A economia da produção cultural é, por sua natureza, uma atividade empregadora. E é contemporânea à era do conhecimento, que é agora
É desconcertante o tempo em que tudo dá errado e o pessimismo se realimenta, deixando a impressão de que o futuro está perdido. É o ponto em que estamos no Rio. Mas esse pode ser o momento da inflexão, se as cabeças pensarem juntas e a visão se estender para além do momento presente. O futuro não chega por fatalismo do calendário. É preciso buscá-lo. Do contrário, o tempo passa e ficamos presos no passado.
O Rio é magnético. Ele sempre atrairá a inteligência, a criatividade, o debate, a discordância, as tendências, a cultura, as invenções, a literatura, a festa, a música. Sua beleza natural é ativo, e não apenas paisagem. É a cidade ícone do Brasil, a vitrine mais visível. Muitas cidades, regiões e estados no mundo fizeram novos planos em tempos de crise e construíram o futuro em novas bases tendo menos do que temos para recomeçar. O segredo é descobrir onde está a porta de saída e qual é a vocação evidente.
O Rio é software e não hardware. A indústria pesada, de alta emissão, que enfeia a paisagem, contamina o ar e esgota os recursos não é a vocação natural do estado e muito menos da cidade. Por isso, ele nunca será bom em fazer a máquina, mas sim em construir a inteligência da máquina. A economia da produção cultural é por sua natureza uma atividade empregadora. E é contemporânea à era do conhecimento, que é agora. Aqui há seis universidades que podem ser fortalecidas e mobilizadas na produção do conhecimento.
O Rio é evento e entretenimento, para todos os públicos e nichos. A cidade tem uma rede hoteleira ampla e já instalada, o Centro reformado e uma estrutura esportiva recente, que por ser nova, é facilmente recuperável. A logística da cidade melhorou por causa da Olimpíada. Tudo está preparado para um calendário de grandes eventos musicais do pop à música clássica. A cidade tem salas com acústica perfeita para grandes orquestras, ou música de câmara, em pontos diversos e estratégicos. Tem espaços para grandes shows e espetáculos de todos os tipos.
O Rio é internacional. O calendário das promoções culturais, esportivas, econômicas, de convenções deve mirar também o público de outros países. A estrutura hoteleira comporta e requer que se atraia o público global na economia dos eventos.
O Rio é turismo. Não caberia aqui a lista dos seus ativos turísticos, que teria obrigatoriamente que conter as praias, a maior floresta urbana de replantio, o carnaval mais conhecido do planeta, a paisagem exuberante, o Cristo por bênção, braços abertos sobre a Guanabara.
O Rio é história. Ande pela cidade e você tropeçará na história do Brasil. Por aqui entrou a Corte portuguesa em seu exílio e começou a inventar um país. Por aqui entraram mais de um milhão de africanos escravizados e os marcos dessa chegada, dessa dor e força, estão à flor da terra. As marcas dos fatos espalham-se pelo Centro: Tiradentes em seu sacrifício, a princesa em seu momento áureo, a República em seus rompantes, erros e acertos, Getúlio em seu Catete, a Candelária das mobilizações. O Brasil se fez aqui.
O Rio é literatura. Grandes escritores criaram nesse cenário suas obras e seria longa alista, mas fico com Machado de Assise Carlos Drummond de Andrade. Fonte perene de inspiração de poetas e ficcionistas, o Rio é sede da Academia Brasileira de Letras e endereço de grandes editoras: Record, Rocco, Zahar, Sextante, Intrínseca, para citar algumas. Tem o mais poderoso dos eventos literários do Brasil, a Bienal, que começa agora com números impressionantes e estandes que exibem agarrado mercado editorial.
O Rio precisa saber o que é e o que tem. A crise da segurança é obstáculo a qualquer projeto, mas o estado já viu uma política dar certo, ainda que por tempo breve. Na educação, o estado deu um salto da rabeira para os primeiros lugares, com boa gestão e visão estratégica. O doloroso tempo presente não pode paralisar quem já sabe a trilha do sucesso. Quando se diz que o Rio deve reagir não é apenas para ter um lema motivacional. Há um caminho concreto de busca do futuro.
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Míriam Leitão é jornalista
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