Folha de S. Paulo
Pode-se projetar em 72% a chance de reeleição
do presidente combinando-se histórico de intenções de voto com outros dados
Cenário em que três nomes alcançam dois
dígitos dos votos parece ser o mais provável para 2026
O mercado norte-americano de apostas
eleitorais movimentou na eleição de Trump no ano passado cerca de US$ 3,5 bilhões.
Antecipar o futuro sempre foi obsessão humana. Das adivinhações à astrologia,
das profecias às projeções científicas, o percurso de milênios convocou nossa
curiosidade insaciável para prevenir tragédias, vencer guerras e planejar o
porvir. Desde que as urnas se tornaram sucedâneas das disputas sanguinolentas
pelo poder, atraem igual fascínio. Isso explica o volume de análises sobre a
sucessão presidencial de 2026.
Doravante, o número de levantamentos
crescerá, impulsionado por interesses diversos, atentos às oscilações do humor
popular, mesmo antes de conhecido o elenco completo de competidores. Os
institutos testam múltiplas listas, enquanto potenciais candidatos e dirigentes
partidários insinuam ou desmentem pretensões. Multiplicam-se, fato novo, as
manifestações de pretendentes a vice, lembrando o tempo em que concorriam em
faixa própria, e não anexados aos titulares.
Mais uma vez, as sondagens funcionarão como corrimão seguro a guiar imprensa, campanhas e cidadãos através da névoa em que se misturam informação e desinformação. O certo é que o bailado dos números não cessará até o grande dia. Ainda assim, a tentação de vislumbrar o desfecho permanece irresistível.
Com base nas 13 competições realizadas desde
1945 —4 no ciclo democrático pré-64 e 9 na Nova República—
é possível identificar padrões com razoável consistência. O primeiro diz
respeito à configuração do confronto. Em cerca de 70% dos casos, três nomes
alcançaram dois dígitos, formando cenários triangulares. Esse parece ser o
formato mais provável em 2026, já que o duelo bipolar de 2022 não se repetirá,
e haverá mais de um postulante à direita.
Outra questão: a possibilidade de vitória em
turno único parece reduzida, apenas 23%. Lula jamais
ultrapassou a metade dos votos válidos, ainda que tenha chegado perto em 2006 e
2022. Só dois o fizeram: Eurico Dutra (recordista com 55%) e FHC, em suas duas
conquistas consecutivas.
Quanto à média histórica dos vencedores na
primeira rodada, o índice gira em torno de 47%. Excluindo-se 1989, a mais
fragmentada, sobe para 48%. Com variações inferiores a dois pontos, é esse o
valor modal dos resultados. Cinco das seis jornadas eleitorais deste século
confirmando o padrão. Assim, quem prevalecer em 2026 deverá situar-se próximo
dessas marcas.
Por fim, a questão mais complexa: quais as
perspectivas de Lula? Restringindo-nos necessariamente à Nova República,
observa-se que a taxa de continuidade atual —75%— é um parâmetro limitado, pois
repousa sobre apenas quatro casos. Tampouco convém comparar com experiências
estrangeiras dadas as diferenças significativas. Melhor observar as intenções
de voto um ano antes do pleito —em 6 das 9 vezes o líder inicial acabou
vitorioso. E combiná-las a dados de aprovação governamental, expectativas sobre
a economia e projeções do mercado de variáveis-chave —PIB, inflação e
desemprego— para o próximo ano.
Considerando esses fatores, com sinais
macroeconômicos relativamente benignos, nosso modelo parcimonioso com regressão
logística bayesiana, embora sensível à curta série histórica, indica uma
projeção preditiva e atualizável de 72% de chances de reeleição do incumbente.
Que se ajustará à medida que novas evidências empíricas surjam. Se o quadro
econômico escorregar e simultaneamente ocorrerem eventos políticos disruptivos,
a balança pende para a oposição. Do mesmo modo, estabilidade e crescimento
reforçam a posição do presidente.
Lembrando que probabilidades não são
vaticínios. Sempre é bom ouvir o recado de Shakespeare: "Nunca chame de
impossível o que apenas improvável lhe parece". O que foi didaticamente
ilustrado na primeira corrida presidencial de Trump, quando o reputado site
americano de prognósticos FiveThirtyEight lhe atribuía na véspera chances de
apenas 28%.
*Cientista político, é sociólogo do Ipespe e
presidente de honra da Abrapel (Associação Brasileira de Pesquisadores
Eleitorais
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