendas
individuais diretamente a prefeituras, sem que necessitem sequer dizer a
finalidade para qual o dinheiro deve ser aplicado, e sem passar por
intermediários, foram multiplicadas por oito no atual exercício. Até julho, a
modalidade transferiu R$ 6,4 bilhões, ante R$ 771 milhões no mesmo período de
2022 (O Globo, 27 de julho). No início de julho, o governo Lula liberou de uma
vez R$ 5,2 bilhões delas.
A possibilidade de reforma ministerial já
era real desde a posse de Lula. Ao ampliar o arco de alianças, o presidente
escolheu três ministros vinculados à União Brasil que não representavam seu
partido e que obviamente não ampliaram muito seu apoio no Congresso. Mas não
são esses os ministérios cobiçados pelo Republicanos e PP, de Lira, para ingressarem
a meio corpo na base governista. Querem pastas e órgãos com verbas, como a
presidência da Caixa Econômica Federal, a diretoria financeira da Codevasf, a
Funasa, e o ministério de Desenvolvimento Social, que dirige o Bolsa Família.
Trinta e sete ministérios não foram
suficientes para agradar a todos e Lula já propôs mais um, o das Micro e
Pequenas Empresas, supostamente rejeitado pelos Republicanos. O ambiente que
circunda a reforma não é bom. Haddad, nas entrelinhas, sugeriu um limite para
as ambições de Lira. Até agora, Lira garantiu a tramitação dos projetos mais
importantes para o governo, em troca de uma tutela do Executivo que se tornou
invasiva e tende a ser generalizada.
Há vários riscos nas concessões às forças fisiológicas, no passado envolvidas com a Lava-Jato. Ao lançar um programa de R$ 1,7 trilhão de intenções de investimento, o governo precisará de gestores eficientes, técnicos e probos. O domínio de partes operacionais importantes da máquina pública pelo Centrão pode redundar em grandes escândalos, como ocorreu com Lula 1 e Dilma. Por outro lado, não será fácil para o governo deixar de ser um refém de Lira.
Infância abatida a tiros
O Estado de S. Paulo
Guerra entre policiais e traficantes deixa
rastro de mortes de crianças e expõe a falta de estratégia do Estado, que
banaliza o infanticídio como efeito colateral no combate ao crime
O tiro que atingiu no peito Eloah da Silva
dos Santos, de cinco anos, que brincava pulando na cama, em sua casa, numa
comunidade pobre do subúrbio carioca, transformou a menina em mais uma das
dezenas de placas instaladas às margens da Lagoa Rodrigo de Freitas, área nobre
do Rio. A instalação, da ONG Rio de Paz – a mesma que espalhou cruzes nas
areias de Copacabana e no gramado da Esplanada dos Ministérios –, lembra
crianças mortas na guerra entre traficantes, policiais e milicianos no Rio. Nos
últimos 16 anos, a ONG contabiliza 101.
Parecem lápides as placas informando nomes,
idades e circunstâncias em que morreram crianças e adolescentes até 14 anos. Um
monumento funesto a expor o despreparo, a negligência e a absoluta falta de
estratégia para resguardar a vida de cidadãos totalmente vulneráveis. O Estado,
na acepção mais ampla da palavra, em todas as esferas de governo e de Poderes,
acompanha o extermínio cruel – ainda mais doloroso por pinçar suas vítimas
entre os menos favorecidos – sem qualquer sinal de reação, salvo as de praxe.
A cada morte, as mesmas evasivas. Depois de
garantir que os policiais têm protocolos e preparo, as autoridades prometem que
investirão em mais treinamento. Como as crianças continuam sendo mortas, pergunta-se:
de que treinamento estarão falando? Somente três dias depois da morte de mais
uma criança a tiro, o governador do Rio de Janeiro, Claudio Castro, resolveu se
manifestar, mas para dizer o de sempre: que é preciso “treinar para que isso
aconteça cada vez menos”.
Antes, a Secretaria da PM, em nota, havia
recorrido ao mesmo palavrório ao afirmar que os policiais são “treinados e
preparados para atuarem de forma segura” e que “a opção pelo confronto é sempre
uma iniciativa dos criminosos, que realizam ataques armados inconsequentes
diante do cumprimento das missões institucionais dos entes de segurança do
Estado”. Ora, dos criminosos não se espera nada senão crimes; já os “entes de
segurança do Estado” têm a obrigação de saber que uma operação dessas, numa
área densamente habitada, requer cuidados extraordinários, justamente para não
atingir inocentes.
