Folha de S. Paulo
Livro sobre IA diz que devemos tratá-la como
a um humano, o que significa sempre considerar a possibilidade de que esteja
mentindo
"Co-Intelligence", de Ethan Mollick, não é um livro pretensioso. Ele se propõe
a fazer uma apresentação de nível bem introdutório da inteligência
artificial (IA) e a dar dicas práticas de como utilizar
ferramentas como o ChatGPT e
seus concorrentes.
Devo confessar que minha reação inicial à leitura não foi das mais favoráveis.
O pouco espaço dedicado a questões teóricas me incomodou. O nome de Claude Shannon é mencionado uma única vez e bem "en
passant". Idem para Von Neumann.
Dos grandes teóricos, só Turing recebe um número mais generoso de citações, mas
principalmente por causa do teste que leva seu nome. Pareceu-me pouco para um
texto escrito por um professor da UPenn, mesmo considerando que ele venha da
escola de negócios (Wharton) e não do departamento de ciências da computação.
Aos poucos, porém, a obra de Mollick foi me ganhando, justamente pela abordagem
pé no chão. Um dos pontos em que ele insiste é que precisamos tratar a IA como
trataríamos um ser humano, o que inclui sempre considerar a possibilidade de
ela estar mentindo.
Ainda que versões futuras das ferramentas venham a reduzir a
frequência das chamadas alucinações das IAs, elas não desaparecerão. Se fossem
eliminadas, os programas se tornariam máquinas de gerar platitudes previsíveis.
O que torna as IAs capazes de produzir pensamento criativo e insights valiosos
é justamente o elemento aleatório que está na base das alucinações. Inovar em
muitos casos é combinar de forma inesperada coisas já conhecidas.
Gostei particularmente das reflexões de Mollick sobre o futuro do trabalho. A
IA aumenta a produtividade, mas o faz de modo assimétrico. Quem já era bom não
ganha tanto utilizando as ferramentas, mas os que eram medíocres ou ruins
melhoram consideravelmente. Se essa tendência se consolidar, podemos esperar
mudanças mais profundas na sociedade. A educação perderá valor.
O autor também traz boas ideias sobre como avaliar trabalhos de alunos, uma
área que já foi totalmente transformada pela IA, e sugestões de como melhorar
seus prompts no GPT.
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