Mercado de trabalho aquecido não deve trazer ilusão. Sem aumentar a eficiência, é inevitável o retrocesso
À primeira vista, o mercado de trabalho
parece estar em situação próxima do ideal. O desemprego caiu a 6,1%, menor taxa
da série histórica iniciada em 2012. O rendimento médio mensal cresceu na
comparação com o ano passado, tendência idêntica à observada nos empregos com
carteira assinada. A informalidade e a proporção dos que desistiram de procurar
trabalho registram quedas. Na superfície, o quadro é positivo. Um olhar mais
atento, porém, mostra que todos esses avanços correm o risco de retrocesso.
O problema é a baixa produtividade por hora trabalhada, que cresceu mero 0,1% no terceiro trimestre, na comparação com mesmo período de 2023, segundo dados do Observatório da Produtividade Regis Bonelli. Com o impulso da agropecuária, o ano passado registrara crescimento de 2,3%. Mas o setor perdeu força neste ano, e a produtividade passou a depender mais do setor de serviços, notório no Brasil pela baixa eficiência. “Observando o crescimento desde o último trimestre de 2019 até o terceiro trimestre deste ano, a produtividade está 2% acima do nível pré-pandemia. Mas o crescimento está perdendo vigor”, diz a economista Silvia Matos, do Instituto Brasileiro de Economia (FGV Ibre). Sem aumentar a produtividade do trabalho, a economia como um todo não tem como recuperar eficiência. Isso pode pôr a perder todas as conquistas registradas nos últimos anos.
O descompasso entre mercado de trabalho
aquecido e produtividade que não aumenta de forma significativa é a receita
para o desastre. Como ensina o passado, a baixa taxa de desemprego incentiva
empregados a pressionar por aumentos salariais. Mas, como não produzem mais
para justificá-los, o movimento provoca distorções de todo tipo. A pior delas é
a inflação. Nessa situação, o sonho de manter a atual taxa de crescimento da
economia, com todos os seus efeitos positivos, se transforma em pesadelo.
Dado o peso do tema, governos de todas as
esferas deveriam lhe dar mais atenção. Há melhorias a fazer em diferentes
frentes. A mais óbvia é na qualidade da educação. A cobrança maior nesse item
recai sobre governadores e prefeitos. Nas últimas três décadas, o Brasil
desenvolveu índices para medir o desempenho de alunos e professores e houve
experiências de sucesso em várias partes do país. Com a ajuda do governo
federal, estados e cidades que puxam a média nacional para baixo precisam
trabalhar para virar o jogo.
Também é preciso fazer mais para quem saiu da
escola e está prestes a entrar no mercado de trabalho e para quem já está
empregado há anos. Aperfeiçoar programas de treinamento é essencial para que a
força de trabalho possa atender às demandas das empresas numa economia em
mutação. Outra preocupação é incentivar um casamento mais eficaz entre
profissionais e vagas. Empregados qualificados em funções triviais não resultam
apenas em insatisfação com o salário. São uma chance desperdiçada de aumentar a
produtividade em qualquer outra atividade para a qual suas habilidades se
prestem melhor. Como disse ao
GLOBO Naercio Menezes Filho, economista especializado em
mercado de trabalho e educação do Insper, não há como melhorar a vida dos
pobres de forma contínua sem aumentar a produtividade.
Acidentes põem em xeque formação de pilotos e
infraestrutura aeronáutica
O Globo
Brasil registrou 148 mortes em desastres
aéreos em 2024, pior número nos últimos dez anos
A queda de um avião da Embraer com 67 pessoas
no Cazaquistão voltou a pôr em evidência a segurança da aviação brasileira. A
tragédia foi atribuída a uma fatalidade —disparos da artilharia russa ao
confundir a aeronave com drones ucranianos. Outros desastres recentes, porém,
despertam preocupação com o despreparo dos pilotos e a infraestrutura
aeronáutica aqui no Brasil.