Já seria inaceitável se a menina Eloah
tivesse sido morta por ter inadvertidamente passado no meio do fogo cruzado.
Mas é muito pior: Eloah foi morta em casa, lugar onde se supõe que uma criança
se sinta mais protegida. Outras crianças foram mortas na (ou a caminho da)
escola. Em algumas comunidades, diretores e professores tomaram a iniciativa de
incluir como espécie de disciplina extracurricular ensaios de como se proteger
em caso de tiroteio, como se deitar no chão escorado a uma parede, por exemplo.
Mera formalização de uma reação instintiva.
Protocolos de segurança são descumpridos de
forma corriqueira em operações policiais, substituídos por métodos truculentos
que nem as leis de guerra permitem. Não parece, mas ainda vigoram os limites da
atuação da polícia estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal durante a
pandemia. Essas regras, que valem para todo o território nacional, incluem, por
exemplo, dar prioridade às “investigações de incidentes que tenham como vítimas
crianças e adolescentes”. Em 2022 e neste ano, 15 crianças de até 14 anos foram
mortas, de acordo com o monitoramento da ONG Rio de Paz. Nenhum desses crimes
teve os culpados identificados.
A guerra entre policiais e bandidos que
vitima crianças não é exclusividade do Rio de Janeiro, embora a repetida
incidência de tragédias deste tipo mantenha o holofote sobre a cidade. Seis
dias antes da morte de Eloah, o adolescente Thiago Flausino, de 13 anos, foi
morto por policiais do Batalhão de Choque na Cidade de Deus. Estava na garupa
de uma moto. Levou o primeiro tiro e caiu. Foi executado com mais quatro
disparos. Estava desarmado. Os PMs disseram que era “bandido”.
No enterro, amigos da mesma faixa etária,
companheiros dos jogos de pelada no campinho do bairro, choravam abraçados,
usando camisetas do “Canelinhas F.C.” e do “Goleadores”. O Rio banaliza o
infanticídio como efeito colateral das ações do Estado.
O reajuste aditivado da Petrobras
O Estado de S. Paulo
Não é difícil notar que os preços dos
combustíveis se mantiveram inalterados pelo tempo necessário para ajudar a
baixar a inflação e, consequentemente, os juros, como queria o governo
O pesado reajuste de gasolina e diesel
anunciado pela Petrobras confirmou o que já estava subentendido: foi artificial
a estabilidade interna dos preços dos combustíveis por mais de dois meses,
enquanto petróleo e derivados acumulavam altas no mercado externo. Bloquear
repasses por tanto tempo, ignorando o novo cenário, levou à pancada de 16,2% na
gasolina e de 25,8% no diesel nas refinarias. E nem isso foi suficiente para
zerar a defasagem em relação aos preços internacionais, como admitiu o
presidente da companhia, Jean Paul Prates.
Para que isso ocorresse, seria necessário
aumentar ainda mais a dose. Prates revelou que, pelos cálculos da empresa, para
equiparar preços domésticos e externos o litro do diesel teria de subir R$ 1; e
o da gasolina, pelo menos R$ 0,50, em vez dos, respectivamente, R$ 0,78 e R$
0,41 adotados. E aqui vale o parênteses: por pura estratégia de marketing, a
Petrobras não divulga o porcentual do reajuste – a não ser, claro, quando se
trata de redução –, como se assim conseguisse camuflar sua intensidade.
Do mesmo modo que conceitos matemáticos
elementares revelam os porcentuais, não é difícil perceber que os preços se
mantiveram inalterados pelo tempo necessário para que o efeito benéfico sobre a
inflação suscitasse uma avaliação favorável do Banco Central (BC), de modo a
abrir caminho para a queda dos juros defendida pelo governo. Por óbvio, não foi
o único motivo que afinal garantiu o afrouxamento monetário de 0,5 ponto
porcentual, mas certamente pesou.
Logo depois de anunciado o reajuste dos
combustíveis, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, avaliou que esse “grande
aumento”, segundo suas próprias palavras, terá um impacto inflacionário entre
agosto e setembro da ordem de 0,4 ponto porcentual. Conter os preços sem
sustentação técnica traz prejuízos para a empresa e seus investidores. Mas é
difícil contestar uma fórmula que, concretamente, não existe. Como já dissemos
neste espaço, a Petrobras não pode desconsiderar que 63,4% de seu capital está
em mãos privadas, enquanto a União exerce o controle com 36,6% do total de
ações. Durante a contenção forçada de preços – que no caso do diesel
correspondeu a três meses –, Prates e o ministro de Minas e Energia, Alexandre
Silveira, se apressaram em dizer que a empresa não estava perdendo dinheiro.
