DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Luiz XIV uma ova. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é muito mais. O rei francês nunca administrou as maiores empresas de seu país nem se candidatou à própria sucessão. O presidente Lula tem feito isso e muito mais. Suas atividades múltiplas eram conhecidas, mas ele, talvez por modéstia, só agora decidiu reconhecer publicamente a extensão de seus esforços. Na semana passada, ele confirmou um fato sabido há muito tempo, mas por ele tratado com discrição até recentemente: a Petrobrás é comandada de seu gabinete. Poucos dias depois, uma nova confissão: é ele o real candidato do PT à Presidência da República.
Ao tornar público esse dado, ele desfez uma expectativa suscitada pelos discursos de dona Dilma Rousseff. Agora todos sabem: dona Dilma não será a primeira mulher na Presidência do Brasil, mesmo se eleita. Para isso ela precisaria existir, mas não existe, segundo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
É apenas um nome para preencher um espaço numa cédula, de acordo com a explicação fornecida por ele mesmo, em discurso na convenção do PT. "Eu mudei de nome", confessou.
A figura rotulada como Dilma Rousseff permaneceu calada, como seria de esperar, no caso de uma personagem fictícia, de uma boneca ou, talvez, de um ectoplasma produzido por um médium. Quando falou, gastou muitas palavras para elogiar Lula. Foi o único detalhe feio dessa história. Como ela não é mais do que uma projeção dele mesmo, as lindas palavras sobre Lula não foram, afinal, mais que um autoelogio. A modéstia deve ter acabado, mas também isso parece natural, depois da tentativa de mediar o conflito entre israelenses e palestinos.
A explicação sobre quem manda na Petrobrás foi dada em Natal, na quarta-feira passada. Segundo o presidente, a diretoria da estatal não queria saber de refinarias novas. A capacidade produtiva das atuais era considerada suficiente. Mas a palavra final não cabe a esses diretores. É prerrogativa do presidente da República. A construção de refinarias novas no Nordeste resulta de "uma decisão de governo", de acordo com Lula. Ele poderia ter usado uma linguagem mais simples e mais direta: decisão dele mesmo seria uma boa descrição. A condição da Petrobrás como empresa de capital aberto, com ações negociadas no Brasil e no exterior, parece fazer pouca ou nenhuma diferença para o presidente Lula, ou Dilma, ou Lula-Dilma. De fato, nada parece fazer diferença, além de seu projeto de poder.
Nesse projeto, o partido tem obviamente uma função apenas instrumental.
Os demais candidatos à Presidência da República devem ao presidente Lula um favor, pelo esclarecimento oficial de alguns pontos: a campanha é plebiscitária, sim, porque envolve uma disputa direta entre o atual governante e todos os demais. É preciso escolher entre a continuidade do governo de hoje e qualquer outra possibilidade, baseada ou não em experiências do passado recente; será uma tolice, portanto, insistir em qualquer comparação com a candidata Dilma Rousseff, porque nenhuma figura conhecida por esse nome tem existência própria e independente do presidente Lula; quando o presidente afirma ter dado algum conselho a Dilma Rousseff, como, por exemplo, não responder a certas acusações, a palavra "conselho" é mero eufemismo. Indica uma decisão tomada - ou pelo menos anunciada - por quem de fato disputa o poder em nome do PT. O real concorrente manda no partido, resolve as questões mais importantes e se protege por mera conveniência atrás da imagem de uma figura política fictícia; é preciso avaliar e discutir as promessas vocalizadas por essa personagem com base no estilo de governo seguido desde 2003. A partir daí será possível desqualificar qualquer promessa de reforma politicamente difícil, como a tributária. Em sete anos e meio, o atual governo evitou cuidadosamente qualquer inovação dependente de uma negociação complicada, como foi, nos anos 90, a dos padrões fiscais prescritos para os Estados e municípios.
Para uso geral, é possível sintetizar este último detalhe na seguinte mensagem: mantido o padrão observado a partir de 2003, o governo tentará promover o crescimento com base em reformas aprovadas nos anos 90 e no começo desta década. As tentativas de reforma serão de outra natureza.
Pode-se apostar num aprofundamento do peleguismo, na ampliação das bases cooptadas para apoiar o autoritarismo e em novas tentativas de controle dos meios de comunicação. Já houve pelo menos duas -a última com o Decreto dos Direitos Humanos -, seus autores não desistirão e só os muito conscientes da importância da liberdade tentarão resistir.