Em Gramado, no Rio Grande do Sul, um bimotor
a hélice Piper caiu neste mês, matando dez pessoas e deixando 17 feridos. Foi,
segundo o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos
(Cenipa), o 41º acidente com mortos no ano, entre 168 registrados, o pior
resultado desde 2014. Mais da metade desses acidentes ocorreu na aviação
privada. Em 2024, as mortes em desastres aéreos no Brasil somaram 148, 92%
acima de 2023. É como se um Boeing 737 lotado tivesse caído.
Acidentes aeronáuticos ocorrem por uma
coincidência infeliz de eventos, um encadeamento de falhas humanas e técnicas.
As causas preponderantes dos últimos acidentes têm sido alterações climáticas
repentinas, somadas a deficiências na formação de pilotos e a gargalos na
infraestrutura aeronáutica. Como a quantidade de voos e passageiros cresceu na
esteira da economia aquecida, as falhas aumentaram. A formação de pilotos no
Brasil não tem conseguido acompanhar o crescimento da demanda com o mesmo
padrão de qualidade.
O desastre em Gramado foi o segundo mais
grave de 2024 e o maior envolvendo um avião de pequeno porte. O pior em número
de vítimas foi a queda de um voo regular da VoePass em Vinhedo (SP), no mês de
agosto, que deixou 62 mortos. Em ambos os casos, as condições atmosféricas
contribuíram para o desastre. No relatório preliminar sobre a queda em Vinhedo,
o Cenipa concluiu que os pilotos tinham treinamento adequado para lidar com o
acúmulo de gelo que, segundo a investigação, foi a causa provável da queda.
As exigências de formação de pilotos na
aviação comercial são mais rígidas que as vigentes na aviação privada. Pela
lei, são necessárias 150 horas de voo para a habilitação. O gasto com formação,
incluindo mensalidades no curso de graduação em ciência aeronáutica e cursos
práticos em escola homologada pela Anac, não fica abaixo de R$ 400 mil, na
estimativa de Lucas Fogaça, coordenador do curso de ciências aeronáuticas da
PUC do Rio Grande do Sul.
Em Gramado, a aeronave era pilotada pelo
próprio dono, que não era piloto profissional. O acidente ocorreu de manhã, no
horário mais crítico de nebulosidade, fenômeno que tem ficado mais intenso nos
últimos dez anos no Sul e no Centro-Sul, devido ao aquecimento do Oceano
Atlântico. As más condições atmosféricas exigem dos pilotos qualificação para
voar por instrumentos e para lidar com situações inesperadas. Mas nem sempre
eles estão preparados. As estatísticas de 2024 demonstram que é necessária
vigilância mais atenta sobre a formação de pilotos, sobretudo os que operam na
aviação privada.
SP faz revisão correta de benefícios
tributários
Folha de S. Paulo
Um terço de 263 benesses será eliminado ou
reduzido; todo o país precisa cortar renúncias, que chegam a 6,9% do PIB
Ainda que pudesse ser até mais ambicioso, é
meritório o plano do governo paulista para eliminar benefícios fiscais e
racionalizar a máquina pública, incluindo privatizações.
Com revisão ampla, que ainda prosseguirá nos
próximos meses, o Executivo estadual promete cortar ou reduzir um terço das 263
benesses mapeadas, a maioria atrelada ao ICMS —imposto a ser gradualmente
extinto com a reforma tributária. Já as renovações serão válidas até 2026,
quando haverá nova análise.
Os cortes nas renúncias fiscais terão impacto
significativo, calculado em
R$ 10,3 bilhões no próximo ano, um naco relevante do total estimado
em R$ 70,7 bilhões. O valor exato do que entrará para os cofres estaduais é
incerto, pois a mudança dos benefícios tende a alterar comportamentos nos
setores atingidos.
Espera-se, mesmo assim, que haja aumento da
arrecadação, tendo em vista os critérios adotados na revisão. A análise de
custo-benefício dos programas teve como um dos focos a origem de bens e
serviços no estado, buscando eliminar renúncias que beneficiassem outras
regiões ou mesmo importações.
Houve concessões em áreas de maior impacto
para o consumidor, caso de bares e restaurantes. Aí, a proposta original do
governo Tarcísio de
Freitas (Republicanos) era elevar a alíquota de ICMS de 3,2%
para 12%, mas o aumento foi bem menor, para 4%, após negociações com o setor.
