O Estado de S. Paulo
Mesmo que o governo utilize todos os subterfúgios legais, o rombo é estimado em R$ 44,9 bilhões
O prazo para o Poder Executivo apresentar a
proposta orçamentária de 2026 está se aproximando. A Constituição determina que
o Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) seja enviado até o dia 31 de agosto.
Nossas projeções, na Warren, indicam um déficit superior a R$ 100 bilhões. A
meta estipulada é um superávit de R$ 34,5 bilhões.
Na prática, o governo pode retirar da meta fiscal, para fins de checagem legal, certas despesas com precatórios, o que lhe confere uma folga de R$ 55,1 bilhões. Mesmo assim, ainda faltariam R$ 79,4 bilhões (100 + 55,1 - 34,5) para o alcance do superávit proposto no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO).
Durante a execução do Orçamento, tem-se
adotado o piso da meta fiscal como referência. Para 2026, a meta é R$ 34,5
bilhões, e essa banda inferior é igual a zero. Permite-se, legalmente, a
entrega de um resultado menor. Neste caso, o buraco de R$ 79,4 bilhões
diminuiria para R$ 44,9 bilhões.
Antes de prosseguir, vamos ter clareza sobre
o que está em jogo. Mesmo que o governo utilize todos os subterfúgios legais –
desconto de R$ 55,1 bilhões em precatórios e banda inferior da meta fiscal –, o
rombo é estimado em R$ 44,9 bilhões.
Ocorre que, na etapa de apresentação da
proposta orçamentária, é impossível trabalhar com a banda inferior. Trata-se de
uma questão de lógica pura. As bandas propostas pela Lei Complementar n.º 200/2023,
mais conhecida como novo arcabouço fiscal, servem para acomodar choques. Ora,
por definição, choques são eventos não previsíveis, que pegam os gestores da
política fiscal de surpresa.
Como, então, de saída, fundamentar o
planejamento orçamentário do Ploa na banda inferior? Choques imprevisíveis
seriam estimados? Até para nossos padrões históricos de criatividade, isso
seria inusitado. Logo, não há saída para o governo, no dia 31, a não ser
apresentar um Ploa com receitas suficientes para, ao menos no papel, garantir
um resultado compatível com o superávit de R$ 34,5 bilhões.
Esse resultado mínimo é calculado em -R$ 20,6
bilhões. Vale dizer, para garantir um superávit de R$ 34,5 bilhões, no papel, o
déficit de R$ 20,6 bilhões mostra-se adequado, dado o desconto dos precatórios
(34,5 - 55,1). Tomando como base o nosso cenário na Warren, que indica um
déficit na casa dos R$ 100 bilhões, o desafio do governo, na construção do
Ploa, seria encontrar receitas à altura dessa diferença: R$ 79,4 bilhões.
Alguém poderia aventar que as despesas
discricionárias seriam reduzidas, já no Ploa, resolvendo a questão. Mas isso é
inviável. Se o ajuste recaísse sobre elas, o nível de despesas dessa natureza,
essenciais ao funcionamento da máquina, dado ainda o fato de que estão
espremidas por mais de R$ 50 bilhões em emendas parlamentares, levaria à
paralisação da máquina pública.
Resta, portanto, buscar receitas como se não
houvesse amanhã. A estratégia, similar à que se adotou para o Ploa de 2025, não
é boa. Cria-se uma peça orçamentária alicerçada em fumaça, ou seja, em
arrecadação que não existe, mas tem alguma probabilidade de acontecer.
Os candidatos a assumir esse papel de inchar
o Ploa e garantir a meta, no papel, são: a medida provisória que promove
majoração na tributação de títulos isentos; o corte de benefícios tributários
(ainda não há proposta do governo, mas há projeto em tramitação); e as receitas
do petróleo derivadas de antecipações.
Como se vê, é tudo muito frágil. A
alternativa seria a alteração da meta fiscal. O governo parece não gostar dessa
saída, preferindo jogar o problema para o próximo ano. O risco dessa escolha é
gerar ruídos nos dois momentos: agora, porque todos vão olhar com lupa o Ploa e
criticar a superestimativa de receitas e, depois, quando, no momento de
apresentar o primeiro relatório bimestral do Orçamento, no final de março,
opte-se pela mudança da meta já com o ano em curso.
É compreensível que a equipe econômica faça
uma aposta dessa natureza, até porque há ainda muitas possibilidades de ganhos
de arrecadação por meio dos projetos em tramitação no Congresso, como
mencionei. Ao mesmo tempo, uma política fiscal dependente de tantos fatores
incertos é, no mínimo, precária. O Congresso não apoia as iniciativas enviadas
pelo Executivo para conter gastos, tampouco acena com tesouradas nas suas
emendas.
O fato é que 2027 já bate à porta. Mesmo que
se resolva o problema de 2026 com receitas adicionais e algum ajuste na meta
fiscal, a dívida pública continuará crescendo em proporção do PIB, para
pressionar os juros e reduzir as perspectivas de crescimento. Além disso, as
despesas discricionárias caminham para níveis tão baixos que, invariavelmente,
o vencedor das eleições, em outubro do próximo ano, não conseguirá escapar de
uma proposta de ajuste estrutural.
Esse pacote para 2027 teria de avançar sobre:
indexações, vinculações, emendas parlamentares, supersalários, previdência
(civis e militares), subsídios financeiros e creditícios e gastos tributários.
Sem um pacote completo, vamos direto para o vinagre. •
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