É jornalista
Luiz XIV uma ova. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é muito mais. O rei francês nunca administrou as maiores empresas de seu país nem se candidatou à própria sucessão. O presidente Lula tem feito isso e muito mais. Suas atividades múltiplas eram conhecidas, mas ele, talvez por modéstia, só agora decidiu reconhecer publicamente a extensão de seus esforços. Na semana passada, ele confirmou um fato sabido há muito tempo, mas por ele tratado com discrição até recentemente: a Petrobrás é comandada de seu gabinete. Poucos dias depois, uma nova confissão: é ele o real candidato do PT à Presidência da República.
Ao tornar público esse dado, ele desfez uma expectativa suscitada pelos discursos de dona Dilma Rousseff. Agora todos sabem: dona Dilma não será a primeira mulher na Presidência do Brasil, mesmo se eleita. Para isso ela precisaria existir, mas não existe, segundo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
É apenas um nome para preencher um espaço numa cédula, de acordo com a explicação fornecida por ele mesmo, em discurso na convenção do PT. "Eu mudei de nome", confessou.
A figura rotulada como Dilma Rousseff permaneceu calada, como seria de esperar, no caso de uma personagem fictícia, de uma boneca ou, talvez, de um ectoplasma produzido por um médium. Quando falou, gastou muitas palavras para elogiar Lula. Foi o único detalhe feio dessa história. Como ela não é mais do que uma projeção dele mesmo, as lindas palavras sobre Lula não foram, afinal, mais que um autoelogio. A modéstia deve ter acabado, mas também isso parece natural, depois da tentativa de mediar o conflito entre israelenses e palestinos.
A explicação sobre quem manda na Petrobrás foi dada em Natal, na quarta-feira passada. Segundo o presidente, a diretoria da estatal não queria saber de refinarias novas. A capacidade produtiva das atuais era considerada suficiente. Mas a palavra final não cabe a esses diretores. É prerrogativa do presidente da República. A construção de refinarias novas no Nordeste resulta de "uma decisão de governo", de acordo com Lula. Ele poderia ter usado uma linguagem mais simples e mais direta: decisão dele mesmo seria uma boa descrição. A condição da Petrobrás como empresa de capital aberto, com ações negociadas no Brasil e no exterior, parece fazer pouca ou nenhuma diferença para o presidente Lula, ou Dilma, ou Lula-Dilma. De fato, nada parece fazer diferença, além de seu projeto de poder.
Nesse projeto, o partido tem obviamente uma função apenas instrumental.
Os demais candidatos à Presidência da República devem ao presidente Lula um favor, pelo esclarecimento oficial de alguns pontos: a campanha é plebiscitária, sim, porque envolve uma disputa direta entre o atual governante e todos os demais. É preciso escolher entre a continuidade do governo de hoje e qualquer outra possibilidade, baseada ou não em experiências do passado recente; será uma tolice, portanto, insistir em qualquer comparação com a candidata Dilma Rousseff, porque nenhuma figura conhecida por esse nome tem existência própria e independente do presidente Lula; quando o presidente afirma ter dado algum conselho a Dilma Rousseff, como, por exemplo, não responder a certas acusações, a palavra "conselho" é mero eufemismo. Indica uma decisão tomada - ou pelo menos anunciada - por quem de fato disputa o poder em nome do PT. O real concorrente manda no partido, resolve as questões mais importantes e se protege por mera conveniência atrás da imagem de uma figura política fictícia; é preciso avaliar e discutir as promessas vocalizadas por essa personagem com base no estilo de governo seguido desde 2003. A partir daí será possível desqualificar qualquer promessa de reforma politicamente difícil, como a tributária. Em sete anos e meio, o atual governo evitou cuidadosamente qualquer inovação dependente de uma negociação complicada, como foi, nos anos 90, a dos padrões fiscais prescritos para os Estados e municípios.
Para uso geral, é possível sintetizar este último detalhe na seguinte mensagem: mantido o padrão observado a partir de 2003, o governo tentará promover o crescimento com base em reformas aprovadas nos anos 90 e no começo desta década. As tentativas de reforma serão de outra natureza.
Pode-se apostar num aprofundamento do peleguismo, na ampliação das bases cooptadas para apoiar o autoritarismo e em novas tentativas de controle dos meios de comunicação. Já houve pelo menos duas -a última com o Decreto dos Direitos Humanos -, seus autores não desistirão e só os muito conscientes da importância da liberdade tentarão resistir.
É jornalista
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