É correto reduzir progressivamente as
distorções nos próximos anos, tendo em vista a entrada em vigor da reforma que
muda a taxação dos bens e serviços —de modo a instituir regras mais uniformes e
acabar com a nefasta guerra fiscal, pela qual estados disputam investimentos
concedendo vantagens que distorcem a alocação de recursos, comprometendo a
eficiência econômica.
Na mesma direção, o governo paulista pretende
economizar outros R$ 10 bilhões com extinção de órgãos, remanejamento de
funcionários e cortes de custos em geral. Abrir espaço no Orçamento para
investimentos deve ser um trabalho permanente.
No caos tributário brasileiro, rever
subsídios em favor de grupos influentes é tarefa politicamente difícil. Estudo
elaborado pela Fundação Getulio Vargas e pelo Tax Expenditures Lab estima que a
renúncia provocada por regras especiais deve chegar a
exorbitantes 6,9% do Produto Interno Bruto neste 2024 —e isso
porque a conta não inclui os impostos municipais.
Desse total, 4,5% do PIB dizem
respeito à União, e o governo Luiz Inácio Lula da
Silva (PT)
mal consegue levar adiante até propostas modestas de revisão.
As contas do estado de São Paulo estão
em situação relativamente boa, com superávit primário (sem contar gastos com
juros) de R$ 6,6 bilhões em 2023 e R$ 5,4 bilhões no primeiro semestre deste
ano. A revisão de benefícios não deve ter objetivo meramente arrecadatório, mas
visar a simplificação e a equidade tributária.
Incertezas na Síria após os horrores de Assad
Folha de S. Paulo
Dada a orientação radical do novo poder,
retórica de seu líder não dirime dúvidas sobre direitos de mulheres e minorias
A queda da ditadura de Bashar
al-Assad na Síria, em 8 de
dezembro, poderia ter sido celebrada como marco da pacificação
interna e da construção de um Estado cioso do respeito aos direitos
humanos. Ainda não foi o que aconteceu.
O fim do regime atroz deu lugar ao domínio da
Organização para a Libertação do Levante (HTS, na sigla em árabe) —antigo braço
do terrorismo da Al Qaeda alimentado
por facções extremistas.
Devastada por 13 anos de violenta guerra
civil, a Síria corre risco de subordinar-se a outra ditadura; desta vez,
baseada no fundamentalista islâmico.
As declarações apaziguadoras do líder da HTS
e do novo governo, Ahmed al-Sharaa, ex-militante da Al Qaeda, não chegam a
dirimir as dúvidas sobre o destino do país. Ele prometeu uma gestão interina,
de reconstrução nacional, sem revanchismo e com orientação laica e respeitosa
às minorias étnicas e religiosas.
Além disso, já deu início à transição
administrativa com as autoridades remanescentes do governo de Assad e negociou
a submissão das diferentes facções armadas da HTS ao Ministério da Defesa, para
evitar a eclosão de novos conflitos.
Tais passos indicam certa dose de pragmatismo
da organização, que se consolidou pelas armas como força política dominante.
Entretanto as mais recentes decisões estão longe de convencer países do
Ocidente, cautelosos em reconhecer o novo governo e apagar a classificação da
HTS como agrupamento terrorista.
A incerteza mais preocupante diz respeito ao
grau de laicidade do Estado e de respeito aos direitos de mulheres e minorias.
A orientação fundamentalista dos governos locais instalados até agora pela HTS,
em seu rastro bélico até Damasco, contradiz a retórica de al-Sharaa, como
mostrou a reportagem da Folha no país.
Na cidade de Idlib, há sete anos a Justiça
islâmica vigora em paralelo à civil. Embora nenhuma lei tenha sido
ditada, mulheres
preventivamente trajam-se com o niqab, vestimenta que deixa apenas
os olhos descobertos, e estão apartadas de cargos públicos. Em universidades e
hospitais, impera a separação de gênero.
Da mesma forma, o destino das minorias e a
capacidade da HTS de lidar com potenciais opositores políticos estão em aberto.