Ora, num mercado abastecido em parte por
importações, é difícil imaginar uma conta na qual a empresa não saia perdendo,
pois ela está entre os principais importadores dos produtos. Em torno de 15% da
gasolina e 25% do diesel consumidos no País vêm de fora. Preços domésticos mais
baixos inibem a atuação de outros importadores. A Petrobras tem a obrigação
legal de garantir o abastecimento interno. A menos que consiga negociar, por
contrato, importações mais baratas, a empresa compra por um preço e revende
mais barato em suas refinarias. A matemática básica indica prejuízo em
operações assim.
Como companhia de economia mista controlada
pela União, a Petrobras não deveria se pautar por decisões políticas, embora a
ingerência de sucessivos governos sobre a empresa tenha se tornado corriqueira.
Como todas as demais empresas listadas em bolsa, está sujeita à regulação de
mercado e tem de observar regras de boa governança, em especial em respeito a
seus investidores. Não pode ser um simples instrumento de governo, como agora,
ao ser alçada à categoria de tábua de salvação para o fechamento das contas
públicas. Para isso, poderá contribuir com R$ 30 bilhões em um acordo para
encerrar litígios com a Receita Federal, como quer o ministro da Fazenda,
Fernando Haddad.
A Petrobras também entra como caixa extra
no novo PAC. Como principal empreendimento está a Refinaria Abreu e Lima, em
Pernambuco, aquela que seria dividida com a Venezuela, que não contribuiu com
um bolívar sequer. O projeto inicial, de US$ 2,3 bilhões, pulou para
inacreditáveis US$ 18,9 bilhões, muitas acusações de sobrepreço e com a
conclusão de apenas uma das duas unidades. Agora, a Petrobras é chamada a
complementar a obra. Todos já viram este filme.
Anistia absurda em São Paulo
O Estado de S. Paulo
Perdoar multas por violação de normas
sanitárias contraria interesse público em múltiplas dimensões
Abem do interesse público, a Assembleia
Legislativa deve rejeitar o projeto de lei enviado à Casa pelo governador
Tarcísio de Freitas para anistiar multas aplicadas por descumprimento de normas
sanitárias durante a pandemia de covid-19. Para começar, o projeto é
fundamentalmente descabido porque parte de uma visão distorcida da multa
administrativa como meio de arrecadação, e não como ato educativo, coercitivo e
dissuasório com vista ao resguardo da coletividade ante o mau comportamento
individual.
O secretário estadual de Saúde, Eleuses
Paiva, argumentou que a aplicação das sanções acabou por “sobrecarregar a
administração com o gerenciamento de processos administrativos e de cobranças
de multas sem finalidade arrecadatória”. Ora, nenhuma multa deveria se prestar
à arrecadação. Ademais, ao falar em “sobrecarga” do aparato estatal por algo,
convenhamos, tão comezinho, o governo está admitindo que o Estado é incapaz de
exercer uma atividade que é de sua própria essência como entidade
político-administrativa.
Para piorar, ao governador paulista faltou
a coragem política de apresentar um projeto específico para tratar dessa
anistia. Tarcísio preferiu inserir um “jabuti” no Projeto de Lei 1.245/2023,
que trata da cobrança de créditos tributários inscritos na dívida ativa. Ao
final do referido projeto, determina-se que “ficam canceladas as multas
administrativas, bem como os respectivos consectários legais, aplicadas por
agentes públicos estaduais em razão do descumprimento de obrigações impostas
para a prevenção e o enfrentamento da pandemia de covid-19”. Um dispositivo
desse jaez, em tudo contrário ao interesse público, não pode prosperar.
É claro que Jair Bolsonaro será o principal
beneficiado por esse projeto caso ele venha a ser aprovado. Seria um desastre
premiá-lo. Como presidente, Bolsonaro fez campanha aberta pela desobediência
civil. Quando deveria servir de exemplo e ser o líder da Nação num momento de
crise, não apenas ignorou as normas sanitárias de São Paulo, que valiam para
ele como para qualquer cidadão, como incitou a população a acompanhá-lo em sua
petulante incivilidade. São comportamentos que não podem passar impunes. Esse
projeto, porém, não é ruim porque beneficia Bolsonaro; é péssimo pelos sinais
que emite para toda a sociedade.
