Estamos a menos de um ano das eleições. Fossem hoje, Dilma Roussef seria vitoriosa no primeiro turno. Aécio Neves e Eduardo Campos não demonstraram, até o momento, serem adversários à altura da candidata do PT. Ou despertam e partem para a conquista dos desinformados, desinteressados e desiludidos, ou serão impiedosamente batidos no primeiro domingo de outubro de 2014. Nas mesmas condições se achariam José Serra e outro eventual pretendente tucano, ou do PSB, com ou sem ajuda de Marina Silva.
Pesquisas indicam que o escândalo do mensalão poucos reflexos trará ao processo eleitoral. Até lá, novos episódios de corrupção virão à tona, fazendo José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares, Henrique Pizzolatto, Valdemar Costa Neto caírem em quase esquecimento. Não descarto a possibilidade de, dentro de alguns meses, voltarem a viver em liberdade, com ampla participação na vida política. Ardilosas campanhas contra o ministro Joaquim Barbosa (cujo empenho na recuperação da credibilidade do Poder Judiciário a nação deve agradecer), aliadas a esforços de beatificação dos condenados, cobram enérgicas respostas da imprensa independente e dos partidos de oposição para que não ocorra inversão dos polos, e criminosos comuns sejam travestidos de presos políticos.
Reeleita por dilatada margem de votos, Dilma Roussef sentir-se-á forte para levar a cabo reformas constitucionais com o objetivo de concretizar o projeto de poder do PT. Ignorada pelas massas, a Constituição tem se mostrado fraca e maleável. O ministro Joaquim Barbosa, encerrado o mandato, deixará a presidência do Supremo. O sucessor natural, pela ordem de antiguidade, será o ministro Ricardo Levandowski, em tudo diferente do homem de origem simples que o povo aprendeu a admirar.
Salvo se houver renovação radical, fenômeno desconhecido na história do Legislativo, o Congresso contará com ampla maioria de parlamentares submissos ao Poder Executivo. Em poucas semanas, o teatro estará montado: diretor, roteiro, atores, coadjuvantes e figurantes estarão prontos para se curvarem aos desejos de S. Exa., a presidente. Impossível? Não me parece. Getúlio Vargas conquistou o governo na crista da Revolução de 1930. Neutralizou os altos comandantes militares e, apoiado pela Aliança Liberal, assumiu a presidência como Chefe do Governo Provisório.
Em 1932, não tendo como impedir a redemocratização, adotou providências no sentido da convocação de Assembleia Nacional Constituinte, reunida, afinal, em 15 de novembro de 1933. Durante os trabalhos, introduziu no texto constitucional dispositivo que lhe permitia, no exercício do poder, disputar a presidência. Eleito pelo Legislativo, três anos depois deu o golpe, implantou a Carta de 1937, fechou o Congresso, cerceou o Judiciário, calou a imprensa e permaneceu até 29 de outubro de 1946, quando foi deposto pelo general Dutra, seu ex-ministro da Guerra.
O PSDB, na esperança de conservar o poder, alterou as regras do jogo para permitir a reeleição. Derrotado por Lula, em 1990, talvez tenha se apercebido do erro cometido. Lula se reelegeu e nomeou a sucessora. Mesmo sem mandato, exerce papel proeminente na política e confirmará Dilma à testa do Poder Executivo. Uma das artimanhas consistiu na criação do Bolsa-Família, imbatível cabo eleitoral financiado com recursos do contribuinte.
Afirma-se que o exercício do poder é inebriante. Dele não se abre mão por vontade própria. Imaginar que o PT, cuja índole autoritária é conhecida, está disposto a se submeter a democrático veredicto popular sem antes tentar todos os recursos para se enraizar no Planalto, é acreditar em Papai Noel.
Fenômeno típico do continente latino-americano é o caudilhismo. No Brasil, dois entre os maiores caudilhos foram os gaúchos Júlio de Castilho e Borges de Medeiros, dos quais Vargas foi discípulo. Dilma Rousseff não esconde a admiração pelo pai do Estado Novo, cópia do corporativismo-fascista de Benito Mussolini, adaptado ao clima brasileiro. Igual fervor nutre por Leonel Brizola, que lhe franqueou, pelo PDT, as portas da vida pública.
Participa do seu ideário preservar a Constituição de 88, conviver com a oposição, aceitar críticas, entender o papel da imprensa livre? As opiniões a respeito são divergentes. Os dados, enfim, estão lançados, e os candidatos, definidos. Resta-nos a preocupação com 2018, pois 2014 já se acha resolvido.
Almir Pazzianotto Pinto, advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do TST
Fonte: Correio Braziliense
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