As prometidas eleições em 2025 darão maior
clareza sobre os rumos de Damasco. Neste momento, há pelo menos duas certezas:
a HTS não abandonará facilmente o poder, e tudo que o que o povo sírio não
merece é mais um regime que solapa direitos humanos e liberdades individuais.
Ética ‘à la carte’
O Estado de S. Paulo
Comissão de Ética da Presidência formada por
Lula expõe os pesos e medidas lulopetistas, fazendo vista grossa a desmandos de
companheiros e apurando com lupa condutas de adversários
O presidente Lula da Silva já disse, a
propósito do regime do companheiro Nicolás Maduro na Venezuela, que a
democracia é relativa. Por que não a ética? De fato, Lula parece tão afeito à
relatividade que até a moral, para ele, é relativa. Para o lulopetismo, certo e
errado podem ser relativos, mas há um princípio absoluto, um valor inegociável:
impunidade para os companheiros, revanche para os adversários. É o que se
depreende da atuação da Comissão de Ética Pública da Presidência formada pelo
demiurgo petista à sua imagem e semelhança.
A Comissão é um órgão consultivo da
Presidência da República criado em 1999 para resguardar o interesse público,
blindando processos decisórios no âmbito do Executivo contra a contaminação de
interesses privados.
Como tal, a isenção deveria ser o requisito
básico para a indicação de seus sete conselheiros, e a imparcialidade, a regra
número 1 a nortear as suas decisões, sempre priorizando os interesses de Estado
acima dos interesses do governo, e os interesses do governo acima dos
interesses do partido. Como se sabe, o lulopetismo observa rigorosamente essa
hierarquia – só que de cabeça para baixo.
Essa é só uma das práticas que tornam Lula
tão parecido com seu antípoda, Jair Bolsonaro. O ex-presidente, como se sabe,
abastardou a Comissão, indicando conselheiros que favoreceram seus ministros,
por exemplo, liberando-os da quarentena regulamentar para exercerem atividades
na iniciativa privada que mantinham relação com seus antigos cargos.
Lula, no início de seu governo, destituiu
metade dos Conselheiros indicados por Bolsonaro, rompendo a praxe pública, já
que eles teriam mandato até 2025, mas mantendo a praxe bolsonarista – os novos
indicados, três deles advogados de Lula, tinham como credencial mais vistosa a
lealdade canina ao petista. Desde então, a Comissão aplicou 10 punições a 5
ex-ministros de Bolsonaro, e arquivou todos os 21 processos contra 17 ministros
de Lula.
O ex-ministro do Meio Ambiente e hoje
deputado federal Ricardo Salles (PL-SP), por exemplo, foi corretamente
censurado por custear com dinheiro público viagens em voos de carreira sem
agenda oficial. Mas a mesma Comissão não viu problema no uso de aviões da Força
Aérea Brasileira (FAB) pelo ministro das Comunicações, Juscelino Filho, para,
por exemplo, ir a um leilão de cavalos. A propósito, a Comissão também não
ergueu uma sobrancelha ao gabinete paralelo franqueado por Juscelino ao sogro,
Fernando Fialho, para receber empresários e despachar junto a aliados no
Ministério das Comunicações.
O ex-ministro da Educação Abraham Weintraub
recebeu três punições, uma delas por chamar Paulo Freire, um pedagogo
sacrossanto para a esquerda, de “feio”, “fraco” e “energúmeno”. Já Gilson
Machado, ex-titular do Turismo, foi penalizado por chamar Lula de “safado,
ex-presidiário e cachaceiro”. Aparentemente, isso é mais grave do que imputar o
pior dos crimes, o genocídio, como os lulopetistas e o próprio grande líder
fazem recorrentemente a Bolsonaro e seus correligionários.
Outro caso arquivado pela Comissão foi o do
ministro-chefe da Controladoria-Geral da União, Vinícius Marques de Carvalho.
