Vitorioso no plebiscito pela extinção do parlamentarismo na Turquia, o presidente Recep Tayyip Erdogan dá mais um passo em sua escalada autoritária e converte seu cargo em uma espécie de sultanato a prazo fixo —e que prazo.
Com as alterações constitucionais aprovadas neste domingo (16), Erdogan poderá permanecer no poder até 2029, ao final de três possíveis mandatos de cinco anos.
O "sim" às 18 emendas propostas pelo governo venceu por pouco mais de 51% dos votos; a oposição acusa fraudes e pede recontagem.
De substancial, as reformas transformam a Turquia num regime de Presidência forte. O cargo de primeiro-ministro, por meio do qual Erdogan chegou ao governo em 2003, deixa de existir.
As mudanças praticamente sepultam os freios e contrapesos exigidos pela boa teoria constitucional. O mandatário terá autonomia para editar decretos e nomear os principais juízes e procuradores que revisariam suas decisões. Também poderá abrir, a seu critério, procedimentos investigativos contra o funcionalismo público do país.
Para os mais pragmáticos, a reforma será menos que uma formalidade, dado que Erdogan, mesmo na ausência de autorização constitucional, tem adotado toda sorte de medidas liberticidas.
Desde a frustrada tentativa de golpe contra seu governo, em julho do ano passado, o presidente prendeu 45 mil pessoas, expurgou 130 mil servidores e fechou 160 órgãos de imprensa.
Curioso —e lamentável— é que Erdogan e seu partido islâmico moderado, o AKP, tenham chegado ao comando do país com uma agenda meritória e bem-sucedida.
Adotaram-se reformas que reduziram a inflação, aceleraram o crescimento econômico e atenuaram a pobreza; fortaleceram-se as liberdades civis; ensaiou-se acordo de paz com a minoria curda.
O modelo que conciliava islamismo e democracia, no entanto, começou a desandar no início desta década. Erdogan inclinou-se pelo lado muçulmano e causou descontentamento entre as elites seculares urbanas da classe média.
Após uma onda de protestos em 2013, sua escalada autoritária tornou-se evidente. O ápice de agora impõe um dilema ao Ocidente.
A Turquia é um importante membro da Otan, a aliança militar ocidental, e país-chave nas estratégias voltadas à guerra na Síria e ao fluxo de refugiados do Oriente Médio para a Europa.
Se pressionado a retornar à via democrática, o novo sultão pode aproximar-se ainda mais da Rússia do neoczar Vladimir Putin. Para tornar tudo mais nebuloso, os Estados Unidos estão sob o comando de Donald Trump, que não parece capaz de manter-se em uma linha coerente de política externa.
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