sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Míriam Leitão - Os anos perdidos

- O Globo

Se estiverem corretas as previsões do FMI para este ano e o próximo, o Brasil terá crescido menos do que a média mundial durante seis anos, entre 2011 e 2016. Os Estados Unidos crescem com inflação baixa, a Europa iniciou ontem um grande programa para ampliar a liquidez. Um impulso no consumo americano virá da queda da gasolina. O Brasil encarece o crédito e aumenta o preço dos combustíveis.

Os remédios que se poderia usar - ampliar a liquidez, reduzir juros, diminuir o preço da gasolina por causa da queda do petróleo - o Brasil não poderá utilizar por causa dos erros na política econômica do primeiro mandato da presidente Dilma.

A Europa injeta liquidez porque o bloco está com deflação de 0,2%. O PIB da Alemanha cresceu 1,5% em 2014, segundo o órgão oficial de estatística, mas outros países do bloco não tiveram a mesma sorte. Por isso, a Europa anunciou ontem que injetará 60 bilhões de eruos por mês, através da compra de títulos dos governos, para estimular a economia. Aqui, os juros subiram, e o imposto sobre o crédito, também.

Comparado com as principais economias, o PIB brasileiro deste ano deve ter desempenho melhor apenas do que o projetado para a Rússia, que sofreu sanções internacionais e sente a queda do preço do petróleo.

O Brasil está ficando para trás. Isso tem acontecido desde 2011 e vai, pelo menos, até o ano que vem. Nossas taxas têm ficado abaixo da média mundial, e as projeções são de que isso se repita este ano e no próximo. Em 2015, o PIB brasileiro deve crescer apenas 0,3%, segundo as contas do FMI, em um mundo que crescerá 3,5%. No ano que vem, a comparação é 1,5% para o Brasil contra 3,7% do restante do mundo. O cálculo é parecido com o do próprio governo brasileiro. Em visita a Davos, o ministro Joaquim Levy afirmou que este ano será flat, ou seja, estagnado. Cresceremos menos do que EUA, Inglaterra, Alemanha, Itália e Espanha, países que estiveram no centro da crise internacional.

O ajuste fiscal e monetário promovido neste início de segundo mandato da presidente Dilma acontece em um contexto de adversidade internacional. Tudo será mais difícil. A China, segundo o FMI, vai crescer abaixo de 7%, algo que não ocorre desde os anos 80. O país é o nosso principal parceiro no comércio, grande comprador de minério de ferro e soja. Esses efeitos já aparecem nas estatísticas. Em 2013, a exportação para a China chegou a US$ 46 bilhões, com um superávit para o Brasil de US$ 8,5 bi. Em 2014, houve queda de 11% na exportação, para US$ 40 bilhões, e redução de 62% no saldo, para US$ 3,2 bi.

Reverter esse cenário será difícil. A escassez de energia e os problemas da Petrobras agravam um quadro que já era difícil pelos erros na política econômica e energética cometidos nos últimos anos.

A presidente Dilma tem demonstrado bastante preocupação e irritação com a crise de energia. Em uma reunião recente, ela foi dura, para dizer o mínimo, com um dos integrantes da cúpula do setor. Quando ele alertava para o tamanho do risco, ela o interrompeu e mostrou seu conhecido estilo forte para lembrar que aquilo era o oposto do que dissera a ela ano passado.

O auxiliar ouviu em silêncio, mas gritos não vão resolver. Eles terão todos que ter cabeça fria em Brasília. O quadro é tão ruim quanto diziam os críticos da política energética, os que ela se negou a ouvir.

Na economia, gritos ajudarão menos ainda. E ela não terá alguém para culpar, a não ser a si mesma, pelo passado. Poderá gastar no espelho todo o seu português.

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