• Serra é o principal ponto de apoio de Temer no PSDB
- Valor Econômico
O vice-presidente Michel Temer e o senador José Serra (PSDB-SP) moram no mesmo bairro, o Alto de Pinheiros, em São Paulo. Recentemente, um deputado jogou verde para o vice e perguntou se ele de fato estava conversando sobre o futuro governo com o senador tucano, nome considerado favorito para o Ministério da Fazenda, na hipótese do impeachment da presidente Dilma. Temer deu a volta no interlocutor, no melhor estilo pemedebista: "O Serra é meu vizinho, a gente de 15 em 15 dias se encontra".
Não disse que sim, nem respondeu que não. Mas ontem sentiu-se na obrigação de divulgar uma nota a respeito de uma entrevista que Serra concedeu ao jornal "O Estado de S. Paulo" relacionando os itens fundamentais para a celebração de um pacto de governabilidade em torno do vice. Em sua nota, Temer afirmou que "não tem porta-voz, não discute cenários políticos para o futuro governo e não delegou a ninguém anúncio de decisões sobre sua vida pública".
Uma nota dura, para os padrões do vice-presidente. Até porque Serra apenas falou sobre propostas que efetivamente são discutidas pelo PMDB e a oposição para o dia seguinte do governo Dilma. É certo que não se fala de nomes nessas discussões, mas não há como negar que as propostas e a montagem de um governo Temer se encontram em estágio avançado.
Há uma semana, Serra discutia essas propostas sentado ao lado de Nelson Jobim, ministro nos governos Lula e Dilma, e de Armínio Fraga, presidente do Banco Central no governo de FHC, e líderes da oposição, num jantar na casa do deputado Heráclito Fortes (PSB-PI).
Diferentemente do que aconteceu em 1992, quando o impeachment de Fernando Collor conferiu segurança política ao governo de Itamar Franco, o vice Temer terá que costurar já a partir de agora a governabilidade política e econômica. No que diz respeito à política, a aposta é em Nelson Jobim, nome com passagem pelas três esferas de poder - Executivo, Legislativo e Judiciário - e trânsito fácil no PMDB, PT, Lula e as Forças Armadas.
Na entrevista ao "Estado", Serra menciona quatro pontos para a construção do pacto de estabilidade: governo de união nacional; [Temer] não disputar a reeleição (e não interferir nas eleições de 2016 e 2018, sobretudo em São Paulo), não permitir revanchismo e a montagem de uma equipe ministerial que "surpreenda". Mas há um quinto aspecto: o que fazer com a Operação Lava-Jato.
É consenso que a Lava-Jato é e continuará sendo um fator de instabilidade política, mesmo com a mudança de governo. O desafio dos políticos é encontrar o ponto certo para fazer um risco de giz, demarcar o raio de ação das investigações sem serem acusados de perseguir ou tentar salvar quem quer que seja. Uma operação complicada mesmo para o padrão Jobim.
Tão importante quanto a estabilidade política no pós Dilma é o requisito da estabilidade econômica. Apesar da nota do vice, Serra é um dos principais pontos de apoio de Temer no PSDB, partido que será fundamental para um governo do pemedebista. A ligação entre os dois é antiga. Era Temer o presidente do PMDB quando o partido desalojou o então PFL da condição de parceiro preferencial da chapa do PSDB, nas eleições de 2002.
Serra tem colaborado com a elaboração das diretrizes econômicas para um eventual governo Temer, mas não é o único no páreo. Pesa contra o senador o fato de que ele é candidato a presidente da República. Se assumir a Fazenda e conseguir repor a economia nos trilhos, ganha no PSDB uma vantagem que hoje não tem em relação ao senador Aécio Neves (MG) e ao governador Geraldo Alckmin, de São Paulo. Temer não seria candidato, mas nada impediria Serra de tentar pela terceira vez.
O candidato natural do PSDB, Aécio Neves, é também candidato a uma bala perdida da Lava-Jato. Alckmin deixou claro na disputa pela candidatura a prefeito de São Paulo que não está disposto a deixar brecha para Serra voltar a crescer no partido. Nunca estiveram tão esgarçadas as relações entre os tucanos no seu habitat, São Paulo. Alckmin foi aconselhado a não radicalizar, pois ter ou não o prefeito seria indiferente para suas pretensões. Preferiu não correr risco.
Armínio Fraga corre por fora. Além de trânsito político, o economista tem uma vantagem em relação a Serra: não é candidato a nada, muito menos a presidente da República. Armínio tem sido ouvido pelos principais atores do impeachment de Dilma. Além do jantar na casa de Fortes, sua presença também foi registrada num almoço, em um restaurante de Brasília, com Serra e o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
No mesmo dia em que a entrevista de Serra foi publicada no "Estadão", Fraga também era o principal entrevistado do jornal "Folha de S. Paulo". Disse que não aceitaria participar de um eventual governo de transição, mas confirmou que mantém contatos com o PSDB e outros partidos. Defendeu a mudança de governo, fez observações sobre a economia, mas ficou por aí. Para amigos do vice Michel Temer, o senador José Serra, ao contrário, "foi inconveniente", talvez pressionado pelas disputas internas do PSDB.
Desde que a crise do governo Dilma se agravou, na semana passada, Temer tenta se manter discreto, tem parado menos em Brasília para não dar margem a especulações de que conspira contra a chefe do governo, como aconteceu ano passado, antes de o STF esfriar o impeachment, ao estabelecer os ritos do processo na Câmara.
Não é que o vice Michel Temer não pense na montagem de um governo, tendo em vista a possibilidade de assumir Presidência, na hipótese do impeachment da presidente Dilma Rousseff, o que hoje é considerado bastante provável. Temer é pragmático. Ele considera que é papel do vice-presidente estar sempre preparado para assumir o lugar do titular, no caso de vacância do cargo. Essa é a atribuição do vice: substituir o presidente, seja de forma temporária ou permanente. É o que estabelece a Constituição Federal.
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