Carvalho está licenciado de seu escritório de advocacia, hoje conduzido por sua
namorada. Ainda assim, não parece ser menos reprovável que ofensas escolares o
fato de esse escritório ter recebido valores da empreiteira Novonor (antiga
Odebrecht) para atuar no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Hoje, quatro dos sete membros da Comissão,
incluindo seu presidente, são ligados ao grupo de juristas lulopetistas
Prerrogativas, que já emplacou dezenas de nomeações não só no Executivo, mas em
tribunais superiores e regionais ou autarquias. Além de conduzir uma comissão
informal a serviço de Lula e promover pajelanças, como a que consagrou a
primeira-dama Janja da Silva como “guerreira do povo brasileiro”, o “Prerrô”,
como é carinhosamente chamado, também se dedica a editar livros. Um deles, um
certo Livro das Parcialidades, denuncia uma “saga ou um folhetim, com
capítulos novos a cada semana”. Pelo jeito, a saga continua.
A espiral explosiva da dívida
O Estado de S. Paulo
IFI estima que estabilização da dívida exige
superávits primários de 2,4% ao ano; sem compromisso fiscal firme, dívida do
governo chegará a 116,3% do PIB em 2034
A Instituição Fiscal Independente (IFI) do
Senado projetou, em sua última edição do Relatório de Acompanhamento
Fiscal, que a tendência de aumento da Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) é
bem mais acentuada que aquela estimada pelo Tesouro Nacional, e que superávits
primários de 2,4% ao ano seriam necessários para que a relação dívida/PIB se
estabilize no patamar de 2023 (73,8%).
Em junho de 2024, a mesma IFI havia calculado
que, para estabilizar a dívida, seriam necessários superávits primários da
ordem de 1,4% ao ano, ou seja, em um curto espaço de tempo, as condições do
endividamento público agravaram-se de forma expressiva.
De acordo com o órgão vinculado ao Senado, a
DBGG deve encerrar 2024 em 78,3% e seguirá subindo nos dois últimos anos do
atual mandato de Lula da Silva: para 81,4% em 2025 e para 86,3% em 2026.
Embora o próprio Tesouro, em seu Relatório
Fiscal, aponte para a piora dos níveis de endividamento, a projeção de patamar
da DBGG em 77,7% do PIB para 2024 é inferior à da IFI. Além disso, o cenário
traçado pelo Tesouro pode ser mais róseo que a realidade, uma vez que tomou por
base, por exemplo, uma Selic média de 10,7% em 2025, que, além de inferior à
taxa atual de 12,25%, ignora a sinalização do próprio Comitê de Política
Monetária (Copom) de que promoverá mais duas elevações, de 1 ponto porcentual
cada uma, nas reuniões agendadas para janeiro e março de 2025.
Sem compromisso fiscal firme – e o
desidratado pacote aprovado pelo Congresso no apagar das luzes de 2024 mostra
isso –, a DBGG alcançará alarmantes 116,3% do PIB no cenário base da IFI para
2034, um incremento de quase 16 pontos porcentuais em relação ao relatório de
junho da própria instituição.
As projeções, das mais amenas às mais
preocupantes, convergem em um ponto: a trajetória da dívida do governo é
explosiva e precisa ser encarada com firmeza, o que exige que o governo Lula da
Silva realmente se empenhe em apresentar propostas que revertam o descontrole
nas contas públicas.
No cenário atual, já incorporado o tímido
pacote fiscal, a IFI projeta déficit primário de 0,4% do PIB em 2024 e de 0,7%
do PIB em 2025. A partir de 2026, as perspectivas tornam-se sombrias. De 2026
em diante, os déficits tendem a se agravar consideravelmente, chegando a 1,6%
do PIB em 2032.
Não à toa, o debate sobre dominância fiscal,
quadro em que a política monetária perde eficácia no combate à inflação, ganhou
corpo nas últimas semanas do ano. Embora, de um modo geral, economistas avaliem
que a situação ainda seja não tão grave, há sinais de alerta. Apesar de o Copom
ter indicado que será agressivo contra a inflação, as expectativas cambiais e
inflacionárias seguem piorando, o que só reforça a necessidade de um ajuste
fiscal contundente.
Não há sinais, contudo, de que o Executivo vá
se empenhar neste sentido. O presidente Lula, que afirma que jamais houve
alguém com mais responsabilidade fiscal que ele, é o primeiro a sabotar os
esforços de seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em intermináveis
provocações ao mercado financeiro, o vilão ideal do lulopetismo.
