O Globo
Os veículos elétricos já estão rodando por
aí, mas muito pouco no Brasil. O país está com atraso
O primeiro Orçamento preparado pelo governo
Lula para 2024 suscita, entre outras, uma pergunta: qual o objetivo principal,
o desenvolvimento econômico ou a preservação ambiental?
A verba para o Ministério do Meio Ambiente diminuiu.
E o dinheiro dos Transportes aumentou. Para obras viárias. Mais: o novo PAC
prevê investimentos de R$ 185 bilhões em rodovias. Estamos, pois, falando de
caminhões, carros e ônibus, emissores de carbono.
Sim, os veículos elétricos já estão rodando por aí, mas muito pouco no Brasil. O país está com atraso de anos na introdução deles. Nem há política consistente nessa direção. No máximo, tem-se algum esforço de produzir motores a combustão menos poluentes.
Mais ainda: o governo Lula tem planos
grandiosos para o sistema de exploração de petróleo — desde furar novos poços
até construir refinarias, navios e plataformas. De novo, emissão de poluentes.
Esses investimentos geram crescimento. Dirão: mas é desenvolvimento à moda do
passado, queimando carbono. E onde estão as medidas de desenvolvimento verde?
Isso leva a uma questão subjacente no
debate político mundo afora: há exclusão entre desenvolvimento econômico e
preservação ambiental? Esse foi o tema tratado por Tony Blair,
ex-primeiro-ministro britânico, na Conferência Internacional Amazônia e
Novas Economias, realizada na semana passada em Belém. Blair comanda hoje o
Instituto para Mudança Global, empenhado na estruturação de políticas públicas
em países emergentes, incluindo transição energética e descarbonização.
Em entrevista ao Valor Econômico, ele
sustentou que não pode, não deve ou, ainda, não deveria existir a exclusão
entre crescer e preservar. O problema, diz ele, é que não há como impedir um
país pobre de explorar suas reservas de óleo e gás. Na África, afirma, a
escolha pode ser entre gás e queimar lenha. Ou, acrescentamos nós, entre
petróleo e não crescer.
Os países ricos, já desenvolvidos, estão
muito mais avançados em programas de descarbonização. Têm dinheiro para isso,
até para desenvolver novas tecnologias. Mas mesmo esses ricos continuam
queimando óleo. Dados os parâmetros atuais, incluindo políticas de transição
energética, estima-se que o mundo estará consumindo algo como 50 milhões de
barris de petróleo por dia em 2050.
O presidente da Colômbia, Gustavo Petro,
disse outro dia, também em Belém, que os países sul-americanos deveriam deixar
debaixo da terra o petróleo que ainda não exploram. Faz sentido no plano da
preservação ambiental, mas qual o efeito para o mundo se outros países
continuarem a explorar o óleo, ganhando dinheiro com a demanda futura?
O xeque Zaki Yamani, príncipe da Arábia
Saudita, foi o inventor da Organização dos Países Produtores de Petróleo, a
poderosa Opep, lá nos anos 1960. Os países membros, nacionalizando suas
reservas, ganharam muito dinheiro da noite para o dia, os petrodólares. Formado
nas melhores universidades de Inglaterra e Estados Unidos, Yamani deixou um
legado e conselhos sábios. Disse que os países da Opep deveriam usar a riqueza
do petróleo na geração de reservas financeiras para o futuro e, sobretudo, para
desenvolver uma “economia não petróleo”. Isso porque, arrematava: a Idade da
Pedra Lascada não acabou por falta de pedra.
Quer dizer, a Era do Petróleo acabará
quando desenvolverem outras tecnologias para gerar energia eficiente,
sustentável e economicamente viável. Tony Blair chama atenção para isso. A
única maneira de escapar do dilema é pelo avanço tecnológico. Nisso, é preciso
agir em todas as direções: desde melhorar os motores a combustão até implantar
energias renováveis, hidrogênio verde e até energia nuclear. Nem todo mundo
está fazendo isso. E, olhando bem o jeitão da coisa por aqui, parece que o
governo Lula busca mesmo o crescimento à moda do petróleo.
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