Que mensagens Tarcísio está passando aos
paulistas? Em primeiro lugar, que a adoção de comportamentos lesivos à saúde
pública durante uma emergência sanitária não é passível de sanção
administrativa, abrindo margem para práticas igualmente irresponsáveis em
situações semelhantes no futuro. Em segundo lugar, ao vedar pedidos de
restituição aos que violaram as normas e pagaram suas multas, o governador está
dizendo que o contribuinte que cumpre suas obrigações é um tolo, pois outras
anistias decerto podem vir logo adiante.
Como se tudo isso não bastasse, o projeto ainda fere de morte o princípio da igualdade de todos perante a lei, viga mestra da República, ao dividir os cidadãos em duas classes: os anistiados e o resto, sobre os quais recai todo o peso do Estado sancionador.
Amadorismo
Folha de S. Paulo
Recuo de Tarcísio nos livros didáticos
mostra governador pouco convicto
A administração pública de um estado
populoso e relativamente rico como São Paulo pode ser comparada a um
transatlântico. O governante, no timão, precisa planejar muito bem e com grande
antecedência as manobras relevantes que deseja fazer para que elas aconteçam
satisfatoriamente à frente.
Contrariando o histórico de aluno exemplar
das escolas por que passou na mocidade, o governador Tarcísio de Freitas
(Republicanos) demora a absorver essa lição. O que ocorreu no episódio dos
livros didáticos foi amadorismo.
Em 31 de julho esta Folha revelou que a
secretaria estadual da Educação abrira mão dos livros físicos, distribuídos
gratuitamente e custeados pelo governo federal, para alunos de 11 a 14 anos, no
ciclo final do ensino fundamental. A motivação anunciada da decisão foi a de
passar a adotar unicamente o material digital elaborado por pedagogos da
burocracia estadual.
Supõe-se que alteração com tamanho impacto,
que afetaria a rotina de 1,4 milhão de estudantes e seus mestres, haveria de
estar bem debatida e consolidada internamente. O governo deveria estar convicto
do rumo a tomar e preparado para lidar com fortes ondas de contestação,
inclusive judiciais, que decerto viriam. Não estava.
Em menos de
20 dias, tudo foi revertido como se não houvesse se passado. Bastou
a primeira liminar na Justiça para derrubar de vez a, pelo visto, fragilíssima
motivação do governador para seguir adiante com o plano. São Paulo vai aderir
ao programa do livro didático.
Está correta, ao menos em teoria, a
intenção do governador e de seu secretário da Educação, Renato Feder, de, pela
incorporação de tecnologia interativa, modernizar as aulas na rede estadual
para despertar maior interesse dos alunos.
Tampouco há debate sobre a necessidade de
assegurar a absorção por todos os estudantes dos conteúdos fundamentais para
sua idade e etapa escolar. O material didático precisa mesmo ser aperfeiçoado
para ajudar os professores a cumprirem essa missão.
O processo,
no entanto, deve ser conduzido às claras e com atenção à experiência acumulada.
Cumpre assegurar a qualidade e a eficiência das apostilas digitais ou
impressas, além de conquistar na prática a ampla adesão do corpo docente à
orientação da secretaria.
A pergunta fundamental é se abrir mão
repentinamente dos livros físicos didáticos gratuitos ajudaria, em alguma
medida importante, a alcançar esses objetivos.
A resposta é, obviamente, negativa. O
problema é o governo ter chegado a ela por meio do desgaste público, e não pela
diligente e tempestiva análise dos planos e das prioridades da gestão num
terreno tão estratégico como a educação.
Teto com furos
Folha de S. Paulo
Nova regra fiscal gera dúvidas no próprio governo
acerca de gastos com saúde
O PT e seus satélites na esquerda nacional
fizeram da oposição ao teto de gastos federais um cavalo de batalha.
Tratava-se, afinal, de um mecanismo criado para recuperar as contas públicas do
desastre provocado pela irresponsabilidade orçamentária levada ao paroxismo
pela petista Dilma Rousseff.
No afã de provar que deixava para trás o
teto, o governo Luiz Inácio Lula da Silva propôs uma nova regra de controle de
despesas, pomposamente batizada de arcabouço fiscal, mais complexa e repleta de
excepcionalidades —a ponto de a própria administração enfrentar dúvidas sobre
como colocá-la em prática, como noticiou a Folha.
Perto de ser aprovada pelo Congresso, a
norma deve forçar aumento dos desembolsos em saúde já neste ano. Isso ocorre
porque a área deixará de estar sujeita aos limites em vigor e voltará a seguir
o ditame constitucional de aplicação mínima correspondente a 15% da receita
corrente da União.