Também é preocupante que o próprio Haddad, ao
comentar a aprovação do pacote, tenha afirmado que as medidas encaminhadas ao
Congresso não foram desidratadas e que havia a expectativa que houvesse o que
chamou de “hidratação” (medidas de ajuste mais contundentes) na apreciação das
medidas pela Câmara e pelo Senado.
Ora, não é segredo para ninguém, e o
Congresso não tem desapontado em dar demonstrações disso, que os parlamentares
não estão preocupados com a sustentabilidade fiscal do País, e sim com a
manutenção de emendas de caráter eleitoreiro.
Tampouco adianta, especialmente após toda a
frustração gerada com a apresentação do pacote recente, afirmar que novas
medidas de ajuste serão apresentadas ao longo de 2025. Ou Lula, seus ministros
e o PT se comprometem com um ajuste de fato, e deixam de sabotar o visivelmente
exausto Haddad, ou a dívida, num horizonte não tão longínquo, superará com
folga os 100% do PIB.
2024, o ano mais quente
O Estado de S. Paulo
Observatório Copernicus crava marca
preocupante, mas ainda é possível conter ameaças
O ano de 2024 será o mais quente já
registrado na história da humanidade e o primeiro a ultrapassar o limite de
aquecimento de 1,5°C estabelecido pelo Acordo de Paris, em 2015, segundo o
Observatório Copernicus. Esse número não é aleatório. É o quanto o mundo pode
aquecer até o fim deste século em relação ao período pré-industrial de modo a
evitar os efeitos mais catastróficos das mudanças do clima.
Depois de 2023 alcançar o recorde de
temperatura média de 14,98°C, e 1,48°C acima do limite do Acordo de Paris, não
há mais dúvida entre os cientistas do observatório da União Europeia de que a
marca será superada. Ao contrário: após o mês passado ser o segundo novembro
com as temperaturas mais altas da série, “há certeza de que 2024 será o ano
mais quente”, disse o relatório do Copernicus.
A superação de recordes em série já ameaça o
presente. Os números revelam um cenário alarmante, em que pesem os reiterados
avisos de estudiosos sobre a necessidade de medidas concretas para reduzir as
emissões de gases do efeito estufa. Hoje o mundo assiste a uma sucessão de
tufões na Ásia e de secas severas na África Austral e na Amazônia.
Eis um problema que atinge o Brasil
diretamente e o chama a assumir suas responsabilidades, além da retórica, na
colaboração efetiva para a redução da temperatura do planeta. Foi a seca que
gerou as condições para a recente disseminação de incêndios pelo País,
associada à inépcia do governo Lula da Silva ao enfrentá-los.
Mas nem tudo está perdido. De acordo com
especialistas, o recorde de calor em 2024 não representa a irreversibilidade da
meta do Acordo de Paris. Segundo um relatório recente do Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), ainda é possível atingir essa marca,
embora a tarefa venha se tornando cada vez mais difícil.
O documento destacou a importância do
engajamento do G-20, o clube dos países com as maiores economias do mundo, para
que as emissões sejam reduzidas. Na Conferência do Clima (COP-29), em Baku, no
Azerbaijão, ficou decidido que as nações mais ricas destinarão US$ 300 bilhões
por ano até 2035 para que os mais pobres enfrentem as mudanças do clima. Um
passo importante foi dado, apesar das lamúrias de ambientalistas.
No encontro dos líderes do G-20 realizado no
Rio de Janeiro, o presidente Lula da Silva disse que a COP-30, em Belém, em
2025, é a “última chance de evitar uma ruptura irreversível no sistema
climático”. Os desafios são imensos, de fato. A começar por colocar a casa em
ordem, promover uma política ambiental além do discurso e cumprir com rigor as
metas de redução de gases de efeito estufa com as quais o Brasil se
comprometeu.
Do ambiente externo, a crise do multilateralismo, a volta do negacionista Donald Trump à Casa Branca e uma Europa sob constante ameaça de uma extrema direita avessa à pauta ambiental representam mais dificuldades para a Cúpula do Clima de Belém. Lula da Silva e seu governo terão muito trabalho diplomático se estiverem de fato interessados em posicionar o Brasil na vanguarda do clima.
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