O comércio internacional deverá ser um dos principais assuntos da reunião de primavera do Fundo Monetário Internacional (FMI), que se realiza nesta semana, em Washington, ofuscando as questões financeiras que tradicionalmente dominam os debates. O tema ganhou corpo nos últimos dias, depois do bate-boca na imprensa entre a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, e o secretário de Comércio do governo de Donald Trump, Wilbur Ross, a respeito do protecionismo. O embate pega o Brasil em meio a esforços para ampliar sua participação no comércio global.
A temperatura começou a subir na semana passada, quando o FMI, o Banco Mundial e a Organização Mundial do Comércio (OMC) divulgaram estudo conjunto defendendo o comércio como "ferramenta poderosa para aumentar o crescimento e melhorar o padrão de vida" das pessoas, que chegou a um "ponto crítico", ameaçada pelo recrudescimento do protecionismo após a crise financeira internacional.
Segundo o estudo, que avaliou dados de 1960 até a véspera da crise, em 2007, o comércio global de bens e serviços avançou a uma média de cerca de 6% ao ano, quase o dobro da expansão do PIB no mesmo período. Depois da crise, porém, o ritmo desacelerou. Entre 2012 e 2015, o crescimento foi de 3% ao ano; e, no ano passado, de 1,3%, abaixo do PIB pela primeira vez desse 2001. Historicamente, o volume do comércio mundial de mercadorias tende a crescer uma vez e meia mais rápido que a produção mundial. O estudo conjunto reconhece que regiões mais expostas às importações da China depois dos anos 2000 experimentaram "perdas significativas e persistentes de empregos e renda, atingindo trabalhadores menos especializados" e mais velhos, que demoram mais a se recolocar.
Na sequência, a OMC divulgou a previsão de retomada do comércio global, com crescimento de 2,4% neste ano, quase o dobro de 2016, mas inferior aos 2,6% de 2015, alertando para o risco de a recuperação ser freada por "choques políticos", pelo protecionismo e pelo aperto das taxas de juros, conforme o diretor-geral da organização, Roberto Azevêdo.
Em seguida, foi a vez do alerta de Christine Lagarde. Ela se mostrou otimista ao dizer que, "depois de seis anos de crescimento desapontador", a economia mundial dá sinais de recuperação, prometendo "mais empregos, renda maior e maior prosperidade". Em janeiro, o Fundo anunciou a previsão de crescimento de 3,4% neste ano em comparação com 3,1% em 2016. Mas contrapôs que a "espada do protecionismo" e incertezas políticas ameaçam a recuperação global.
Em nenhum momento houve referência explícita à política comercial protecionista que Donald Trump prometeu implementar, sintetizada no lema "America first". Mas isso não era necessário e a resposta não demorou a chegar, com o secretário americano de Comércio qualificando de "bobagem" as advertências do FMI e demais organismos. Em entrevista ao Financial Times (Valor 17/4), nas vésperas da abertura da reunião do Fundo, Wilbur Ross, disse que os que acusam Trump de protecionismo disparam contra o "alvo errado".
O debate chega em um momento em que o Brasil parece seriamente comprometido em melhorar seu desempenho no mercado internacional, depois de acumular queda de cerca de 40% no fluxo comercial nos últimos quatro anos. De acordo com a OMC, as importações brasileiras recuaram 42,8% no período, para US$ 143 bilhões; e as exportações, 23,6%, para US$ 185 bilhões. Apesar de ser a sétima economia global, o país fica em 28º lugar entre os importadores, com apenas 0,9%, e 25º entre os exportadores, com 1,2%.
O ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes, já disse que pretende recuperar mercados externos e colocou entre suas metas ampliar os acordos comerciais, reduzir as barreiras e atrair investimentos estrangeiros. Entre os projetos podem ser alinhados avançar a negociação do Mercosul com a União Europeia e com os países da Aliança do Pacífico (Chile, Colômbia, México e Peru); estabelecer acordos de compras governamentais, buscar investimentos produtivos, e até a promessa de rever incentivos condenados pela OMC. No primeiro trimestre, a corrente de comércio do país já aumentou 14,7% somando US$ 86,5 bilhões. Para que continue crescendo, porém, depende cada vez mais não só dos esforços internos, mas também do incerto cenário global.
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