Em tese, a mudança pode significar até R$
18 bilhões além do que está previsto no Orçamento deste 2023, consideradas as
estimativas atuais de arrecadação. Se for definido que a obrigação vale
apenas para o período restante do ano, a conta cairia para R$ 6 bilhões.
Em qualquer hipótese, o governo pode ter de
obter o montante por meio de cortes politicamente dolorosos em outros setores
—porque, falatório à parte, a realidade de um Tesouro deficitário não permite
elevação geral de dispêndios.
Perdeu-se oportunidade de rever a
vinculação constitucional dos aportes em saúde e educação a percentuais fixos
da receita. As duas áreas são obviamente centrais para o bem-estar e o
desenvolvimento, mas tratar o gasto como um fim em si mesmo engessa o Orçamento
sem garantir melhoria correspondente dos indicadores.
Com o processo de envelhecimento da
população, o SUS deverá precisar de recursos crescentes nos próximos anos; o
mesmo não se dá no ensino. Nos dois casos, há que buscar aperfeiçoamento da
gestão e lidar com as severas restrições fiscais imediatas.
Melhor seria fixar metas plurianuais
realistas de resultados e despesas necessárias, em vez de apenas garantir aos
gestores um fluxo de verbas contínuo, imune a novas contingências e
prioridades.
Seja sob o moribundo teto de gastos ou o teto dissimulado da administração petista, é o esgotamento das finanças públicas que impõe manejo mais racional da despesa.
Tabagismo e câncer de pulmão
Correio Braziliense
Os cigarros eletrônicos podem ter
concentrações variadas de nicotina, elevando muito a quantidade dessa
substância no organismo
Uma série de ações promovidas por entidades
médicas, organizações não governamentais, especialistas nas áreas de doenças respiratórias,
pulmonares e até mesmo profissionais da área de psiquiatria marca este mês como
"Agosto Branco". O apelo chama a atenção para o Dia de Combate ao
Fumo (29/8), trazendo não somente informações quanto aos riscos do tabagismo,
mas também fazendo alerta para uma tendência que já se instalou no Brasil e,
pior, sem uma fiscalização rigorosa e efetiva: o cigarro eletrônico.
Antes de citá-lo, é preciso lembrar que o
cigarro – seja ele tradicional ou eletrônico – continua sendo o maior
responsável pelo câncer de pulmão no Brasil e no mundo. E não somente por esse
tipo de tumor. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), 161.853 mil
mortes poderiam ser evitadas anualmente se o tabaco fosse deixado de lado,
sendo que cerca de um terço desses óbitos são decorrentes de algum tipo de
câncer relacionado ao hábito de fumar.
O de pulmão é o segundo mais comum em
homens no mundo e o terceiro entre as mulheres, de acordo com a International
Agency for Cancer Research (Iarc), entidade ligada à Organização Mundial da
Saúde (OMS). A partir das estimativas mais atuais disponíveis (2020), são
esperados mais de 32.560 novos casos desse tipo de tumor no Brasil em 2023,
sendo 18.020 em homens e 14.540 em mulheres, o que corresponde a mais de 11% de
todos os cânceres catalogados.
E o mais triste disso é que no Brasil
apenas 16% dos casos são diagnosticados em estágios iniciais, fase em que é
possível combater eficazmente a doença. Isso evidencia a necessidade de
reforçar o conhecimento sobre os fatores de risco que podem ser modificados e
as estratégias de controle e tratamento. A compreensão dessas abordagens é
vital para melhorar as chances de sucesso no tratamento e para combater
eficazmente a doença.
Voltando ao cigarro eletrônico, quase 3 mil
pessoas foram internadas com lesões pulmonares graves atribuídas ao uso desse
dispositivo nos Estados Unidos somente entre 2019 e início de 2020. No Brasil,
ainda que a venda de vape, como é chamado popularmente, seja proibida, o uso do
cigarro eletrônico popularizou-se numa velocidade assustadora entre os mais
jovens, fascinados pelo “charme” do vapor que ele produz ou ainda pelos vários
sabores à disposição no mercado.
Os cigarros eletrônicos podem ter
concentrações variadas de nicotina, elevando muito as quantidades dessa substância
no organismo, e de outras substâncias tóxicas especialmente no pulmão. Os
especialistas alertam, inclusive, para uma possível vaporização de metais
pesados, risco que deve ser considerado.
Enfim, parar de fumar ainda é a maneira mais eficaz de prevenir-se contra o câncer de pulmão e diversos outros tumores, além de doenças cardíacas, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), pneumonia e acidente vascular cerebral (AVC), sem falar em complicações severas em fumantes que porventura foram contaminados pela covid-19.
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