É inaceitável que os termos legais do entendimento do empresário com a PGR sejam desrespeitados, para que as provas já apresentadas deixem de valer juridicamente
Não causou apenas surpresa e perplexidade o anúncio feito pelo procuradorgeral da República, Rodrigo Janot, de que suspendera o acordo de delação premiada firmado com o empresário Joesley Batista e executivos dele na JBS, para investigar delitos cometidos pelos colaboradores.
A acertada decisão de Janot passou a ser usada não apenas pela defesa de Michel Temer — o que era esperado —, para desqualificar acusações da PGR contra o presidente, mas também tem sido manipulada pela bancada pluripartidária que no Congresso trabalha com afinco para barrar a Lava-Jato e todo o movimento existente no país para conter, investigar e punir esquemas de corrupção enraizados no Estado.
É revelador, por exemplo, que o senador Romero Jucá (PMDB-RR), do grupo do presidente Michel Temer, e personagem central de inquéritos e processos, diga que o fato projeta dúvidas sobre “várias delações”. Claro que, em pelo menos uma das citadas pelo senador, a de Sérgio Machado, da Transpetro, ele é um dos protagonistas.
Por ironia, o uso oportunista da decisão de Janot une diversos polos na atual política brasileira. Isso porque PT e PMDB congregam vários VIPs entre corruptos sob investigação, denunciados ou já condenados.
A gravação de quatro horas de conversas entre Joesley e seu principal executivo, Ricardo Saud, que é a peça básica que levou a PGR colocar o acordo em suspenso, tem momentos degradantes, de baixo nível e irresponsáveis, como bravatas envolvendo ministros do Supremo.
Na sessão de ontem, sem a presença de todos os 11 magistrados da Corte, a presidente do STF, Cármen Lúcia, foi apoiada por ministros. Na véspera, a ministra pedira, com acerto, que haja profunda investigação sobre o que foi dito, para que não paire qualquer suspeita sobre a Corte.
Da gravação constam referências ao procurador Marcelo Miller, da PGR, que se desligou do cargo público no início de abril, depois que Joesley havia gravado o presidente Temer nos porões do Jaburu. Miller foi trabalhar no escritório que assessorou Joesley na negociação do acordo. A cooptação do procurador pela empresa passou a ser usada pela defesa de Temer para anular as provas consistentes contra o presidente.
Se isso acontecer, será grave retrocesso no combate à corrupção, sendo que o próprio acordo de delação tem cláusulas adequadas para o caso. As de números 26 e 27 enquadram o que houve entre os motivos para a rescisão do acordo pela PGR, com a manutenção de todas as provas e depoimentos, além do pagamento de multas.
Não é razoável que omissões e manobras de Joesley não levem a PGR a revogar o acordo e encaminhar à Justiça pedidos de punição. Mas também contraria a sensatez e a própria lógica que os termos do acordo de delação, um ato juridicamente perfeito, assinado por meio de um rito sancionado pelo Supremo, sejam descumpridos, para que provas concretas desapareçam do ponto de vista jurídico.
Seriam desconsideradas cenas fortes como as de Rodrigo Loures, às pressas, na Rua Pamplona, em São Paulo, puxando a mala com os R$ 500 mil de propina entregues pela JBS. Loures fora indicado por Temer para se entender com Joesley.
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